18 de março de 2018, Jacopo Paffarini
Muitos italianos esperavam as eleições políticas como um momento resolutivo, uma linha de demarcação entre o retorno ao nacionalismo e a continuação do caminho europeu. A campanha já foi a mais “quente” desde a década de ‘70, com confrontos nas ruas em ocasião dos comícios da direita xenofoba e facadas na noite durante o rotineiro “lambe” de cartazes eleitorais. Odio puro como só os meus pais conheceram, um contínuo alertar contra o retorno do fascismo na península.
No dia 5 de março, olhando os resultados das eleições, podemos dizer que os partidos da extrema direita ja não são um risco (se nesta definição colocamos os partidos que se referem abertamente ao passado ditatorial, falamos do 0,8% dos votos). Mesmo assim, a campanha foi combatida na dialettica fascismo/antifascismo, deixando de lado as problemáticas do dia dia das pessoas. Mas porque a esquerda não conseguiu sair desta cerca criada também pelo sensacionalismo da mídia nacional?
Talvez seja útil retomar uma expressão de Gramsci quando fala de “guerra de movimento” e “guerra de posição” aplicada aos movimentos políticos. O filósofo italiano “pega em empréstimo”esses termos do gergo militar: o primeiro indica um uso dinâmico das tropas, deixando de lado a demarcação do confim ocupado para golpear objetivos em diversas posições ao mesmo tempo, a segunda indica a guerra de trincheiras, onde numa área delimitada se confrontam duas o mais tropas e o objetivo é conquistar metro a metro o terreno do inimigo. A segunda é mais desgastante e precisa mais organização e disciplina, no enquanto na primeira é a estratégia e a intuição que conta.
No entanto a esquerda italiana se movimentou somente desafiando os fascistas numa guerra de posição com manifestações, iniciativas culturais e apelos à criminalização e à dissolução por via judiciaria de partidos xenófobos. As demais formações políticas do centrò-direita e do Movimento 5 Stelle (não menos conservadoras dos grupos declaradamente fascistas) conduziam uma guerra de movimento, conquistando o eleitorado com discursos de política internacional (em particular, a proposta de retorno ao protecionismo e a saída do sistema Euro), de segurança pública (barrar as fronteiras) e colocando medo sobre uma possível vitória dos extremistas de qualquer um dos lados. O resultado é evidente: há um movimento que já foi anti-europeu e radical (movimento 5 stelle) mas que assumiu uma atitude bem mais moderada por meio da qual conseguiu se eleger como primeiro partido. Contudo ele está sem capacidade de formar uma maioria (quase o 30%). Em seguida, no segundo posicionamento, há as forças tradicionais: centro-direita com 34% e centro-esquerda com 24%.
As implicações do voto na Itália até agora são as seguintes:
1. A mais que provável formação dum governo de coalizão centrista (no modelo alemão da “Grosse Koalition”)
2. Uma oposição que não é um partido, mas sim um movimento que age somente nas redes sociais e não tem base na realidade (Movimento 5 stelle)
3. O perigo do extremismo é usado para apavorar os eleitores e os parceiros europeus - operação que tem sucesso pela repercussão que ela tem na mídia e pela cumplicidade duma parte da esquerda post-negriana que só existe se grita ao perigo dum retorno do fascismo
4. A esquerda está sem argumentos. Para além do discurso antifascista há uma unidade sem princípios entre grupos que as vezes mal conhecem a própria história. Será porquê os pais ensinaram para os filhos a esquecer o passado?
Jacopo Paffarini é professor de Direito, italiano radicado no Brasil (jacopo.paffarini@imed.edu.br)