Como todo analista, vivemos de previsões, antecipando momentos, trabalhando com risco e possibilidade. Na semana passada, antevi uma abordagem longitudinal das operações da PF. Ou seja, uma breve retrospectiva dos dois governos de FHC e o primeiro mandato de Luiz Inácio. Para minha surpresa, o jornal Zero Hora, o maior da província, em sua edição dominical, nas páginas 10 e 11, veio com o título “10 Anos de corrupção”. Não tenho aqui a pretensão de dizer que pautei a muito competente editoria de Política do mais forte jornal do Grupo RBS. Mas, antecipamos o tema, e este é mérito.
A partir dessa retrospectiva, me dei conta do óbvio. Quase ninguém foi punido nas seguintes Operações e escândalos: 1997 – Compra de votos para a reeleição; 1998 – Grampo do BNDES/Privatização do Sistema Telebrás; 1998 – Dossiê Cayman; 1999 – Caso Marka/FonteCindam; 2000 – Precatórios; 2001 – Violação do Painel do Senado; - 2002 – Caso Lunus; - 2003 – Operação Anaconda; 2004 - Caso Waldomiro Diniz; 2004 – Máfia dos Vampiros; 2005 – Mensalão; 2005 – Mensalinho; 2006 – Quebra do sigilo do caseiro (caseirogate); 2006 – Máfia das Sanguessugas; 2007 – Operação Têmis; 2007 – Operação Furacão.
Como se não bastasse, para os saudosistas, aqueles que aproveitam a situação para falar a frase “eu era feliz e não sabia”, lembro do: Escândalo da Mandioca; Grupo Coroa Brastel; Caso Capemi; Quebra da Caderneta de Poupança Delfin; e nos estertores do regime, o auto-afogamento do jornalista Alexandre von Baumgarten encarregado de ressuscitar a revista O Cruzeiro e deixá-la à disposição da Casa Civil de Golbery do Couto e Silva.
Aqui na província de São Pedro, tivemos dois casos notórios. O primeiro, foi a absolvição dos deputados chamados “albergueiros”. São parlamentares donos ou padrinhos de casas de passagem, hospedando eleitores para consultas, operações, exames e transplantes na rede do SUS da capital. O tema tende a cair no esquecimento, e na pratica, pouca ou nenhuma punição houve. Um caso abafado que mexe com a elite gaúcha, é o caso da Construtora Habitasul, parte envolvida na Operação Moeda Verde. O esquema passa por licenciamentos ambientais facilitados, e obras de vulto na região de luxo, como o resort “Il Campanario”.
Dois proprietários foram acusados, e por coincidência, também contribuíram generosamente para campanhas políticas em Santa Catarina e no Rio Grande. O dono da Habitasul, Péricles Druck, através da pessoa jurídica, fez uma doação de R$ 10 mil para Sergio Grando (PPS), ex-prefeito da capital catarinense e hoje deputado estadual. Também receberam doações a governadora Yeda Crusius, do PSDB (R$ 100 mil), o ex-líder do DEM (PFL) na Câmara dos Deputados Onyx Lorenzoni (R$ 15 mil) e a ex-prefeita de Alvorada Stela Faria, hoje deputada estadual pelo PT (R$ 5.000).
Já, Fernando Marcondes de Mattos, dono do Costão do Santinho, na capital catarinense doou na última campanha eleitoral uma quantia de R$ 100 mil para o atual governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira (PMDB). Óbvio que podemos levantar a hipótese de mera coincidência e generosidade empresarial. E padecendo da mesma obviedade, quase todos os colunistas da mídia gaúcha, defenderam os direitos dos empresários no ar. Ou seja, infelizmente, os mesmos direitos que são diariamente combatidos pelos mesmos profissionais de comunicação, quando falam em prisão perpétua ou pena de morte.
Voltando ao tema da Operação Navalha, gostaria de ir além da retrospectiva factual e dos prognósticos se terá sobrevida ou não o senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Entendo necessárias algumas medidas, imediatas e urgentes. Não basta a denúncia, embora seja sempre importante. O ato de corrupção se dá entre corrupto, corruptor e traficante de influências. Fim do Foro Especial, fidelidade partidária absoluta, financiamento público de campanhas e o orçamento impositivo ajudariam bastante. Mas são medidas ainda insuficientes.
Isto porque, as empresas, empreiteiras, fornecedoras, beneficiárias, quase sempre tem abalo de imagem, mas não prejuízo real. Se por acaso, uma pessoa jurídica condenada, tivesse seus titulares presos e a empresa fosse proibida de concorrer, licitar ou fornecer qualquer coisa para o Estado, seria muito mais eficiente do que as laudas sem fim que lemos. Indo além, caso esta pena de reclusão, corrupção de servidor público ou autoridade, crime de economia popular por desvio de dinheiro do Estado, fosse crime hediondo e passível de pena máxima, as coisas já melhorariam. Caso a empresa fosse condenada, poderia ficar no mínimo 10 anos sem concorrer em licitações e obrigada a devolver com correção monetária, o total de valores desviados e/ou superfaturados.
É possível que desse uma grande quebradeira, levando as autoridades financeiras e econômicas a liquidarem dezenas de conglomerados. Ainda assim, entendo ser esta solução menos traumática para democracia brasileira do que a ausência de direitos para os debaixo e a impunidade estrutural para os de cima.