O Camelódromo é um antigo sonho de alguns comerciantes e urbanistas. Implica na construção de um shopping popular aéreo, no terminal da Praça Rui Barbosa, onde os camelôs trabalhariam em boxes. Estes imóveis, construídos através de Parcerias Público-Privadas (PPPs), terão um custo fixo de, no mínimo, R$300,00 por mês e abarcarão a 10% da categoria dos ambulantes. Ou seja, dos mais de 4.000 camelôs do Centro, apenas 400, capitaneados pela Associação dos Artesãos da Rua da Praia, é que terão uma saída. Isto até o movimento cair, uma vez que o transeunte vai parar de circular, a não ser que caminhe por cima das passarelas para comprar os produtos de procedência desconhecida.
Os Portais da Cidade é um projeto também mais que polêmico, onde três estações de transbordo serão construídas, respectivamente no Largo Zumbi dos Palmares bairro Cidade Baixa, na Azenha , início do Centro-Sul e na Cairu, zona norte e coração do decadente 4º Distrito. Os passageiros vindos de outros pontos da capital e da Região Metropolitana desembarcariam nestes "Portais" e lá, antes de tomar a via expressa para o Centro, terão acesso a lojas de shoppings-centers. Para os comerciantes destes bairros, o problema é a queda no movimento. Aumenta também o custo de chegada no Centro da capital, e o lado positivo, pode ser a proibição de circular de carro no coração da cidade. Mais uma vez, a formula encabeçada por José Fortunati (secretário municipal de planejamento, PDT) e CézarBusatto (secretário municipal de governança local, PPS) é a das PPPs.
Porto Alegre tem dimensões e população equivalentes a Montevidéu, capital do Uruguai. Há poucos anos, começou um movimento de abertura de bares e locais culturais na Ciudad Vieja, zona central e retroportuária, coração financeiro do vecino hermano que é especializado como plataforma bancária. Antes, durante a ditadura militar, os bairros de origem negra, como Palermo e Barrio Sur, viram boa parte de seus moradores sendo transferidos para o projeto habitacional Cerro Norte, na zona oeste e afastada da capital uruguaia. Qualquer semelhança com a transferência dos bairros de predominância negra da Ilhota e Vila Dorotéa para a Restinga, no extremo-sul da cidade, não nenhuma coincidência.
É costume se afirmar que a cidade está de costas para o Rio, na verdade, o Lago Guaíba. O problema está no interesse anexado a esta afirmação. Para os padrões de "revitalização", tem de ser levada em conta à experiência de Puerto Madero , símbolo máximo da Era Menem em Buenos Aires . Reformaram armazéns e áreas de preservação histórica, rechearam de bares e restaurantes, incluindo até uma faculdade. Mas, a movimentação portuária e a população original da região, foram todas removidas.
Para o Rio Grande do Sul, é a caixa de ressonância política, em um estado com ares de autonomia e cuja Praça da Matriz congrega o Tribunal de Justiça, a Catedral metropolitana, o Parlamento e o Piratini, sede do Executivo. Segundo o senso de 2000, o Centro de Porto Alegre diariamente, teria o contingente de 5% dos conterrâneos, contingente este mobilizável e atingível. Não passa uma semana sem que algum ato ou protesto de categoria ou movimento ocorra nesta parte da cidade, e com eco para todo o estado.
A coisa toda é mais complexa do que parece, implicando uma série de interesses cruzados. O interesse da especulação imobiliária e construção civil , gordos investimentos em PPPs, tudo sendo aplicado nas instâncias de consulta direta mas sem capacidade resolutiva . Sendo que o pano de fundo é a concepção de urbanismo e de direito a cidade. Setores sociais e categorias perseguidas como catadores , trabalhadores portuários , camelôs, sem-tetos , população de rua e funcionários de escritórios e serviços serão atingidos. Isto sem falar nos sítios históricos da muito atacada memória da população negra da capital . Volto ao assunto em breve, tratando do tema do Porto da capital e dos catadores. E, sempre afirmando que sem concentração popular não há pressão viável, e sociedade alguma pode ser transformada.