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A política dos discursos


Fazendo autopromoção de si mesmo e não de suas idéias executáveis, o político profissional dá ares teatrais a uma nova forma de demagogia, sendo porta-voz dos consórcios de investidores opacos aplicando divisas em candidaturas surtidas.

Vila Setembrina dos Farrapos, Continente do Rio Grande de São Sepé, 15 de agosto de 2006

No momento da leitura deste artigo a campanha já terá entrado nas casas dos brasileiros, através do horário político obrigatório. Se por um lado a democracia aqui praticada anda mal das pernas, por outro somos obrigados a reconhecer que este mecanismo é interessante. O horário de propaganda em rádio e TV, além do próprio teatro da representação política, também descortina as contradições de um espetáculo midiático sem lastro na realidade. Tal e qual na economia, grandes descompassos marcam a fossa entre o discurso emitido e a materialidade de suas realizações.

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Torna-se simplista afirmarmos aqui que todo político profissional é mentiroso. Mas, é fato, este é o sentimento da maioria da população. Ceticismo na marca de uma mirada, observação aguçada fazendo pontaria da outra coxilha. Se assim não fosse, seria mais que desnecessária a permanente convocatória do eleitorado para votar. O esquema de argumentação do TSE é até interessante. Convoca aos eleitores a realizarem um contrato com empregados de confiança, servidores do público indicados pelo voto.

Como sensação, serve. Mas, como mecanismo deixa a desejar. Isto porque qualquer servidor comum, se já for celetista, pode ser demitido. E, o contrato com as elites dirigentes do campo da política não tem nenhuma cláusula rescisória funcional. Caso percam seus postos, é via julgamento da própria categoria. Defendem a si mesmos e representam a quem afinal? Esta é a pergunta; a quem esta gente termina por representar?

O mecanismo eleitoral apresenta uma falha de estrutura. Isto porque, embora seja de representação e outorga das vontades das maiorias, existe um lapso entre informação e decisão. Como é sabido em qualquer empresa mediana, nenhum gerente tem condições de decidir os rumos de uma padaria se não conhecer os processos de panificação, os preços do trigo, as normas da saúde púbica, o piso salarial dos padeiros dentre outras especificidades de sua área. Não precisa ser padeiro para ser proprietário de estabelecimento de panificação, mas necessariamente tem de conhecer do ramo. Porque haveria de ser diferente na política?

A contradição vivida pela democracia de massas está na forma de participação e representação. Considerando que a política só se faz com ações de minoria dotadas de vontades políticas e interesses estratégicos, resta para a massa votante, nestas regras, aceitar o papel de delegar poderes. Entra em cena o jogo discursivo, não necessariamente ruim, mas que a cada dia que passa vai sendo desmaterializado. Sem equivalente no mundo das realizações, criamos algumas “bolhas de ilusão midiática”. O enunciado do político em campanha ganha tons mágicos e místicos. Ausente a informação estratégica para o eleitor poder decidir com alguma base além da emotiva, perde o voto seu poder resolutivo.

Vale novamente a comparação com a economia, bem ao gosto dos neoliberais. O discurso dos políticos profissionais está para a sociedade tal como a especulação está para o mundo dos produtos e serviços. Hoje temos uma base monetária circulando em espécie – dinheiro ou moeda – no mínimo cinco vezes menor daquela existente de forma digital. A economia está sem lastro, desmaterializada, perdida entre compromissos de bastidores e fundamentada por demências econométricas e monetaristas.

No jogo eleitoral, acontece o mesmo. O sujeito sobre no palanque com duplo discurso. Um é para a platéia, seu público consumidor como gostam os neo-institucionalistas. Mas, de fundo, seus compromissos são com outro público-alvo, seus investidores e aliados. O eleitorado vota na estética gerada como produto eleitoral. O eleito, amarra seus compromissos estratégicos com o consórcio estatal-privado que o indicou. Restando assim acordos táticos, portanto não essenciais, com o público expectador de sua fala. No universo deste eleitorado, de fato semi-distrital e corporativo, espalham-se interesses menores e negociáveis. Estas são as assim chamadas prebendas. Ou seja, os velhos e históricos favorecimentos individuais, a miúdo e no varejo. O atacado deste mercado vai para o consórcio financiador-investidor. Qualquer semelhança com a empresa Planam, dirigida por Darci e Luiz Antonio Vedoin, e a Máfia das Sanguessugas não é nenhuma coincidência.

Voltando às absurdas comparações, novamente a economia monetária e financeira presta seus “serviços” para compreender nossa eficácia democrática. Fazendo uma comparação entre as forças produtivas da sociedade e os interesses em jogo pela instância de síntese, a política, a tropa da reação de Montpelier bradou que a liberdade econômica está acima da liberdade política. Assim, a partir desse pressuposto, começava a colonização de uma esfera sobre a outra. Buscou-se dotar a forma “responsável” de fazer política com uma suposta racionalidade de interesses individuais. Cada indivíduo seria, para esses gênios da economia sem lastro, um representante de seus próprios interesses, e se associaria a outros somente para maximizar seus ganhos.

Portanto, se formalizava em termos de teoria aquilo que o sertão chama de cabresto e apadrinhamento. Mas, com ares de teoria da ação coletiva, isto redunda em lobbies sem fim e investimento de tempo e carga de informação em interesses políticos específicos. Novamente, o Brasil reproduz sua forma de estrutura excludente, tanto no voto como nas políticas públicas. Ambos são, por definição, universais. E, simultaneamente, o voto obrigatório não é acompanhado do treinamento necessário para exercê-lo. Ou seja, ninguém é treinado para decidir temas públicos em seu cotidiano. Mas, é convocado a decidir a cada dois anos, em dois planos distintos, levando para a urna apenas a reprodução do abismo. Numa ponta, o cotidiano da sociedade de classes, noutra, a confiança outorgada para os políticos profissionais. Não podia dar em outra coisa.

A desmaterialização dos discursos é acompanhada da descrença nesta forma de fazer política. Seguindo neste caminho, o fosso entre o voto e a decisão real vai aumentar exponencialmente. Não seria exagerado afirmar ser este o buraco de ozônio da democracia representativa brasileira.

Mas, isto é apenas um alarme, só isso. Não queremos com este artigo jogar ainda mais porcaria no ventilador. Muito pelo contrário, esta intenção é simplesmente colaborar com a reflexão do eleitorado e reivindicar a capacidade de discurso com a necessidade de realização. Para que isso aconteça, vários fatores são importantes. Um deles é aumentar a carga de informação estratégica para o eleitorado. Isso significa a explicitação dos mecanismos lícitos e ilícitos, formais e informais, por dentro e por fora, legais ou reais, das práticas políticas concretas das elites dirigentes desse país. Somente o exercício da informação e da análise sem nenhuma censura podem aumentar a capacidade crítica da população. Portanto, em tese, um horário eleitoral gratuito poderia ser muito positivo nesse sentido.

Infelizmente, tudo o que foi defendido acima será justo o oposto do que veremos a partir desta terça-feira.

Artigo originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat






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