A delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista foi uma ação coordenada, com orientação direta da Polícia Federal, com altíssimo critério na produção de provas materiais irrefutáveis e com o estilo e padrão do FBI, a polícia federal dos EUA. Microchips em mochilas contendo dinheiro, notas seriadas e fotografadas, microfones de bolso ou discretos para induzir os alvos a falar, cometendo revelações criminosas. Quem conhece um pouco desse padrão sabe sua origem e a capacidade devastadora no ambiente político.
No olho do furacão envolvendo o presidente Michel Temer, uma suposta mesada enviada pela JBS para o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), preso em Curitiba e cujas perguntas enviadas por Cunha para MT, legalmente o presidente em pleno exercício não precisaria responder (ver: http://migre.me/wDFma). Ou seja, Cunha foi central para o vexaminoso episódio de chantagem institucional, aliás assumido em rede aberta e nacional de TV pelo próprio MT (ver: http://migre.me/wDFwV) e a consequência nefasta do impeachment sem mérito constitucional. A dimensão substantiva do golpe se dá em dois níveis. Uma, é da porteira para dentro, com o fim das bases sociais e constitucionais do Estado Social Democrático de Direito, base da Constituição de 1988. E da porteira para fora, com o fim do projeto de potência média e do modelo de Bismarckismo Tropical. No olho do furacão, a Operação Lava-Jato e suas agendas paralelas. Desabou tudo, não que não estivesse podre (como a Nova República e o presidencialismo de coalizão), mas junto foram as chances de crescimento capitalista do país. Na liquidação do Brasil, liquida-se também o que menos vale, as oligarquias políticas profissionais. O que virá em seu lugar?
O governo acabou e quem assumir talvez não governe
Ao que tudo indica, o golpe andou dentro do Golpe. A Lava-Jato não parou – como era esperado pela antiga base aliada de Michel Temer e Eduardo Cunha - durante o governo MT, e partiu para um passo ousado. Os irmãos Batista, especificamente Joesley Batista, aceitaram servir de isca para o presidente da República e o presidente nacional do PSDB, o senador mineiro Aécio Neves. As gravações teriam ocorrido em março do corrente ano, e foram ações coordenadas pela PF. As equipes de investigação confirmaram todas as denúncias que constavam na matéria de Lauro Jardim, colunista de O Globo. Nenhum agente público, e menos ainda o pessoal de confiança da emissora líder, confirma isso à toa, sem total respaldo e um grau de certeza absoluta.
O que dá a entender é que ninguém segura Rodrigo Janot, o Procurador Geral da República opera com voo solo e através do devido campo de alianças intra-institucional (PGR, cúpula da PF com treinamento de ponta, jovens procuradores, interlocutores no Supremo e em tribunais superiores, algum trânsito no Estado-Maior das Forças Armadas), o procurador opera como corregedor geral da República. Sendo assim, não há legitimidade (por eleições gerais, por exemplo) ou algum grau maior de lealdade que "proteja" o presidente ou a Presidência. Qualquer governo sob este tipo de ameaça constante (um aparelho de Estado que tem agenda própria, por mais justa e legal que seja esta agenda, e muitas vezes têm critérios no mínimo duvidosos), ainda mais passando pelas evidências que foram obtidas pelas investigações coordenadas, não tem a mínima "segurança" para seguir exercendo os atos de governo.
O curtíssimo prazo e os passos possíveis
Eu vejo que estamos diante do imponderável. A Globo recebeu a exclusiva, como sempre, mas sabia que se o Lauro Jardim não divulgasse, a empresa seria furada pelas TVs paulistas. O fato é que a Lava-Jato não parou e a agenda da PGR e das equipes da PF em Brasília não é a mesma da Força Tarefa em Curitiba. Tanto é assim que as cerca de 19 perguntas elaboradas por Eduardo Cunha não tiveram um escarcéu para serem respondidas pelo presidente Michel Temer. Esta agenda da PGR tem altíssimo nível, sendo visível o padrão investigativo, que é do FBI. Duvido que os gringos tenham operado diretamente, mas é impossível que não tenham participado do acordo total. Tanto é assim que toda a família Batista - controladores da JBS (com dezenas de instalações industriais nos EUA, ver http://migre.me/wDFMp) - já se encontra em território estadunidense. Isso faz parte do acordo de leniência com o Departamento de Justiça e necessariamente implica que a Casa Branca tinha conhecimento prévio, provavelmente a partir do adido legal da Embaixada deles no Brasil.
A cancha está aberta, mas se entendi o recado, a família Marinho ou algum emissário de confiança, já teve acesso a uma parte das provas e optou por acelerar o processo. Merval Pereira fala pelos Marinho e ao vivo na Globonews, na noite de 17 de maio de 2017, disse que ele, Temer, não teria condições de continuar (ver a versão para CBN, http://migre.me/wDFPr). Isto tanto pode ser uma improvável chamada por eleições gerais, ou, o mais provável, o fato de que as lideranças políticas que sobreviverem busquem uma saída política mas que esta seja afiançada pelo Judiciário. Por isso que oscilando entre o papel de incendiária e bombeira, a Globo insiste em "saída pelas regras constitucionais". Se assim for, assume Rodrigo Maia, até que as investigações o atinjam também, fazendo que seu mandato seja tampão. Nos bastidores, as raposas restantes do PT e PSDB, corretamente pensam no plano B caso tenhamos uma eleição Indireta. A favorita da Globo, dos Gringos, da Banca e FIESP seria a atual presidente do STF, ministra Carmen Lúcia. Pelas cúpulas partidárias e a caserna, o favorito é Nelson Jobim (ex-ministro de FHC e Lula, ex-ministro do STF). No cálculo de "mal menor", Jobim é disparado a menos pior opção pois garantiria eleições em 2018. Algum nível repressivo vai ter, mesmo porque, após as Indiretas 2017 - se estas vierem - a Presidência vai ter alguma agenda de leis regressivas ainda. Jobim vai se inspirar em Itamar Franco, Carmen Lúcia sabe-se lá.
Nestes primeiros dias a coisa foge do controle das cúpulas, das elites de sempre e do que restou de classe dominante no Brasil. Agora a bola está quicando nas ruas e quem mobilizar mais pode levar, incluindo um pacto político por Diretas Já e ano que vem com Eleições Gerais para uma Revisão Constitucional. Nesta revisão, aí podemos forçar finalmente a Reforma Política com elementos de mandato imperativo, recall, projetos lei de iniciativa popular sem intermediários e com elementos de referendos e plebiscitos. Realmente a hora é agora!
Bruno Lima Rocha é professor de ciência política e de relações internacionais
(www.estrategiaeanalise.com.br / blimarocha@gmail.com para E-mail e Facebook)