Daniel Ortega realizou várias alianças impensáveis no passado para garantir sua atual candidatura. Presidente da Nicarágua entre os anos de 1979 e 1990, o político se aliou a grupos que o enfrentaram duramente nos anos ‘80. Nesse período, com a FSLN no governo, ele liderou um processo de câmbio social e político, conhecida como a 2ª etapa da revolução sandinista. Manteve o esforço de guerra lutando contra paramilitares patrocinados pelos Estados Unidos, os chamados "Contras", estatizou parte da economia e realizou confiscos de terras. Cerca de 50 mil pessoas morreram no conflito financiado pela CIA e estimulado pelas teses da Teoria do Dominó, no mandato Reagan-Bush pai.
Quando esteve no poder, o sandinista era visto como uma ameaça para a estabilidade na América Central. O governo da FSNL aplicou uma reforma agrária parcial e acuou o empresariado local, que temia que a Nicarágua seguisse os passos da nacionalização promovida por Fidel Castro em Cuba. Nas eleições presidenciais de 1990, Ortega foi inesperadamente derrotado por Violeta Chamorro, oriunda da oligarquia criolla do país, mas com o capital político de ser viúva de um jornalista morto pelo regime do ditador Anastacio Somoza. Este por sinal, derrotado militarmente pelos sandinistas, era conhecido por Nixon como “ o nosso fdp!”. Apesar de Ortega não ter obtido sucesso nas eleições de 1996 e 2001, nunca desistiu de tentar retornar ao poder.
O político tem se pronunciado afirmando que seus dias de revolucionário ficaram para trás e que acredita em reconciliação e unidade nacional policlassista. Comprovando seus discursos, tem como vice o banqueiro e ex-líder dos Contra Jaime Morales, antigo proprietário da casa em que o recém-eleito presidente vive hoje com sua mulher Rosario. A casa foi confiscada pelos sandinistas quando estavam no poder. No simbólico, a ascenção social dos dirigentes da FSLN na Manágua recém ocupada foi conhecida como o “assalto às mansões”. De mansão para dacha, de dirigência para nomenklatura, levou pouco mais de uma década para a derrota ideológica florescer no interior do antigo estado-maior revolucionário.
Também no passado, os sandinistas viviam em constante conflito com a ala direita da igreja católica. João Paulo II quando de sua visita a Manágua em 1981, declarou e alto e bom som: “está terminada a Teologia da Libertação!” Em outro giro à direita, Ortega menciona com freqüência sua crença em valores cristãos conservadores. Recentemente, a FSLN, votou no Congresso a favor de uma proibição total do aborto no país.
Assim como no Brasil, paira na Nicarágua uma dúvida de fundo quanto ao caráter das mudanças adotadas pelo presidente eleito e seus correligionários. Será oportunismo político ou realmente um recâmbio político-ideológico? Na dúvida conceitual, valeria à pena perguntar a José Dirceu sua opinião a respeito.
1a redação de Camila Reinheimer
Redação final de Bruno Lima Rocha