24 de julho de 2013, Bruno Lima Rocha
Jorge Mario Bergoglio vem do seio da classe trabalhadora na esplendorosa e beligerante Buenos Aires dos anos ’30. É filho de um casal de imigrantes italianos piemonteses, sendo o pai ferroviário e a mãe dona de casa. Ao contrário de boa parte dos seus conterrâneos, compartilhava apenas a cultura popular, mas não os valores do operariado organizado da época. Nem de longe teve sua formação atravessada por ideias da esquerda e tampouco do peronismo. Daí que na Argentina, mesmo agora no auge da “papamania”, o mais famoso torcedor do San Lorenzo de Almagro é visto como sendo um conservador e também homem do povo.
Empossado papa, Francisco I executa a manobra que Norberto Bobbio denomina de renovação para conservação. Faz parte do manual de qualquer analista ou estudioso da política e trata de arregimentar quadros para injetar sangue novo numa instituição milenar e assim mantê-la viva. Nada demais se a mesma não estivesse enferma, segundo palavras de Bergoglio, publicadas na capa de Notícias – revista semanal argentina de oposição – em matéria assinada por um de seus biógrafos. A edição de 20 de julho não deixa margem a dúvidas. O sumo pontífice vai tentar reforçar a identidade da Igreja devotada aos humildes, mas passará longe da Teologia da Libertação e do ecumenismo.
O discurso do papa pode parecer transformador, mas espelha o reflexo das disputas internas na Cúria Romana. O Estado do Vaticano pode, como qualquer instituição, ficar insulada, transformando-se em um fim em si mesmo, locupletando a sua hierarquia e não atendendo atividades-fim. Por isso Francisco I afirma não trazer ouro e sim a mensagem de Cristo. É comum que governos de turno tomem conta do Estado para atender aos interesses do agente econômico e dos mandatários de ocasião. No caso do Vaticano, elite dirigente e classe dominante são sinônimas e é contra esta cúpula e suas práticas pouco elogiáveis que Bergoglio está lutando.
Na década de ’80, as visitas de Karol Wojtyla para a América Latina combatiam a Teologia da Libertação e suas práticas ecumênicas e socializantes. Em 2013, o primeiro papa latino-americano atende a uma agenda interna, combatendo a opulência no interior da Igreja e recrutando os jovens para sua fé. Os defensores do catolicismo deveriam estar debatendo os temas tabus para sua Igreja ao invés de apenas se contentarem com um papa minimamente correto, embora conservador. As sociedades desta parte do mundo avançaram em todos os sentidos. Já a instituição de Francisco I, não.
Este artigo foi originalmente publicado no blog do jornalista Ricardo Noblat