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ISSN 0033-1983
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Coluna Além das Quatro Linhas
Além das quatro linhas – edição de 20 de setembro de 2010
| pensamentos presentes
A rivalidade dentro de campo não pode e nem deve se transformar para reforço do argumento chauvinista de torcedores semi- profissionais devidamente manipulados por cartolas “desinteressados”. Todo cuidado é pouco.
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Dijair Brilhantes & Bruno Lima Rocha
Sirvam nossas façanhas de modelo a toda terra! Mas, quais delas?
O dia 20 de setembro é marca da proclamação da República Rio-grandense no primeiro ano da maior guerra civil “brasileira”. Trata-se de um marco inquestionável na história do Rio Grande do Sul, a Revolução Farroupilha, ou a Guerra dos Farrapos, sendo que o partido farroupilha era de linha liberal moderada e se espraiava por algumas províncias do Império Luso-brasileiro. Muito se fala e pouco se entende desta epopéia. Não bastam as críticas economicistas, o problema é de fundo e se relaciona com a identidade de nação e regionalidade. Não por acaso, a maior influência para a Farroupilha vinha da Província Cisplatina independente e livre da ocupação luso-brasileira. A única chance de vitória militar para o estado-maior composto por liberais monarquistas e republicanos escravagistas vinha da minoria ancorada nos “exaltados”, a ala liberal radical que vencia as batalhas de a caballo, mas não as ganhava nos bastidores da política. enviar imprimir Muito tempo se passara e ainda insistimos em substituir a história pelo folclore. Bem ou mal, a guerra (as guerras) fizera deste estado o que é hoje: a “menos pior” divisão de renda do Brasil, um código de valores ainda ancorados na idéia de luta justa e de defesa de causas e lados, e uma noção difusa de tradições (pouco originais em muitos casos) e que reproduz o inverso do gaúcho platense, peleador, indomável, inimigo da cerca e da propriedade, mais índio do que patrício, mais gaudério que povoeiro e, diga-se de passagem, por influência da colônia de povoamento, o arquétipo coletivo de um povo batalhador, que luta por seus objetivos e se orgulha da história (desde que o povão não compreenda muito de nada) e honra suas tradições. De um jeito ou de outro, para além dos galpões, a coisa se manifesta no dia a dia de quem não vivencia o “tradicionalismo” (com o perdão de Martín Fierro, pois aqui o puseram numa fábula agro-pastoril onde não há pampa sem patrão e nem destino errante sem capataz!) através do futebol!
Neste sentido, de forma alguma há um sentimento de superioridade a qualquer outro estado deste país chamado Brasil, apenas há um prazer em viver por estes pagos, prazer este devidamente realçado pela mídia da Província do Eucalipto e do Fundopem (baita mamata!). Não resta pretensão de separatismo (até porque a alta hierarquia do MTG proíbe esta posição) e nem sequer se adentra no tema do federalismo para além da redistribuição fiscal. Ao que parece, afora panela de ferro e carreteiro de charque, a bravura altaneira não corresponde na grande política, como seria de esperar com o povo nas ruas das cidades-pólo e capitais a exigir moratória unilateral da agiotagem de banqueiros avalizados por seus fiadores de Brasília. Na ausência das guerras pelas quais vale à pena pelear, resta defender o pago no cantar do hino republicano como um despertar popular no meio da cancha patrocinada, do ataque da especulação imobiliária e da cartolagem sem trégua lançando-se a cargos de deputado estadual e federal (como dizia o torcedor do Fluminense Chico Buarque: “malandro de gravata e capital, malandro candidato a malandro federal”).
Sejamos justos e pouco críticos um dia por fim. No futebol a coisa ainda pega, até porque a dupla Gre-Nal abafa o bola do interior e polariza a audiência das rádios AM replicada em suas versões piratas no FM (sem autorização da Anatel para reproduzir a mesma programação em duas freqüências distintas). O orgulho dos boleiros vem de longa data e culturalmente temos a fama de “bairristas”. Isto não é visto como defeito, e sim como virtude; sempre devidamente aproveitada pelas empresas a investir em nichos de mercado de gaúchos (a Oi, filha de Carlos Jereissati com Sérgio Andrade e agora retro-alimentada pela Portugal Telecom, que o diga!). Mas, nem tudo são espinhos no dia a dia da Província. O cidadão brasileiro em geral não se sente parte de uma coletividade maior como aqui. O sentimento que atravessa o estado é de pertencer a algo, mesmo que nessa carroça as melancias se confundam com a indumentária e os trejeitos do latifúndio. Mas, se todos amassem seu estado como os gaúchos, é de certo, viveríamos num país melhor. Pelo menos isso.
O orgulho gaúcho – ou gaucho - passa por aqui
Não se pode negar, o orgulho gauchesco passa sim pelo futebol. Vivemos em um estado onde tudo beira ao extremo, principalmente a rivalidade Gre-Nal. Rivalidade que ficou mais acirrada após o ano de 2006 quando o Internacional conquistou sua primeira Copa Libertadores (repararam como não colocamos o nome do patrocinador?!) e o título mundial. Desta forma, quase se iguala ao feito que o maior rival Grêmio orgulhou-se por longos 23 anos por ser o único do estado a ter os dois títulos. Neste ano corrente, com a segunda vitória na Libertadores, o colorado equipara com os gremistas em termos internacionais (com o perdão do trocadilho infame). Faltava para o time do Menino Deus tal feito, afinal tiveram um grande elenco nos anos 70, cheio de glórias e conquistas, um tri campeonato brasileiro, e um octacampeão gaúcho. Mas faltava ganhar algo fora do Brasil, e a partir de 2006 (passada a baixaria de 2005) vieram duas primeiras conquistas para além do país e a rivalidade ganhou uma proporção impossível de explicar em poucas linhas.
Já o Grêmio é conhecido por feitos épicos. Dois dos maiores exemplos constam na história tricolor. A “guerra” de La Plata na Argentina em 1983 (sendo que jogar na capital da Província de Buenos Aires sempre foi coisa de herói ou louco), ano da conquista da primeira Copa Libertadores, e a recente Batalha dos Aflitos no Recife em 2005, quando a imortalidade foi comprovada diante de milhões de telespectadores. Neste pedaço do mundo onde antes a Pampa corria livre até quase a Patagônia, a paixão aumenta, os clubes crescem com seus feitos, e o Brasil tende a se orgulhar de ter dois clubes campeões mundiais em um mesmo estado. Além disso, o futebol gaúcho ainda conta com 4 Copa Libertadores, 2 Recopas , 1 Copa Sulamericana, 5 títulos brasileiros, 6 copas do Brasil. Trata-se de um bom currículo para uma unidade da “federação” que conta apenas com dois times na primeira divisão do futebol nacional. Os mineiros que o digam.
Exagero santista, ou como reforçar um comportamento equivocado
Semana passada, na vitória do Santos sobre o Atlético-GO, outra vez o atacante santista Neymar foi manchete na maioria dos jornais do Brasil. Infelizmente não por sua genialidade em campo, mas por um bate boca em público com o técnico Dorival Junior. O mais novo milionário do futebol brasileiro parece desconhecer o sentido da palavra hierarquia, e que seu “monstruoso’ salário não o deixa livre para fazer o que bem entender dentro de campo. Assim ao menos esperávamos, até que a cartolagem toma uma espinafrada (este termo retiramos da cartola do mágico sem coelho!) dos patrocinadores associados no contrato do atacante da baixada santista e a diretoria do clube bi-campeão do mundo (1962-1963) tem um comportamento varzeano.
O problema passa pela estrutura de gestão. O Santos Futebol Clube, como todos os outros clubes brasileiros, tem um regime presidencialista, e todos os funcionários do clube cumprem ordens. Em tese, porque o problema é que uns são mais iguais do que os outros. E isso dá raiva, e muita. É certo, Neymar não foi o único a cometer exageros, pois o técnico do clube goiano Renê Simões disse em entrevista que estávamos criando um “monstro” no futebol brasileiro.
Tal declaração é no mínimo exagerada. Chamar o atacante santista de monstro mais parece despeito e choro de perdedor. Este termo pode ser dado para a moral da bandidagem, exercida, por exemplo, pelo ex-goleiro do Flamengo o qual não merece nem mesmo ter seu nome citado. O mesmo pode ser dito de diretorias de certo clube carioca (o maior endividado do país, quem será?) que escalara diretores de torcida organizada para a gerência de futebol e, quando o time estava mal ou em crise, fechavam “saunas” para uma confraternização coletiva. O “menino da Vila” está longe disso, ao menos por enquanto.
Concordamos que Neymar é um jovem de talento promissor. Mas, os mimos dados ao atleta o estão prejudicando em sua curta carreira. É preciso frear a Kombi destrambelhada ladeira abaixo, pois as declarações e atitudes pendem para o lado negativo (e estes “fatos noticiosos” dão audiência e vendem jornal). Para quem imagina estarmos exagerando, vejamos o caso de Adriano, o “ex-imperador”. Precisa falar mais? Agora a babaquice do piá deslumbrado derruba um técnico vitorioso e que dera jeito num time complicado. Dorival Júnior ganhou o Paulistão desse ano e a Copa do Brasil. Agora, com o “professor“ fora, Robinho mais maduro de volta à Europa, a tendência é um time em frangalhos, refém dos caprichos do craque e de quem paga seu salário. Quanto tempo vai durar a liderança de Ganso dentro de campo?
Neymar não é Pelé; até porque Pelé em campo é muito melhor do que Edson Arantes do Nascimento, que o diga a UNICEF e as criancinhas do Brasil. Quem avisa amigo é; se bobear vem aí a mais nova mala marrenta e desestabilizada do futebol brasileiro.
Dijair Brilhantes é estudante de jornalismo, Bruno Lima Rocha é editor do portal Estratégia & Análise
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