3ª, 10 de abril de 2007, Vila Setembrina dos Farrapos, Continente de São Sepé
O inferno prometido não se sucedeu. Finda a páscoa, o feriado mais importante para os católicos brasileiros não viveu o caos das duas últimas semanas. No olho do furacão, a sociedade brasileira assistiu o giro do problema. O Núcleo Duro desviou a atenção tanto da CPI do Apagão, que não houve, como das suspeitas levantadas na gestão da Infraero durante o primeiro mandato. Seguindo o padrão da política nacional, vários fatores incidiram em um cenário complexo. E, como quase sempre, a corda arrebentou para o lado mais fraco.
Abaixo das nuvens de fumaça e manobras diversionistas, está uma gestão temerária, abdicando do planejamento em nome do casuísmo chamado de “governabilidade”. O problema, no meu ponto de vista, não está no ato reivindicativo de uma mão de obra especializada e que ganha muito abaixo dos padrões da própria categoria. Nas entranhas do Estado brasileiro, peleiam as prerrogativas das Forças Armadas e a ausência de obras de infra-estrutura. Isto porque a Infraero, inexplicavelmente ainda vinculada ao Ministério da Defesa e não aos Transportes, havia prometido a reforma de pelo menos 65 aeroportos. Entendendo por reforma ampliação das pistas e da capacidade de tráfego e não lojas de conveniência e saguões de passageiros.
Na outra ponta do problema não está somente a ausência de fiscalização, mas também a ineficiência interventora. Tanto a Controladoria Geral da União (CGU) – com status de ministério, como o Tribunal de Contas da União (TCU) se superpõem em relação a denúncias e investigações. No mesmo caso de licitações suspeitas, podem intervir distintas agências e órgãos estatais. Além dos citados acima, os Ministérios Públicos de São Paulo e Federal também fizeram denúncias.
Se tudo resultasse em uma ágil força-tarefa sob comando de um delegado federal disposto a tudo, seria uma boa saída. Na ausência desta força, quanto mais dados, mais confusões, aumentam os fatos midiáticos e tudo permanece onde está.
Tamanha é a impunidade e o entrevero jornalístico que em todo momento trocamos o boi pelo bife. No caso agora, a Geni da aviação são os controladores e não o desgoverno dos últimos anos. Trabalha-se com a noção de que os grandes movimentos econômicos são inexoráveis. Foi o que ocorreu em relação à falência da Varig e a recente compra do que restara desta pela Gol. Assim, o Brasil tem a proeza de ter um Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) que julga os processos depois dos mesmos estarem, de fato, consumados.
Isto porque, embora o órgão com capacidade de preventiva e repressora de abuso econômico ainda não tenha julgado, a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), segundo sua própria página oficial “em reunião de diretoria ocorrida em 03 de abril de 2007, concedeu autorização prévia à aquisição da VRG Linhas Aéreas S.A. pela GTI S.A., sendo que, em virtude do valor da transação, a matéria será objeto de apreciação compulsória pelo CADE.”
É impossível compreender o caos aéreo brasileiro se não observarmos que o aumento da demanda veio ao encontro do encolhimento e concentração do setor. Em menos de duas décadas fecharam Transbrasil, Vasp e agora Varig. Os aeroportos recebem mais gente, embora as instalações físicas das pistas e hangares não aumentam. E, como que por mágica, os responsabilizados pela crise são os controladores de vôo? Com certeza a resposta é não.
O problema é complexo embora tenha algumas saídas visíveis. Uma delas diz respeito das relações civil-militar e é algo bastante delicado. Escreverei sobre isso posteriormente, mas deixo aqui uma premissa. O Tenente-Brigadeiro Juniti Saito e os demais oficiais-generais e aviadores tem que compreender que a atividade-fim é ser a Força Aérea e não mais a “Aeronáutica”. Isto implica, necessariamente, separar os Cindactas em Defesa e Controle e criar escolas civis de controladores de vôo, a serem admitidos sob concurso público.
Outra saída urgente é conseguir um ministro da Defesa dotado de equipe própria e com capacidade de liderança sobre a caserna. Algo que, definitivamente, Franciso Waldir Pires de Souza não tem.
Por fim, Luiz Inácio e seu Núcleo Duro têm de admitir terem aberto um precedente militar. Ou se reestrutura o sistema aéreo brasileiro, ou esta crise será apenas um capítulo em um largo livro que começou a ser escrito nas desventuras do tenente-coronel aviador Haroldo Veloso.