21 de junho de 2013, Bruno Lima Rocha
Na tarde da 5ª feira 20 de junho combinei de ir com minha namorada, que é fotógrafa e jornalista embora trabalhe em área afim da comunicação, ao ato pela redução do Aumento das Passagens. Esta concentração e marcha, assim como as anteriores, foi convocada pelo Bloco de Luta pelo Transporte Público. Vale observar que embora tenha trajetória militante, nos últimos anos dedico-me apenas a chamada militância jornalística, escrevendo para o blog de política mais lido do país e sendo colunista dos jornais estaduais de rádios comunitárias do Rio Grande do Sul e de São Paulo. Recentemente, escrevo uma coluna fixa de política internacional em um respeitado impresso alternativo quinzenal porto-alegrense. Este é o primeiro ato que vou, isto porque dou aulas de noite e na tarde de 5ª (20/06/13), uma das instituições de nível superior onde trabalho suspendeu as aulas. A intenção era registrar a concentração e a marcha com fotos.
Encontramo-nos ao final do dia em frente à Prefeitura de Porto Alegre, em local conhecido como Paço Municipal. Lá, sob chuva, vento e frio, já havia cerca de 2000 pessoas, faltando mais de uma hora e meia para o início da marcha. O clima era muito, mas muito tranqüilo. A multidão, composta em sua maioria de jovens, cantava debaixo de chuva, alternando palavras de ordem, cânticos e um bom senso de humor. Até a repressão começar, em função do cerco e defesa do perímetro da sede principal do Grupo RBS (na esquina das avenidas Ipiranga com Érico Veríssimo), o ambiente lembrava o movimento Fora Collor, ocorrido há 21 anos. Na ocasião, em 1992, havia mais festa que luta política, sendo embalada a juventude com a cara-pintada de verde e amarelo. Hoje, enquanto o cordão não saía, observei bandeiras do Brasil e do Rio Grande do Sul, algumas bandeiras negras e vermelhas, e só. A maioria estava em pequenos grupos, com cartazes pintados a mão e escondendo-se debaixo de guarda-chuvas.
Por volta de 19 horas, a multidão se divide. A maior parte sai em um cordão subindo a Avenida Borges de Medeiros no sentido da Avenida Salgado Filho, enquanto outro menor, onde nos encontrávamos, segue pela Júlio de Castilhos, cruza o túnel da Conceição através do elevado e termina reencontrando a parcela maior no elevado da Salgado Filho. Já na João Pessoa, cruzamos diante de duas sedes municipais partidárias (PT e PMDB), além de um Hospital Militar. Vaias tímidas foram a maior “ofensa” a estas legendas. No trajeto, bares e mercadinhos abertos, e nada além de palavras de ordem genéricas. Até então não houve nenhuma, absolutamente nenhuma cena de violência.
Chegando à esquina da Avenida João Pessoa com a Avenida Ipiranga, no sentido bairro-Centro, o cordão parou e algumas pessoas começaram a retornar. A maior parte continuou caminhando e com esta seguimos. Ficamos em torno de 25 minutos nos deslocando entre a João Pessoa, a Ipiranga e a Rua Lima e Silva. Tentamos ver o que se passava e apenas escutávamos o arremesso de bombas de gás lacrimogêneo e de efeito moral. Contabilizei 62 bombas atiradas pela Brigada Militar. No caminho do retorno, andando com calma, pude conversar com 12 pessoas que estavam na Ipiranga e puderam ao menos observar as linhas de defesa da BM. Todos respiravam mal, cheios de gás lacrimogêneo e spray de pimenta marcando seus rostos. O relato foi comum: “a gente estava lá, apenas caminhando, e de repente começou a chover bomba e mais bomba!” Foi exatamente isso o que ocorreu.
A partir deste momento, casais e grupos de amigos começavam a voltar enquanto alguns jovens se revoltavam e partiam no rumo da Avenida Ipiranga. Toda a violência dos manifestantes, todas as agências de banco quebradas e demais aparelhos urbanos danificados são conseqüência da ira popular após a covardia exercida pela BM, a mando do governo do estado e em defesa do capital simbólico do Grupo RBS. Toda a responsabilidade por esta revolta e violência deve ser atribuída ao governo estadual, sua polícia ostensiva e a empresa líder de comunicação no estado. Até o momento em que o cordão chegou a duas quadras de distância da RBS nada havia acontecido, e provavelmente nada aconteceria, além de uma bela marcha de protesto motivada pelo exercício direto dos direitos. O detalhe é que o trajeto da manifestação foi amplamente divulgada, informação esta transmitida em um debate na Rádio Guaíba no início da tarde desta 5ª.
Os atos da noite de 20 de junho ultrapassaram o total de 1 milhão e meio de pessoas, incluindo mais de 100 cidades brasileiras. Em Porto Alegre, o dispositivo de policiamento ostensivo da BM totalizou cerca de 850 homens, segundo a mídia comercial. Trata-se do maior contingente em cinco anos. Desde o auge da repressão durante o governo de Yeda Crusius (PSDB, 2007-2010) não havia tanta tropa na rua. Os alvos de então eram políticos assim como são hoje. A meta era reprimir o movimento popular e esta se mantém intacta. Na eleição de 2010, o advogado Tarso Genro ganhou no primeiro turno pela rejeição ao governo passado. Agora, o ex-militante do PRC opera por dentro do governo sub-nacional e joga para a torcida de dia, convocando um debate com movimentos sociais e blogueiros através do Gabinete Digital. De noite, subordina seu governo aos interesses e defesa “moral” do patrimônio do Grupo RBS.
Venho afirmando que o Poder Executivo do estado rio-grandense e do município de Porto Alegre comporta-se como refém e serviçal do grupo de comunicação que lidera o oligopólio estadual. Na noite desta 5ª feira, 20 de junho, todo o Rio Grande do Sul teve a prova cabal desta análise.