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O afastamento da presidente Dilma Rousseff. Uma reflexão crítica pela esquerda


No triste discurso de Dilma Rousseff, a presidente enumera suas dores, todas respeitáveis. Mas, sinceramente, o que mais dói é ver uma ex-guerrilheira ser derrubada por uma base de direita com a qual ela própria aceitou como aliada de conveniência.

16 de maio de 2016, Bruno Lima Rocha

O Senado concluiu por volta de 6h30min da manhã de 12 de maio de 2017 um golpe branco, perfeitamente orquestrado, afastando a presidente reeleita Dilma Rousseff, por 55 votos a favor do afastamento contra 22 pela manutenção no cargo. Com esta votação, o PMDB chega ao poder pela terceira vez de forma indireta. Antes com Tancredo Neves e José Sarney em 1985, no retorno de Itamar Franco para a legenda de Ulisses Guimarães em 1992 após o impeachment de Fernando Collor de Mello e agora com Michel Temer assumindo o Planalto por ter sido reeleito na mesma chapa da ex-guerrilheira. Dilma recebera 54 milhões de votos em 2014 e trazia consigo o vice-presidente eleito com ela em 2010, através de uma aliança defendida ainda no governo pelo ex-ministro da Casa Civil de Lula, José Dirceu de Oliveira e Silva em 2005 e ampliada pela hoje presidente afastada quando a mesma fora indicada para a pasta antes ocupada pelo ex-todo poderoso capa preta da legenda petista.

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Agora estamos diante de um novo ministério, enxuto, um típico pacto oligárquico com o capital financeiro e abalado pelo neoliberalismo vende pátria e gorila, a exemplo de Maurício Macri – presidente menemista eleito na Argentina – tal como o cinismo do Partido Democrata com Barack Obama à frente. Constatações a parte, é necessário observar o nefasto papel para as esquerdas através do pacto lulista (hoje moribundo), papel este protagonizado pelo PT nos últimos treze anos e acima de tudo por seu líder político e cabo eleitoral, o ex-sindicalista, que segundo o próprio, nunca foi de esquerda.

Não se trata de coerência livresca ou buscar a perfeição de um discurso intelectual (ou intelectualóide) estéril e distante das realidades sociais. É justo ao contrário. Afirmo aqui que morre e deixa-se de matar de ilusão endêmica quem crê fielmente nas instituições da legalidade burguesa e mais ainda, em uma base política mercenária e de direita. Nas palavras que seguem, trago uma coletânea das análises dos últimos dias de governo Dilma. A coerência, repito, é no sentido de provar teórica e analiticamente, a viabilidade do poder do povo por em cima das traições estruturais - como a crença inexorável no pacto de classes – e das eternas promessas da democracia - mesmo que liberal e de procedimentos – que não cabem no capitalismo e menos ainda são toleráveis pelo andar de cima e pelos EUA para nossa América Latina.

A ex-guerrilheira do triste discurso

No triste discurso de Dilma Rousseff, a presidente enumera suas dores, todas respeitáveis. Mas, sinceramente, o que mais dói é ver uma ex-guerrilheira ser derrubada por uma base de direita com a qual ela própria aceitou como aliada de conveniência.

Isso é o que mais dói ex-companheira, o que mais dói é ver ao teu lado discursando na partida de governo uma defensora da flexibilidade do trabalho escravo; o que mais dói é ver a ex-esquerda transformando-se em caricatura de republicanismo e legalismo burguês.

A democracia é reivindicável, mas não esta fábrica de traidores de classe ou cleptocratas a serviço do capital. A democracia é a fonte de poder legítimo e não pode caminhar distante da igualdade social e a distribuição de renda e poder.

Na véspera do golpe no Senado, O Globo assassina a economia política brasileira

Na matéria intitulada “A soma de todos os erros: Dilma abriu buraco fiscal e comprometeu ganhos sociais: com estímulos artificiais, Dilma deixou PIB retroceder ao nível de cinco anos atrás” (assinada por Flávia Barbosa, em 11 de maio de 2016) , O Globo prova de onde vem, traça um libelo anti-desenvolvimentista, mente descaradamente ao associar a expansão dos gastos públicos apenas com às políticas de subsídio a indústria e a agroindústria, e não se comprometendo com a rolagem da dívida pública interna e os ganhos absurdos da agiotagem oficial. A expansão dos gastos cometeu, segundo os economistas consultados - poderia dizer os neoliberalóides consultados - na matéria, como "pecado keynesiano" ou algo semelhante.

Não há como manter política de crescimento econômico, mesmo auxiliando o capital atuando no Brasil, sem romper as amarras do rentismo. É simples, de tão simples, ninguém fala o óbvio. O Globo omite a relação causal mais importante, logo, ao omitir o mais relevante, MENTE.

Para concluir o mesmo enfoque na matéria; aliás, para concluir, em rede nacional, Miriam Leitão (na manhã do Golpe no Senado) disse o mesmo no telejornal Bom Dia Brasil: "o maior problema, a maior expansão dos gastos não foi com as políticas sociais e sim com o apoio a indústria e a agroindústria!". Pecado keynesiano, tardio, tímido e sem contar com o apoio incondicional do empresariado brasileiro que, aliás, não hesitou em puxar o tapete da presidente assim que pôde. Ninguém mandou a ex-esquerda acreditar no pacto de classes.

A farsa da farsa

Alegam querer derrubar um governo "populista e bolivariano" (ai quem dera! especialmente o segundo); para tal criminalizam o Plano Safra, criminalizam repasses do governo Central para garantir suas políticas, o Congresso autoriza a expansão da meta fiscal e depois puxa o tapete; aceitam por motivo de vingança política um processo de impeachment escrito por uma tucana, um tucano e um recalcado serrista, o Senado indica um relator tucano e que cometera os mesmos "crimes" que ele relata como crime; na Câmara 298 deputados que são acusados por crimes contra a Justiça aprovam a admissibilidade e agora 58 senadores de 81 que também estão com o seu na reta fazem o mesmo.

Querem derrubar os maiores entusiastas do capitalismo brasileiro, a começar por Lula, que de tão crente no capitalismo nacional resolveu crer e se misturar com os capitalistas daqui. Luiz Inácio se mistura com quem não devia, perdeu o rumo no pertencimento de classe e viu, sob o nariz do Palácio do Planalto, os Estados Unidos e seus sistemas de espionagem deitarem e rolarem no Brasil nos últimos cinco anos. Resultado:

- a cleptocracia a mando do capital transnacional vai cortar na própria carne (com as empreiteiras) e derrubar o governo que mais defendeu o capital nacional e traiu a dimensão combativa da esquerda.

Estamos em 2016, mas poderia ser 1954.

PT, onde está o populismo?

Proponho uma reflexão em forma de contabilidade de chegada: ou como o lulismo acabou com o que restava de combatividade no PT e assumiu o pacto de classes como única saída. Gente, vamos fazer contas? 44 milhões de beneficiados nos programas sociais. 10% deste total dão em 4,4 milhões de brasileiros e brasileiras. 1% dá em 400 mil pessoas. Se o PT organizasse como força "populista" um em cada 100 beneficiados de seus programas, teria um poder de veto sobre a base mercenária no Congresso e o pacto com os oligarcas. Se tivesse um organizador social em cada base de 100 beneficiados poderia contar com força de mobilização permanente, a exemplo do que faz o “populismo” em toda a América Latina que leve a sério este conceito, com o qual também não concordo integralmente. É por isso que esta palhaçada de golpe branco, de golpe paraguaio não anda na Venezuela.

Aqui foi tudo ao contrário. Preferiram nada fazer e confiar na sorte ou no destino ou em qualquer pensamento mágico. É por isso que Maduro não cai à toa. Porque o chavismo - para o bem ou o mal - organizou uma parcela razoável de sua base social beneficiada e aplica esta força como poder de veto por cima dos oligarcas e vende pátria. Populismo é isso; e é menos pior do que o pacto de classes sem poder de veto. Não foi por falta de aviso.

Última reflexão na tarde infeliz durante o golpe no Senado

Breve reflexão. Trata-se de golpe semiparlamentarista. A meta não é apenas a retirada da presidente Dilma e sim desmontar a rede de garantias constitucionais para a saúde, educação, direitos de 4ª geração e o mundo do trabalho. Foi alimentado por uma conspiração de Estado (república de Curitiba), com o apoio do PIG (quando a Globo derrubou sua grade na tarde de domingo 13 de março e quando da difusão da conversa privada da presidente com o alvo das investigações) e com rios de dinheiro para os neoliberalóides através da Fundação Koch e da Rede Atlas (já provei isso várias vezes). Logo, há um rombo de lealdade no aparelho de Estado, e se eu sei, a Abin sabe e as parcelas da PF que não conspiraram também sabem. Assim, se eu fosse um inocente útil de credo legalista e republicano, ficaria em depressão. Como tenho formação analítica e intensão estratégica, afirmo: governo ilegítimo algum aprova medidas antipopulares com facilidades. Tem muita luta pela frente, cai o lulismo, cai a pelegada, mas os direitos coletivos seguem inegociáveis.






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