Buscava iniciar a visão nacional do segundo Boletim, ainda em fase experimental, quando me surpreendi com a própria realidade. Óbvio e evidente, com o perdão do vício de linguagem, que cai de maduro o caso Renan e o funcionamento absurdo do Senado da república centralista da América luso-brasileira, também chamado de Brasil.
O tema será abordado novamente logo logo. Antes, porém sigo afirmando o prazer profissional e o desgosto como brasileiro, em ver a hipótese central de minha modesta dissertação de mestrado sendo comprovada. Escutando uma das cadeias de rádio de noticias 24 hs – em fluxo contínuo e via satélite – na manhã de hoje me surpreendo com a chamada de capa da Revista Isto É Dinheiro, do Grupo Alzogaray. O repórter Leonardo Attuch vai ao encontro dos registros judiciários de Milão, Itália, onde se desenrola o caso da Telecom Itália. Não vou reproduzir a íntegra da reportagem, até porque para isso temos o recurso dos hiperlinks. Portanto, sugiro aos leitores que vejam, fucem por detrás, atentamente, nas linhas e entrelinhas da bela reportagem e o que se descortina entre fumaças na inteligência policial brasileira.
Vale a chamada para os dois últimos parágrafos:
“Documentos secretos da Justiça italiana, como o depoimento de Jannone, também ajudam a entender a troca recente de todo o comando na Polícia Federal. Em dezembro de 2006, quando já sabia que seria nomeado ministro da Justiça, Tarso Genro fez uma viagem sigilosa à Itália com uma missão específica: recolher informações sobre as investigações referentes à Telecom Italia e avaliar os possíveis impactos no Brasil. Genro teve acesso a vários documentos e, logo que assumiu o Ministério, em março deste ano, tentou substituir Paulo Lacerda por um nome de sua confiança. O ministro, porém, adiou a decisão em várias ocasiões em função de conflitos internos na PF. Foi só há duas semanas que ele conseguiu emplacar Luiz Fernando Corrêa no cargo.
Em contrapartida, porém, Lacerda foi para a Abin e Romeu Tuma Júnior foi nomeado secretário Nacional de Justiça. Depois dessa troca de cadeiras, há hoje um claro antagonismo entre o novo comando da Polícia Federal e a ala do governo que permanece ligada à família Tuma. É uma nova guerra, que se trava nos bastidores do poder, e que ainda pode causar muita confusão.”
Assina Leonardo Attuch, edição da semana de 17 a 21/09/2007, Isto É Dinheiro, versão digital.
Reitero os parágrafos finais em função da conclusão que cheguei em março de 2004 ao concluir o mestrado em ciência política com a dissertação: “Polícia Federal após a Constituição de 1988: polícia de governo, segurança de Estado e polícia judiciária” PPGPOL/IFCH/UFRGS, 2004). Neste trabalho afirmo que as prerrogativas das Forças Armadas seguem coexistindo em parte, sendo agora operadas através do grupo de confiança ligado ao senador Romeu Tuma (Dem-SP, ex-PFL, ex-Arena e ex-UDN), homem que operou, investigou e terminou por chefiar o antigo DOPS-SP. Tuma iniciou suas atividades de espionagem política e controle social no ano de 1957. Isto gera especialização e circulo de alianças na interna da burocracia policial.
Perde o indicado Paulo Lacerda, que vai pro segundo time, comandando a nada confiável ABIN e tem de engolir um gaúcho, ex-secretário da Senasp, Luiz Fernando Corrêa, riograndino tal e como Golbery do Couto e Silva em seu lugar. Em contrapartida, jogo de cartas pré-marcadas, Luiz Fernando, ele mesmo bombeiro e substituto de Luiz Eduardo Soares o intelectual carioca aliado dos agentes e peritos pelo novo Regimento Interno, modelo FBI. Corrêa, ex-agente com carreira meteórica, agora sentirá contra si o fogo dos caídos, exercendo função limitante de controle como ele mesmo exercera antes sobre Paulo Lacerda.
O edifício Máscara Negra, sede da temida Polícia Federal, deve estar passando por varreduras eletrônicas sem fim. Até porque, no andar de cima da estrutura virtual do Ministério da Justiça, está um amigo e um inimigo. Na vida como ela é sem o poder de intervenção está o Tuminha, Secretário Nacional de Justiça. Fiel ao pai e aos homens com origem na Polícia Civil de São Paulo, tal e qual o derrubado ainda durante as investigações nunca concluídas do Mensalão, delegado high-tech Mauro Marcelo.
Já na Senasp está outro operador. Corrigimos a informação na Errata quanto ao boletim enviado. O atual titular da Senasp é o ex-deputado estadual e federal pelo PT, ex-subsecretário de Justiça de Leonel de Moura Brizola no governo do Rio de Janeiro (1983-1986), o procurador do MP fluminense Antonio Carlos Biscaia. Tarso acomoda desafetos e aliados e assim segue no sistema de pesos e contrapesos. Acreditem, Corrêa é o fiel da balança.
Pouco ou nada distinto se poderia esperar no teatro de sombras. O peso gravitacional da PF é cinco vezes maior do que a ABIN no regime atual. Não quer dizer que os capitais transnacionais e a bandalheira brasileira não sigam deitando e rolando em berço esplêndido. Telefonia privatizada no rastro das operações financeiras da era Eduardo Jorge Caldas, Luis Carlos Mendonça de Barros, André Lara Resende e cia. é problema na certa. Com a fleuma que caracteriza o tucanato Uspiano, Cebrapiano e Pucciano carioca, o reino da Gávea-Perdizes-Higienópolis deixara a bomba relógio do capital digital para explodir no colo do sucessor. E, para evitar surpresas, o diplomata e ex-prócer da ressurreição do GSI-ABIN, Ronaldo Sardenberg assume a Anatel no 2º Governo Henrique Meirelles.
Não, isto não é provocação barata, é a genealogia do poder de fato, daqueles que exercem poder de forma direta e indireta na democracia minimalista e realmente existente. Na overdose do affaire Renan, resta o epílogo da ópera tropical, onde o Grupo Naspers-Civita, dono da franquia da revista masculina estadunidense, publicará as fotos da jornalista cuiabana Mônica Velloso. Calheiros custa caro e cobra em dia. A CPMF que o diga.