As falhas apareceram desde o primeiro jogo...
O Santos chegou ao Japão pensando no Barcelona. O mundo inteiro esperava pela provável final entre dois times cuja parte ofensiva é primorosa. Porém, depois do rescaldo dado pelos congoleses do Mazembe no ano passado – quando, surpreendentemente, venceram o favorito Internacional –, todos sabiam que antes os dois times precisavam passar pelos adversários das semifinais.
Na quarta-feira, atuando com a formação utilizada nos últimos jogos do Brasileirão – com o time titular em campo –, o Santos sofreu para passar pelos japoneses do Kashiwa Reysol.
O setor defensivo cansou de falhar ao longo da partida, mesmo contando com dois zagueiros (Bruno Rodrigo e Edu Dracena) e Durval, outro zagueiro, na lateral-esquerda, setor justamente onde os japoneses mais atacavam – em detrimento ao lado direito defensivo santista, que tinha a presença do ofensivo Danilo.
A vitória por 3 a 1 saiu graças à individualidade de jogadores como Neymar e Borges, em excelentes chutes de fora da área, e da boa cobrança de falta de Danilo, que se aproveitou do erro do goleiro adversário em montar a barreira. De qualquer forma, se era aquilo que os santistas tinham para mostrar, os espanhois já começavam a se tranquilizar. Não seria o suficiente.
No dia seguinte, poupando alguns titulares, como o brasileiro Daniel Alves e o candidato a melhor do mundo Xavi, o Barcelona passeou contra os catarianos do Al Sadd, cujo país tem a fundação que banca ao Barça o maior patrocínio master do mundo. Seja com reservas na Copa Audi, no clássico contra o Real Madrid ou contra o campeão asiático, sempre se mantém a forma de jogo: toque de bola refinado, criando brechas para chegar ao gol.
Assim saíram os dois gols do brasileiro Adriano, lateral-esquerdo “improvisado” na direita, o gol de Keita e do também brasileiro Maxwell. A parte negativa ficou para a fratura na tíbia da perna esquerda do centroavante Davi Villa. Envolto a especulações de saída do clube, o jogador foi colocado pelo técnico Pep Guardiola para provar que não tinha nada disso. Dias antes, Pep respondera assim ao principal jornal esportivo de Madrid: “o Marca mente” – já pensaram o dia em que algum treinador tiver coragem de dizer isso com jornalões ou TVs poderosas do Brasil?
E se os brasileiros vinham de um semestre de quase descanso no Brasileirão, cinco dias antes os catalães haviam ganhado do rival Real Madrid de virada, em pleno Santiago Bernabéu, por 3 a 1. Uma prévia aos seus adversários que já o esperavam no Japão.
Dentre as entrevistas coletivas, numa Muricy Ramalho foi deselegante - o que não chega a ser novidade - ao dizer que Guardiola só poderia ser considerado bom se trabalhasse no Brasil, para conviver com a pressão. A resposta veio em campo na manhã de domingo.
Faltou jogar
Muito se falou no confronto entre Lionel Messi e Neymar. O argentino deve ser escolhido pela terceira vez consecutiva o melhor jogador do mundo. Neymar já conseguiu o grande feito de ficar entre os vinte e três melhores pela FIFA.
Todos aguardavam para ver o que o técnico Muricy Ramalho iria fazer para tentar parar o fantástico time do Barcelona. Jogaria como este Santos sempre soube fazer, de forma ofensiva, aproveitando a qualidade do seu trio da frente; ou se apequenando, a forma que geralmente deu certo para os brasileiros contra os europeus?
Muricy optou pela segunda opção. Recheou o time de marcadores, voltando com Leo na lateral-esquerda e trazendo Durval para a defesa. No meio, Arouca e Henrique tentariam proteger a defesa, isolando Paulo Henrique Ganso, Neymar e Borges no ataque. O Santos se propunha a ver o Barcelona jogar e esperar um contra ataque. Tudo que o Barcelona queria.
O time catalão veio para a partida com uma formação diferente da usual, já que não contava com um centroavante para formar o trio de ataque. Além disso, Pedro ficou no banco, com Iniesta, Daniel Alves (ponta-direita) e Fábregas se revezando com Messi lá na frente.
23 minutos foi o tempo que durou a esperança santista. Após duas falhas defensivas, dois golaços, um de Messi e outro de Xavi – quem alguns acham que não joga tanta bola assim... –, praticamente adiavam o sonho dos meninos da Vila. Muricy só mudou algo porque Danilo – em despedida para o Porto – saiu machucado, entrando o meia Elano.
Para fechar o jogo ainda no primeiro tempo, Fábregas pegou rebote de Rafael, que fizera duas grandes defesas numa mesma jogada, e só empurrou para o gol. A pergunta tornara-se: em quanto terminará o massacre?
No segundo tempo, o Barcelona cansou de perder oportunidades de gols. A tirada de pé dos catalães e a mudança da forma de jogar santista, agora (um pouco) mais ofensiva, ainda permitiu vermos duas chances de gol desperdiçadas por Borges e Neymar.
Para terminar o baile, Messi recebeu na área, driblou Rafael e marcou o seu segundo gol na partida. O argentino se igualou ao também barcelonista Pedro (em 2009), como os únicos jogadores a marcarem gols nas seis competições que disputaram num ano.
O 4 a 0 acabou ficando de bom tamanho, devido à desorganização santista. O time brasileiro não conseguiu defender com segurança e nem atacar com precisão. É redundância dizer que o título ficou em boas mãos.
O capitão, Carles Puyol, admitiu depois do jogo que teve medo ao ver as jogadas de Neymar, mas que dera certo a ideia de não deixar a bola chegar até ele. A disputa foi quase desumana, Neymar sucumbiu ao futebol coletivo dos espanhóis e admitiu isso ao final do jogo. Messi, junto com seus companheiros, deu mais um show de futebol.
A FIFA também acerta
Poucas vezes esta coluna fez algum tipo de elogio a FIFA. Não porque usamos de má vontade com os todo-poderosos do futebol mundial. A falta de transparência nas atitudes da entidade é que nos leva a isso.
Mas as organizações dos torneios sob responsabilidade da entidade merecem elogios. Todos seguem o protocolo, os horários são seguidos à risca, e ninguém rouba a cena das verdadeiras estrelas do espetáculo que são os jogadores.
Isto é algo que deve ser seguido pela CBF e principalmente pela Conmebol, que proporciona verdadeiras farras nas finais de Libertadores, quando aparecem do nada parentes de autoridades dentro de campo.
E O Rei?
O eterno camisa 10 santista não foi ao Japão. Pelé preferiu ficar no Brasil para fazer uma cirurgia de catarata. Após a Libertadores, o presidente santista convidou o rei do futebol para “jogar” o Mundial como uma estratégia de marketing – e talvez o time até precisasse dele mesmo...
Pelé negou o convite e nem sequer acompanhou o time do coração de perto, talvez por temer um fracasso na terra do sol nascente, o que acabou se confirmando. Dificilmente vemos Pelé nas derrotas, tanto de cubes brasileiros quanto da seleção, já nas vitórias...
Muricy tem razão?
Muricy tem razão quando diz que a pressão que sofre um técnico no Brasil é incomparável. Mas o maior mérito do técnico Pep Guardiola não é exatamente fazer o time do Barcelona jogar, afinal é um time de craques. O segredo a ser desvendado é como um time de jogadores milionários joga tão bem coletivamente chegando aos incríveis 70% de posse de bola por jogo? O Barcelona não “perde” na posse de bola há três anos!!!
Não há briga de egos e o clube só acumula taças. Já são duas Ligas dos Campeões da Europa e duas Copas do Mundo de Clubes nos últimos três anos, a “Era Guardiola”.
Primeiro, é preciso afirmar que craques o Barcelona faz nas suas categorias de base - como o Flamengo se orgulhava de fazer por aqui. Dos onze jogadores que começaram a final, nove foram formados em casa – as exceções são Daniel Alves e Abidal. Não temos nenhum “jogador clássico” de bases do Brasil: altos, fortes e que respeitam posição. Parece que a prioridade nas terras catalãs é que se saiba jogar futebol.
As comparações com grandes times, em especial com o “Carrossel Holandês” comandado por Cruyff e Rinus Michels em 1974, são recorrentes. O time toca, toca, toca, mas geralmente chega ao gol e às vitórias nos deleitando. Longe de ser um futebol burocrático, como o do Brasil de Parreira em 1994, os atletas trocam de posição e tornam quase impossível pará-los.
Fora de campo, a história da luta catalã, representada por bandeiras da Catalunha e não da Espanha com seus torcedores, é um capítulo a parte. A intenção de esperar mais de 100 anos para colocar um patrocínio na camisa para não “manchar” a sua história é outra coisa, já que recebe dinheiro de uma fundação social – por mais duvidosa que possa parecer por vir do Catar.
Definitivamente, este FC Barcelona é “més que un club”!