26 de janeiro de 2012, de São Sebastião do Rio de Janeiro, Bruno Lima Rocha
A pesquisa do IBGE referente ao cálculo com despesas de saúde por pessoa no Brasil (no ano de 2009) comprova o conceito de marketização num setor que em tese, deveria ser provido pelo ente estatal. Marketização implica na ampliação e transformação em serviços e espaços de públicos para privados. Assim, transforma-se um direito – algo da esfera da justiça e do contrato social – em uma mercadoria. No caso, o direito à saúde no Brasil é inversamente proporcional a duas capacidades fundamentais numa democracia: a pressão da cidadania organizada e o crescimento sustentado na poupança interna.
Supostamente temos um sistema de saúde universal e com um projeto societário a motivá-lo. Na prática, a desvinculação de receitas e a melhora da qualidade de vida (mobilidade dentro da pirâmide social) vêm acarretando uma maior capacidade de gastos do cidadão comum com saúde privada. Estamos gastando em média, por indivíduo, R$ 835,65 ano, sendo esta conta bancada pelas famílias. De sua parte, o Estado – concentrando recursos na União – gasta R$ 645,27 por cidadão. A parcela do bolo é de 55,4% para a cidadania e 43,6% para o gestor dos recursos coletivos. Quando cruzamos as variáveis do desenvolvimento econômico e distribuição de renda, o volume de gastos com saúde é determinante. Na Europa que hoje vive à beira de um ataque de nervos, o Estado de Bem Estar Social que os especuladores e financistas insistem em exterminar ainda investe 72% do total do bolo da saúde.
Para os brasileiros, a conta é simples. Muda-se de faixa de consumo e incorpora-se como gasto o que antes era o suplício das filas do SUS. Com a moeda estável e o aumento do emprego formal, o consumo se dá na forma do endividamento e não da poupança interna. Reproduz-se em escala familiar o que faz o governo central. Rolamos as dívidas, temos baixa taxa de investimento e poupamos pouco. Na ponta do lápis, a massa da glorificada classe C (e o grosso da B também) gasta o que ganha com despesas fixas associadas com a melhora da qualidade de vida. O problema não está no gasto em si, mas sim na constatação de que o direito social fica em segundo plano diante da forma mercadoria para o mesmo serviço.
Concluo repetindo o já dito em artigos anteriores. É inegável que melhoramos de vida nos últimos dez anos, não havendo comparação com o ciclo tucano. O problema é reorientar o debate do crescimento, associando com o exercício dos direitos fundamentais e a reorganização do tecido social para reivindicá-los e exercê-los.
Este artigo foi originalmente publicado no blog do jornalista Ricardo Noblat