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História, memória e historiografia.

A GREVE GERAL DE 1917 E O PAPEL DOS ANARQUISTAS


Passeata, na rua da Praia, em Porto Alegre, durante a Greve Geral de 1917.

Este texto pretende narrar a mobilização ocorrida para construir e conduzir a Greve Geral de 1917 em Porto Alegre. Destaca a participação dos anarquistas na construção da greve.

São Borja missioneira, 01 de agosto de 2017.

Anderson R. Pereira Corrêa

 

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Anderson R. Pereira Corrêa

São Borja missioneira, 01 de agosto de 2017.

Terra de Andresito Artigas

100 anos da primeira Greve Geral!

 

      1  A Greve Geral de 1917 no Rio Grande do Sul

      As notícias da “Greve Geral” chegam pela imprensa, noticiando a paralisação dos operários de São Paulo, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Curitiba. No Rio Grande do Sul a greve de 1917, em termos organizativos, foi obra da Liga de Defesa Popular, pois a FORGS, pouco ou nada fez para mobilizar os trabalhadores. A greve foi fruto da insistência de grupos de operários, militantes que tomaram para si a responsabilidade de organizar os trabalhadores. Destaque teve a participação incansável da União Operária Internacional (UOI). No dia 26 de julho começa a ocorrer alguns incidentes. Operários da viação Férrea percorrem a linha propagando a greve. No dia 30 de julho era feita uma convocação assinada pela União Operária Internacional convocando para uma concentração pública para o outro dia. No final desta concentração ao clamor e gritos de Greve! Greve! – é eleita uma “Liga de Defesa Popular”. Principais organizadores da greve em Porto Alegre, membros da Liga: Luis Derivi, secretário do sindicato dos pedreiros, carpinteiros e classes anexas e o líder tipógrafo Cecílio Vilar, o qual entre outras coisas afirma: “...mas o momento não é para conciliações, é de luta. A luta mais justificável, a luta pela vida. Os operários devem se erguer como um só homem, para sair às ruas e conquistar o pão que nos está sendo roubado e a fim de protestar contra a exploração de que é vítima a classe trabalhadora (...)” (BODEA, p.31)

      No dia 1º de agosto uma comissão é recebida por Borges de Medeiros que iria estudar as reivindicações operárias. No dia dois Borges de Medeiros baixa dois decretos atendendo boa parte das reivindicações feitas pela Liga de Defesa Popular. Os ferroviários haviam se adiantado ao movimento e no dia 31 de julho pela tarde começa a greve nas estações de Porto Alegre, Santa Maria, Pelotas, Rio Grande, Bagé, Gravataí, Passo Fundo, Couto, Cacequi e Rio Pardo. O inspetor geral da VFRGS Mr. Cartwrigth, começa a despedir funcionários e solicita a intervenção das tropas da 7ª Região militar. No dia 2 de agosto é feita a ocupação da estação de Santa Maria. Em represaria os operários arrancam trilhos, derrubam pontes e bloqueiam a via com os dormentes e postes telegráficos em vários pontos do estado. Em Passo Fundo ocorrem violentos choques entre ferroviários e as forças militares. No dia 5 termina a greve dos ferroviários devido a forte intervenção militar. Em alguns núcleos urbanos do interior ocorreram conflitos bem mais sérios dos que ocorreram na Capital. Em Pelotas, segundo maior núcleo urbano do Rio Grande do Sul (60 mil habitantes na época) o poder público resolveu enfrentar abertamente o movimento operário. A greve começa em 04 de agosto com várias categorias entrando em greve, e em atitude semelhante à de Porto Alegre, São Paulo criaram o Comitê de Defesa Popular. No dia 10 de agosto o movimento se radicaliza: “Uma passeata realizada no centro da cidade culmina com um comício na Praça 7 de julho. Durante o comício ocorre a violenta intervenção da policia, provocando tiroteios entre policiais e grevistas. A seguir intervém o 11º regimento de cavalaria: o conflito degenera em verdadeira batalha campal, que terá como resultado vários feridos.”(BODEA, p.47)

      Os operários se concentram na sede da Liga Operária e novamente a polícia se envolve. Os operários resistem à ação da polícia que busca prendê-los e fechar a sede operária. O chefe de polícia tem seu cavalo abatido a tiros pelos operários e um funcionário da intendência municipal é mortalmente ferido. Depois de muita resistência os operários são finalmente desalojados da sede da liga operária. Ocorre uma radicalização cada vez maior das lutas e os operários de orientação anarquista, em boletins proclama: “companheiros! Não vos qualifiqueis: companheiros se já tendes título rasgai-o a fim de não dar a esses régulos o vosso voto. (...)(Idem.p.48) O chefe de polícia da capital é deslocado para Pelotas em 12 de agosto para mediar a situação. No dia 15 de agosto a greve termina com a baixa dos preços dos gêneros de primeira necessidade. Também houve greves importantes em Rio Grande, Passo Fundo, Santa Cruz, Montenegro e Bagé.   

      A origem dos vários direitos que os trabalhadores possuem hoje, foram conquistados na luta, no enfrentamento contra os patrões e o governo. Quanto à greve de 1917: destacamos a conquista por algumas categorias das 8 horas de trabalho diárias e para Porto Alegre ficou o começo das “Feiras Livres” que existem até hoje.

 

      2 A Greve e o papel dos anarquistas

      A FORGS foi criada em 1906 no decorrer da Greve dos 21 Dias. Esta greve aconteceu logo após o Primeiro Congresso da Confederação Operária Brasileira (COB). A COB, em 1906, adotou os princípios do Sindicalismo Revolucionário e não do anarcosindicalismo. Em todos os demais congressos da COB ela ratificou a decisão do Primeiro Congresso sobre sua linha política. Sobre a FORGS, até 1911, a maioria dos membros da Diretoria pertenciam à social-democracia e tinham simpatias pelo PRR, partido do Governo do RS. A partir de 1911 os anarquistas começam a ampliar a disputa e sua participação na diretoria da entidade. Ainda assim os anarquistas não conseguem estabelecer hegemonia dentro da mesma, isso até 1918. Em 1913, acontece uma maior presença anarquista e sindicalista. Nesse momento a FORGS passa de sete para treze o numero de sindicatos filiados. Ao todo a entidade representava 3.280 trabalhadores. Os rumos tomados pela FORGS não eram necessariamente os rumos tomados pelos afiliados. A direção da FORGS era eleita todos os anos em sessão plenária das diretorias das associações federadas. A comissão central era formada pelos delegados das associações federadas que reuniam-se mensalmente. A FORGS era um órgão consultivo e não deliberativo.

      No dia 05 de julho de 1917 anarquistas convocaram uma reunião para reorganizar a União Operária Internacional (UOI). A UOI era como se fosse uma “tendência/corrente sindical” composta por anarquistas. A UOI se reuniu no dia 25 de julho pra tratar da Greve Geral de São Paulo. O sindicato dos canteiros se reuniu no sábado dia 28 e no domingo dia 29 de julho se reuniram os pedreiros e padeiros. A UOI mobilizou várias categorias para a Greve Geral, inclusive com distribuição de panfletos. A FORGS não queria a Greve. (A FORGS era afiliada à COB).

      No domingo dia 29 de julho aconteceram duas reuniões na sede da FORGS, uma pela manhã, organizada pela UOI e outra às 15h. A reunião da tarde não foi aberta pelos membros da direção da FORGS e sim pelos membros da UOI. O delegado da UOI, pedreiro Luiz Derive (anarquista) abriu a sessão e passou a palavra a Cecílio Villar (anarquista) e fizeram duras críticas a posição da FORGS. Os dois defenderam a Greve Geral. Nessa mesma reunião, perante a negativa da FORGS, foi criada a Liga de Defesa Popular (LDP) com o objetivo de mobilizar para a Greve. Foram escolhidos dezenove pessoas pra compor a coordenação da LDP. Desses podemos identificar seis como sendo anarquistas. Nenhum desses era membro da direção da FORGS. Sobre a atuação militantes dos anarquistas Adhemar Lourenço destaca a União Operária Internacional, que desde sua fundação, em 1902 ou 1905, sempre teve uma trajetória ligada à necessidade de organização dos anarquistas para a intervenção no movimento operário. Crescendo sua influencia sobre o meio operário, essa entidade seria utilizada pelos anarquistas do Grupo dos Homens Livres como campo de ação para desenvolverem a propaganda. Adhemar cita um trecho do trabalho de Jorge Jardim sobre esse aspecto: “O que é possível deduzir, é que havia um grupo mais restrito que congregava os libertários desde 1899 (Grupo dos Homens Livres e sucedanios), onde se estudava e se discutia a doutrina para veicula-la aos trabalhadores enquanto a União Operária Internacional se constituía, cada vez mais importância, desde 1902, no braço sindical deste grupo.” O historiador acrescenta que importantes membros da União Operária Internacional eram também editores do jornal A Luta, responsáveis ou professores na Escola Eliseo Reclus e, inclusive, posteriormente com cargos na FORGS. Enquanto anarquistas e sindicalistas revolucionários não “lideravam” a FORGS, era necessário uma política organizada, logo após, sua existência é questionável e ou de pouca atuação. O fato é que a UOI de 1915 a 1917 deixou de existir. Mas é impossível descrever a Greve Geral de 1917, sem fazer referencia a ação organizada dos anarquistas da União Operária Internacional. Em 1917, foi convocada uma reunião para quinta feira, 5 de julho, para reativar a UOI. Coincidência ou não os anarquistas procuravam organizar-se no mesmo momento em que se elegia a nova administração da FORGS. A questão de organização dos anarquistas, entidades operárias e Greve Geral, passam por processos semelhantes em várias cidades brasileiras: São Paulo, Rio de Janeiro, Pelotas e Porto Alegre. Em São Paulo os anarquistas organizaram em setembro de 1916 a Aliança Anarquista, no Rio de Janeiro o Centro Libertário. De Pelotas, a proposta que vinha sendo defendida a nível nacional, defendida por Santos Barboza e Zenon de Almeida, é de que os anarquistas deveriam se organizar para interferir no movimento operário, sendo este um meio de propaganda que não deveria ser desprezado. Se os sindicatos eram corporativistas, isso ocorria porque lhes faltava orientação dos anarquistas; se os sindicatos se declarassem anarquistas, proposta adotada pelos argentinos, as associações perderiam seu caráter de massa, deixando de ser um meio de propaganda do ideal. Assim em Pelotas, era a Federação Operária local que convocava comícios e não os anarquistas do Grupo Iconoclasta.

      Em Porto Alegre, no meio do mês de julho, talvez para burlar a vigilância da polícia, organizou-se uma “Caixa Beneficente dos Pedreiros e Classes Anexas”, a partir do esforço do sindicato dos pedreiros para deflagrar a Greve Geral. Esta Caixa Beneficente organizou quermesses na semana seguinte, convocando reuniões operárias, fazendo crescer a agitação. Quarta-feira, dia 25 de julho a UOI se reuniria para “tratar da greve de São Paulo” e discutir outros temas que se relacionam ao proletariado. O Sindicato dos Pedreiros se reuniria no domingo, 29 de julho. Os canteiros se reuniriam no sábado (dia 30) a noite e os padeiros no domingo (dia 31) às 19 horas. O jornal Correio do Povo compareceu, na sexta-feira 27 de julho, na sede da FORGS para ter informações do boato que se espalhara sobre uma suposta greve em Porto Alegre. Na sede da FORGS o jornal foi informado que: “...a Federação Operária não cogita em greve, tendo até mesmo se esforçado junto as associações que lhe são federadas para que esta capital nada venha a sofrer na sua tranqüilidade com algum movimento que, de sua parte, possa surgir. A mesma informante nos declarou que a sociedade que mais se empenha para que estale o movimento é a União Operária Internacional...” (SILVA JR , 1994.p.242)

      Os boatos vão, cada vez mais, parecendo verdadeiros. No dia 28 são distribuídos boletins convocando os operários para reuniões no domingo na sede da FORGS. O boletim da FORGS convoca uma reunião para domingo às 15 horas sem esclarecer a pauta. Já o Sindicato dos Pedreiros, Carpinteiros e Classes Anexas parecia querer forçar alguma coisa, pois ao invés de convocar uma reunião para sua categoria, convocava uma reunião geral das classes para as 9:30 do mesmo domingo. A reunião de domingo, 29 de julho, na FORGS, marca para a manha pela UOI, contou com um número estimado de 100 trabalhadores. Os temas discutidos na reunião da categoria eram os mesmos de um boletim “distribuído profusamente pelos arrabaldes Floresta, São João e Navegantes”, cuja autoria era da União Operária Internacional. Tais discursos propondo que os trabalhadores se declarassem em Greve foram “aplaudidos por todos presentes”. A reunião da FOGS que estava marcada para as 15 horas desse domingo dia 29 de julho contou com um público estimado de 500 pessoas. A reunião daquele domingo não foi aberta pelo presidente da FORGS, mas pelo delegado da UOI, o pedreiro Luiz Derivi, que passou a palavra a Cecílio Villar. Os dois fizeram discursos que combatiam os que ocupavam os cargos de administração da FORGS. A UOI se reorganizou no começo de julho para fazer oposição a FORGS. Na mesma reunião de Domingo foi criada a Liga de Defesa Popular (LDP), uma direção independente da Federação, com o objetivo de mobilizar a Greve Geral. A LDP foi escolhida por nomeação, segundo consta a Federação ia “nomear uma comissão”, que organizaria a mobilização. Para essa comissão foram nomeados Cecílio Vilar, Luis Derivi e Salvador Rios, que escolheriam dois membros de cada associação filiada para compor a Liga. Os 19 nomes que compunham a LDP: Cecílio Vilar (Henrique Martins), Luiz Derivi, Salvador Rios, Juvêncio Lima, Vigo Collin, Nino Martins, Carlos Toffolo, Carlos Nogueira, Orlando Martins, João Batista Moll, João Hoffmann, Francisco Guttmann, Adão Lopes de Souza, Marcolino dos Santos Figueiró, Pedro Ferrari, João R. Viegas, Antônio Dodô, Abílio de Nequete e Altivo Fontoura. O historiador Adhemar para fazer a cronologia da Greve geral, utiliza-se de uma figura de linguagem, recolhida do jornal O Imparcial (POA, 13/08/1917,p.02): “Entre 31 de julho e 04 de agosto a vida urbana em Porto Alegre foi completamente alterada, podendo ser utilizado o epíteto da Semana Santa.” E acrescenta: “a quarta-feira teria sido das Trevas, pois a Companhia Força e Luz suspendera seu funcionamento; quinta-feira fora de Endoenças, pois o povo saíra às ruas em busca de artigos, em profusão semelhante ao movimento na quinta-feira supra citada rumo ás igrejas; sexta-feira fora da paixão, pois não havia nem carne, nem leite; sábado fora da aleluia; pois o povo congratulava-se com o resultado das negociações; Domingo fora o da ressurreição, pois então ressurgiria o movimento nos arrabaldes.”

      À noite a Liga reuniu-se e divulgou uma nota, com uma a seguinte pauta:

      “- Diminuição dos preços dos gêneros de primeira necessidade em geral;

      - Providências para evitar o açambarcamento do açúcar;

      - Estabelecimento de um matadouro municipal para fornecer carne à população a preço razoável;

      - Criação de mercados livres nos bairros operários;

      - Obrigatoriedade da venda do pão a peso e fixação semanal do preço do quilo;

      - A intendência deve cobrar pelo fornecimento da água 10 % sobre os aluguéis e reduzir para 5% as décimas dos prédios cujo valor seja inferior a 40$000.

      - Compelir a companhia Força e Luz a estabelecer passagens de 10 réis de acordo com o contrato feito com a municipalidade;

      - Aumento de 255 sobre os salários atuais; - Generalização da jornada de 8 horas;

      - Estabelecimento a jornada de 6 horas para as mulheres e crianças.”

      Adhemar afirma que o movimento operário de Porto Alegre possuía uma organização débil, e que mesmo assim conseguiu deflagrar uma Greve Geral. Ele mostra que um dos fatores que ajudaram a deflagrar o movimento grevista, era a hostilidade aos comerciantes teutos, que monopolizavam alguns setores da economia.

      A Greve Geral de Porto Alegre foi uma ação conjunta das classes populares sob a coordenação da LDP. A própria LDP reconhecia que a pauta de reivindicações havia pontos que diziam respeito ao governo municipal, ao governo estadual e aos patrões. As vitórias obtidas na conquista de determinada legislação não foi resultado de um somatório de lutas, mas de uma Greve Geral em Porto Alegre, que se aproximaria do tumulto ou do quebra-quebra. O autor, diz também, que não esta querendo forçar, apesar de a imprensa e a bibliografia da época falarem em greve pacifica. Chamar o movimento de pacifico, e a documentação produzida neste sentido, pode refletir o fato de a imprensa por exemplo, não noticiar atos violentos para não incentiva-los. Diz o pesquisador que um mês depois da greve encontrou um artigo publicado fazendo referencia á violências na Greve de agosto de 1917. Os meios de comunicação utilizados durante a Greve foram o semanário A Época, o Jornal “A federação” e o “Correio do Povo”. A Federação foi até a LDP pedir permissão para continuar editando seu jornal, coisa que talvez possa ter ocorrido com o Correio do Povo. Esses dois jornais seriam objeto de manifestação de apreço, convocada pela LDP: “Essa manifestação à “imprensa simpática ao movimento” ocorreria na quinta-feira pela manhã. A passeata estimada em 3.000 pessoas, era mobilizada pela LDP, que viria seguida de dezenas de moças, que portavam uma bandeira, que segundo o Correio do Povo era a da FORGS e, segundo A Federação, era da União Operária Internacional. A manifestação também carregava faixas, com “Viva a Imprensa” e “Abaixo os Trusts”. Esta passeata, encaminha-se na mesma quinta-feira até o Palácio do governo estadual, onde uma comissão da LDP, composta por Luiz Derivi, Cecílio Vilar e seu cunhado Zenon de Almeida, é recebida pelas autoridades. Borges de Medeiros declarou a comissão, que declararia naquela tarde, medidas de controle das exportações e atenderia as questões de horas de trabalho e salários para empregados do estado, para dar exemplo aos empregadores. Nesse mesmo dia seriam publicados os decretos estaduais nº 2287 e 2288, o primeiro elevando os salários dos trabalhadores que se achavam ao serviço do Estado, e o segundo regulando a exportação do arroz, banha, batatas, feijão e farinhas.

      No outro dia, o intendente do município José Montaury também atende as reivindicações dos operários. Na quinta-feira, a LDP divulga o seguinte boletim:

“O que o povo precisa fazer:  A Liga concita os trabalhadores que já tenham entrado em acordo com os patrões quanto ao aumento de salário e 8 horas, que continuem em greve até a diminuição dos preços dos gêneros alimentícios, do contrário o que ganhamos voltará aos cofres dos comerciantes. A Liga tem o apoio dos negociantes varejistas que se prontificaram a fechar suas casas, se a Liga quisesse. Portanto a Liga pede que os trabalhadores não façam manifestações para o fechamento de casas comerciais. A Liga protesta contra o boato malévolo de que hajam pessoas com intuito de envenenar a hidráulica municipal. A Liga pede aos trabalhadores que não impeçam o transito de carroças de leite que se destina principalmente a doentes e crianças. A Liga avisa aos trabalhadores que respeitem as permissões que em oficio carimbado pela Liga tem sido feitas para a circulação de veículos que conduzem leite, carne, pão, etc. para a Santa Casa, Asilo de Mendicidade, etc. A Liga espera que os trabalhadores de todas as classes continuem firmes até a baixa dos gêneros de primeira necessidade, conforme fora prometido pelos governos municipal e estadual. A Liga na manifestação que realizou hoje, obteve do presidente do Estado e do intendente que hoje seriam decretadas a restrição da exportação dos gêneros de primeira necessidade, a criação de mercados livres, o barateamento de carne e outras medidas. Com essas medidas, a Liga não julga terminado o movimento: falta muitos industriais cederem às 8 horas e aumento de 25%. Os trabalhadores devem continuar a postos até a vitória final, que será anunciada pela Liga. Sexta-feira, às 9 horas, grande reunião dos operários no salão 1º de maio (Navegantes) para acompanhar a comissão que solicitará dos industriais daquele bairro a concessão das 8 horas e 25% de aumento.” (SILVA JR, 1994. p.319).

      A LDP, segundo Adhemar, não só insistiu para que os trabalhadores continuassem em greve, como inclusive avaliava que uma manifestação de massa, como a que reuniria, sexta-feira pela manhã, os trabalhadores industriais, poderia ser um bom meio de pressão. Mas “manter-se em greve” não significa apenas ser não comparecer ao trabalho: significa especialmente ocupar o espaço público. Deliberadamente ou não o chefe de polícia promoveu uma incerteza e semeou a desconfiança em torno da “liderança” do movimento. O fato é que na quinta-feira às 21 horas o chefe de policia chamou uma comissão da LDP, fazendo-a ver que as concessões do governo do estado foram maiores do que as obtidas pelos grevistas de São Paulo, Rio e Curitiba. O chefe de policia teria “aconselhado” as lideranças a suspenderem a greve, e a comissão ressalvando apenas a impossibilidade que já na sexta-feira todos voltassem ao trabalho devido ao adiantado da hora. O chefe de Polícia, então, comunicou à redação do Correio do Povo o resultado da reunião, de forma que, sexta-feira o matutino já trazia a noticia de fim da greve. Na sexta-feira, a LDP emite um novo boletim, onde diz que não tem fundamento a noticia do Correio do Povo, e que era para esperar a resolução da Liga que seria divulgada em boletim. Mais noticias foram publicadas sobre as ações da policia na tarde de sexta-feira. A partir da tarde de sexta-feira foram proibidas as reuniões em praças públicas. No sábado o policiamento se deslocou do centro da cidade para os arrabaldes. Às 23 horas de Sábado, 04 de agosto, a LDP publicou um boletim.

      Este boletim traça a conduta da LDP e da FORGS: “Termina a greve A Liga de Defesa Popular, reunida ontem, examinando as conquistas feitas pelo proletariado local no atual movimento e o alcance das medidas tomadas pelos poderes públicos para atender a carestia que afogava a população desta capital resolve tomar a seguinte deliberação: Tomando em consideração que a população de Porto Alegre foi contemplada pelas medidas adotadas pelo governo, atingindo a todas as classes em geral, cessando, portanto, o motivo da greve geral, a Liga de Defesa Popular aconselha a volta ao trabalho a todas as classes que o julgarem conveniente. As que quiserem prosseguir em greve, por não terem conseguido seu objetivo, a Liga de Defesa Popular e a Federação Operária do Rio Grande do Sul hipotecam a sua solidariedade e se propõem a tudo fazer por elas. Dando por terminado o atual movimento, a Liga de Defesa Popular espera que os trabalhadores acatem sua resolução e os patrões respeitem os compromissos tomados.” Mesmo após a declaração de fim da greve geral, ainda seguem paralisados estivadores, padeiros, alfaiates, sapateiros, chapeleiros, pedreiros e carpinteiros, calceteiros e canteiros, operários das fabricas de móveis e operários das fabricas de meias.

      Para avaliar se a greve foi vitoriosa, devemos ver em que medida suas reivindicações foram atendidas.

      - O ato municipal nº 137, de 4 de agosto, instituiu os preços máximos a diversos gêneros e alimentos, bem como a multas e outras providencias;

      -É possível que os vencimentos dos operários tenham sido elevados;

      - O ato nº 138, de 25 de agosto de 1917, instituiu os mercados livres (Feiras Livres);

      - Não houve barateamento dos transportes; -Não houve redução dos impostos prediais, sobre prédios de aluguel barato;

      - Não foi implementado um matadouro público para fornecimento de carne;

      - Não houve desconto na conta do fornecimento de água;

      - Dos 241 estabelecimentos industriais, comerciais e de serviços, sabe-se que 185 cederam e 56 não cederam as reivindicações dos operários ( segundo o autor, esses dados não são completos);

      Segundo Adhemar Jr. a Greve Geral de 1917 em Porto Alegre foi a primeira Greve Geral do Brasil. As outras, segundo ele, foram greves generalizadas, que foram crescendo e aos poucos somando adesões. Em Porto Alegre, a greve já nasceu com convocação de GREVE GERAL. A Greve Geral possuía um sentido mítico no imaginário político dos operários do inicio do século XX.

 

A Greve Geral de 1917 possibilita uma série de interpretações onde muitas delas são um tanto quanto românticas. Parte significativa das narrativas memorialistas de confrontos, bombas e radicalização não aconteceram em 1917 e sim em 1918 e 1919. Segundo Cesar B. Queiróz é importante analisar a Greve de 1917 dentro do contexto e do conjunto de greves que aconteceram no período (1917, 1918 e 1919). Para Queiroz, no livro “Desvarios anarquistas na Rússia rio-grandense”, a Greve Geral de 1917 em Porto Alegre foi reconhecida a legitimidade de suas reivindicações e houve um canal de comunicação entre o Estado e a mobilização. Isso impediu sua radicalização. Já em 1919 o governo não reconheceu a justeza do movimento e viu nas lideranças do movimento, nesse momento sim, grande parte anarquista, uma tentativa de sublevação e insurreição revolucionária. Não houve negociação e sim confronto. Os militantes anarquistas foram importantes na mobilização da Greve Geral de 1917. O êxito do movimento se deu a um conjunto de fatores que não foi possível discuti-los nesse breve texto. Após os acontecimentos de 1917 ocorreram uma série de críticas e autocriticas sobre a ação dos anarquistas nesse movimento. Inclusive o próprio militante anarquista Polidoro Santos afastou-se do movimento sindical após esses episódios.

 

Referências:

BODEA, Miguel. A Greve de 1917: As origens do trabalhismo gaúcho. L&PM, POA, s/d

PETERSEN, Sílvia R. Ferraz. As Greves no Rio Grande do Sul. In: RS; Economia e política; por Guilhermino César e outros. Org. Hildebrando Dacanal e Sergius Gonzaga. S ed. Porto Alegre. Mercado Aberto, 1993.

QUEIROZ, Cesar Augusto Bulboz. “Desvarios anarquistas na Rússia Rio-Grandense”: as grandes greves na Primeira República (1917-1919). Manaus: EDUA, 2016.

SILVA JR. Adhemar Lourenço da. “Povo! Trabalhadores!”: tumultos e movimento operário (estudo centrado em Porto Alegre, 1917). Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 1994.






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