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Coluna Além das Quatro Linhas


O ano do futebol brasileiro acaba com uma aula catalã

Latuff

Messi e seus companheiros do Barcelona deram aula ao jovem Neymar

20 de dezembro de 2011, Anderson Santos (editor) e Dijair Brilhantes

Quando nos decidimos por fazer uma edição especial da Além das Quatro Linhas sobre a final da Copa do Mundo de Clubes da FIFA sabíamos da imensa dificuldade do Santos perante uma das melhores equipes da história do futebol mundial, só não esperávamos que seria tão fácil.

Na manhã do último domingo foi encerrada oficialmente a temporada para o futebol brasileiro. De forma melancólica, o Santos Futebol Clube foi goleado pelo Barcelona como nunca antes um time sul-americano perdera para um europeu. Neymar, apagado na partida, resumiu bem o que ela foi: uma aula magistral de futebol.

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As falhas apareceram desde o primeiro jogo...

O Santos chegou ao Japão pensando no Barcelona. O mundo inteiro esperava pela provável final entre dois times cuja parte ofensiva é primorosa. Porém, depois do rescaldo dado pelos congoleses do Mazembe no ano passado – quando, surpreendentemente, venceram o favorito Internacional –, todos sabiam que antes os dois times precisavam passar pelos adversários das semifinais.

Na quarta-feira, atuando com a formação utilizada nos últimos jogos do Brasileirão – com o time titular em campo –, o Santos sofreu para passar pelos japoneses do Kashiwa Reysol.

O setor defensivo cansou de falhar ao longo da partida, mesmo contando com dois zagueiros (Bruno Rodrigo e Edu Dracena) e Durval, outro zagueiro, na lateral-esquerda, setor justamente onde os japoneses mais atacavam – em detrimento ao lado direito defensivo santista, que tinha a presença do ofensivo Danilo.

A vitória por 3 a 1 saiu graças à individualidade de jogadores como Neymar e Borges, em excelentes chutes de fora da área, e da boa cobrança de falta de Danilo, que se aproveitou do erro do goleiro adversário em montar a barreira. De qualquer forma, se era aquilo que os santistas tinham para mostrar, os espanhois já começavam a se tranquilizar. Não seria o suficiente.

No dia seguinte, poupando alguns titulares, como o brasileiro Daniel Alves e o candidato a melhor do mundo Xavi, o Barcelona passeou contra os catarianos do Al Sadd, cujo país tem a fundação que banca ao Barça o maior patrocínio master do mundo. Seja com reservas na Copa Audi, no clássico contra o Real Madrid ou contra o campeão asiático, sempre se mantém a forma de jogo: toque de bola refinado, criando brechas para chegar ao gol.

Assim saíram os dois gols do brasileiro Adriano, lateral-esquerdo “improvisado” na direita, o gol de Keita e do também brasileiro Maxwell. A parte negativa ficou para a fratura na tíbia da perna esquerda do centroavante Davi Villa. Envolto a especulações de saída do clube, o jogador foi colocado pelo técnico Pep Guardiola para provar que não tinha nada disso. Dias antes, Pep respondera assim ao principal jornal esportivo de Madrid: “o Marca mente” – já pensaram o dia em que algum treinador tiver coragem de dizer isso com jornalões ou TVs poderosas do Brasil?

E se os brasileiros vinham de um semestre de quase descanso no Brasileirão, cinco dias antes os catalães haviam ganhado do rival Real Madrid de virada, em pleno Santiago Bernabéu, por 3 a 1. Uma prévia aos seus adversários que já o esperavam no Japão.

Dentre as entrevistas coletivas, numa Muricy Ramalho foi deselegante - o que não chega a ser novidade - ao dizer que Guardiola só poderia ser considerado bom se trabalhasse no Brasil, para conviver com a pressão. A resposta veio em campo na manhã de domingo.

Faltou jogar

Muito se falou no confronto entre Lionel Messi e Neymar. O argentino deve ser escolhido pela terceira vez consecutiva o melhor jogador do mundo. Neymar já conseguiu o grande feito de ficar entre os vinte e três melhores pela FIFA.

Todos aguardavam para ver o que o técnico Muricy Ramalho iria fazer para tentar parar o fantástico time do Barcelona. Jogaria como este Santos sempre soube fazer, de forma ofensiva, aproveitando a qualidade do seu trio da frente; ou se apequenando, a forma que geralmente deu certo para os brasileiros contra os europeus?

Muricy optou pela segunda opção. Recheou o time de marcadores, voltando com Leo na lateral-esquerda e trazendo Durval para a defesa. No meio, Arouca e Henrique tentariam proteger a defesa, isolando Paulo Henrique Ganso, Neymar e Borges no ataque. O Santos se propunha a ver o Barcelona jogar e esperar um contra ataque. Tudo que o Barcelona queria.

O time catalão veio para a partida com uma formação diferente da usual, já que não contava com um centroavante para formar o trio de ataque. Além disso, Pedro ficou no banco, com Iniesta, Daniel Alves (ponta-direita) e Fábregas se revezando com Messi lá na frente.

23 minutos foi o tempo que durou a esperança santista. Após duas falhas defensivas, dois golaços, um de Messi e outro de Xavi – quem alguns acham que não joga tanta bola assim... –, praticamente adiavam o sonho dos meninos da Vila. Muricy só mudou algo porque Danilo – em despedida para o Porto – saiu machucado, entrando o meia Elano.

Para fechar o jogo ainda no primeiro tempo, Fábregas pegou rebote de Rafael, que fizera duas grandes defesas numa mesma jogada, e só empurrou para o gol. A pergunta tornara-se: em quanto terminará o massacre?

No segundo tempo, o Barcelona cansou de perder oportunidades de gols. A tirada de pé dos catalães e a mudança da forma de jogar santista, agora (um pouco) mais ofensiva, ainda permitiu vermos duas chances de gol desperdiçadas por Borges e Neymar.

Para terminar o baile, Messi recebeu na área, driblou Rafael e marcou o seu segundo gol na partida. O argentino se igualou ao também barcelonista Pedro (em 2009), como os únicos jogadores a marcarem gols nas seis competições que disputaram num ano.

O 4 a 0 acabou ficando de bom tamanho, devido à desorganização santista. O time brasileiro não conseguiu defender com segurança e nem atacar com precisão. É redundância dizer que o título ficou em boas mãos.

O capitão, Carles Puyol, admitiu depois do jogo que teve medo ao ver as jogadas de Neymar, mas que dera certo a ideia de não deixar a bola chegar até ele. A disputa foi quase desumana, Neymar sucumbiu ao futebol coletivo dos espanhóis e admitiu isso ao final do jogo. Messi, junto com seus companheiros, deu mais um show de futebol.

A FIFA também acerta

Poucas vezes esta coluna fez algum tipo de elogio a FIFA. Não porque usamos de má vontade com os todo-poderosos do futebol mundial. A falta de transparência nas atitudes da entidade é que nos leva a isso.

Mas as organizações dos torneios sob responsabilidade da entidade merecem elogios. Todos seguem o protocolo, os horários são seguidos à risca, e ninguém rouba a cena das verdadeiras estrelas do espetáculo que são os jogadores.

Isto é algo que deve ser seguido pela CBF e principalmente pela Conmebol, que proporciona verdadeiras farras nas finais de Libertadores, quando aparecem do nada parentes de autoridades dentro de campo.

E O Rei?

O eterno camisa 10 santista não foi ao Japão. Pelé preferiu ficar no Brasil para fazer uma cirurgia de catarata. Após a Libertadores, o presidente santista convidou o rei do futebol para “jogar” o Mundial como uma estratégia de marketing – e talvez o time até precisasse dele mesmo...

Pelé negou o convite e nem sequer acompanhou o time do coração de perto, talvez por temer um fracasso na terra do sol nascente, o que acabou se confirmando. Dificilmente vemos Pelé nas derrotas, tanto de cubes brasileiros quanto da seleção, já nas vitórias...

Muricy tem razão?

Muricy tem razão quando diz que a pressão que sofre um técnico no Brasil é incomparável. Mas o maior mérito do técnico Pep Guardiola não é exatamente fazer o time do Barcelona jogar, afinal é um time de craques. O segredo a ser desvendado é como um time de jogadores milionários joga tão bem coletivamente chegando aos incríveis 70% de posse de bola por jogo? O Barcelona não “perde” na posse de bola há três anos!!!

Não há briga de egos e o clube só acumula taças. Já são duas Ligas dos Campeões da Europa e duas Copas do Mundo de Clubes nos últimos três anos, a “Era Guardiola”.

Primeiro, é preciso afirmar que craques o Barcelona faz nas suas categorias de base - como o Flamengo se orgulhava de fazer por aqui. Dos onze jogadores que começaram a final, nove foram formados em casa – as exceções são Daniel Alves e Abidal. Não temos nenhum “jogador clássico” de bases do Brasil: altos, fortes e que respeitam posição. Parece que a prioridade nas terras catalãs é que se saiba jogar futebol.

As comparações com grandes times, em especial com o “Carrossel Holandês” comandado por Cruyff e Rinus Michels em 1974, são recorrentes. O time toca, toca, toca, mas geralmente chega ao gol e às vitórias nos deleitando. Longe de ser um futebol burocrático, como o do Brasil de Parreira em 1994, os atletas trocam de posição e tornam quase impossível pará-los.

Fora de campo, a história da luta catalã, representada por bandeiras da Catalunha e não da Espanha com seus torcedores, é um capítulo a parte. A intenção de esperar mais de 100 anos para colocar um patrocínio na camisa para não “manchar” a sua história é outra coisa, já que recebe dinheiro de uma fundação social – por mais duvidosa que possa parecer por vir do Catar.

Definitivamente, este FC Barcelona é “més que un club”!






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