De todas as possibilidades de aumento de imposto, o único que tem sentido, no meu ponto de vista, é justo a CSLL. Porque ela incide sobre o setor que menos produz e mais lucra neste país desde 1º de janeiro de 1995. O aumento da alíquota de 9% para 15% não deve incidir no faturamento das instituições financeiras. Infelizmente, a regulação do Estado se dá através de um ajuste de interesses, localizado seu núcleo duro na direção do Banco Central e no Comitê de Política Monetária (Copom). Como o governo submete toda a estratégia de desenvolvimento aos acordos com as entidades e instituições financeiras, o repasse é visto como "natural".
A alegação é previsível. Os bancos e instituições de crédito irão "compensar" o aumento de sua carga tributária, incidindo na produção, circulação e consumo. Deste modo, o custo do dinheiro como produto, torna-se mais importante do que os custos de produção como um todo. Eis um dos motivos porque sai tão caro gerar um emprego no Brasil. A ortodoxia neoliberal costuma alegar que a causa é o custo do trabalho regular incidindo sobre o faturamento. É verdade, mas apenas em parte. O problema é outro. Garantir a capacidade de arrecadação, tanto na contribuição trabalhista e previdenciária, como nos impostos em cascata, é a função do fiador da dívida pública. Esse é o papel do governo central. Ao arrecadar, centraliza a distribuição de recursos, joga com a "base aliada" e mantêm a jogatina na ciranda financeira.
Dos setores atingidos com o aumento da carga tributária, quem não tem poder de repassar custos é o mais atingido. Com a subida da alíquota do IOF, de 1,5% para 3%, o contribuinte assalariado é atingido no fígado. Isto porque este imposto incide diretamente sobre pessoas físicas. Assim, o governo "sinaliza" que continua dentro de seu padrão de "responsabilidade" para com o sistema financeiro. Se aumentasse a CSLL sobre a Banca, haveria barulho de sobra. Estas instituições têm como produto o resguardo, empréstimos e movimentação do dinheiro alheio. Caso fossem "penalizadas", aparentaria ser uma medida distributivista. Como se sabe, distribuir riqueza, mesmo que de forma simbólica e indireta, é algo proibido nas regras do jogo real da política brasileira.
Escrevo este artigo comparando as declarações dos operadores políticos profissionais, como o presidente do DEM, deputado federal Rodrigo Maia (Jornal do Comércio do RS, pág. 24, edição de 08/01). O filho de Cesar Maia alega quebra de acordo na votação da DRU, isto como se a política profissional não tivesse na traição um de seus elementos constitutivos. Mais furiosa está a base "aliada", apavorada de perder obras e inaugurações em pleno ano de eleições municipais. A princípio a quantia de R$ 4,4 bi do PAC a ser gasto em obras vinculadas ao Ministério das Cidades não será tocada. Tanto é que Lula planeja começar a viajar cedo, inaugurando obras e lançando candidatos já em fevereiro.
A imensa maioria dos brasileiros gostaria de ver seus representantes eleitos preocupados com as verbas da educação, que já serão atingidas. Assim, um orçamento minguado ficará ainda mais magro. Infelizmente, os interesses do Executivo e dos legisladores é outro. O governo fez uma pirotecnia fiscal para continuar punindo ao contribuinte pessoa física. Não vai tocar no lucro dos bancos. Já os parlamentares, os mesmos que aprovaram a DRU, não querem é perder a prerrogativa do diálogo. Estão irritados com a medida discricionária da equipe econômica. Nestas horas, toda a falácia da "técnica" como superior à política cai por terra. Pena que é somente nestas horas.
Mesmo que a Banca repassasse toda a alíquota sobre os custos de produção e crédito para consumo, o efeito ideológico seria terrível. "Sinalizaria" um governo mais à esquerda, e não de "centro", como defende Antônio Delfim Netto, ex-ministro de Médici e conselheiro econômico de Lula. Para o Continente, afastaria o governo do ex-metalúrgico da chilena Michele Bachelet e o aproximaria da "aventura" bolivariana. Seria um custo real de governo. Tomar uma contra medida como resposta a uma derrota política no Senado. Nada disso ocorreu.
A chiadeira da oposição é pela forma como o Executivo tomou a medida. Não se trata de defender lucro dos bancos, porque estes são mais que assegurados. Tampouco de levantar trincheira nas funções de Estado, dentre elas a regulação econômica. Porque, se a bandeira fosse esta não teriam aprovado a Desvinculação dos Recursos da União (DRU). O motivo é ter em mãos um cavalo de batalha, aproveitar para fazer algum escarcéu midiático e juridico, acumulando forças de modo a que as emendas parlamentares não sejam tocadas. Não se trata sequer de uma posição ideologicamente liberal, em defesa do individuo contra os arbítrios do governo agigantado. O problema é de barganha mesmo.
Artigo originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat