Um dos poucos conceitos fomulados pela ciência política cuja matriz é nos EUA e tem aplicação direta aqui no Brasil é o chamado sistema de espólio. O “spoil system” é a capacidade gerencial de um grupo de interesses, um consórcio político-eleitoral, de espoliar um ou mais órgãos de Estado. No caso da etapa atual do capitalismo e do gerenciamento privado da coisa pública, quanto mais terceirizada é a gestão, mas tecnificada é a forma de adulterar preços e serviços.
Esta nota não trata necessariamente no caso do Detran-RS, Fundae ou Finatec. O caso é de fundo. Terceirizações infindáveis geram uma cadeia de comando paralelo ao das hierarquias indicadas através do Executivo eleito. Um governador ou ministro indica um presidente de autarquia ou secretário de estado. Este monta uma equipe e fecha contratos com fundações, consultorias e institutos. No intuito de se economizar o investimento em recursos humanos sob controle estatal e com estatuto de servidor ou celetista, o controle público se perde no emaranhado de pessoas jurídicas com funções superpostas.
O problema concreto entre a literatura policial ou fiscal é que o caixa é o mesmo. O fundo dos recursos da sociedade circula nos impostos diretos ou embutidos. Se existe Estado então tem carga tributária e regime impositivo. Diminuindo a carga de impostos e aumenta-se a terceirização ou a prestação privada de atividades com fins públicos, então a relação não é cidadão-governo, mas de consumidor-empresa. Em ambos os casos, a maioria perde. A lógica de mercado não coexiste pacificamente com a idéia de prestação de serviços públicos. No caso do novo sistema de espólio, os consórcios operando sob siglas partidárias – algumas legendas até históricas – se modernizam criando formas permanentes de desvios padrão.
O último caso, não somente de roubos milionários, mas de entrada contínua de recursos desviados através de medidas jurídicas – como contratos não licitados ou com licitações fraudulentas, preços superfaturados – se aplica com perfeição ao caso do Detran-RS. Entrou água no esquema porque um novo “parceiro” decidiu entrar na fonte e beber da mesma água. As suspeitas aumentaram e o esquemão caiu.
Os operadores do esquema, bem, esses terminam sendo intocáveis.