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A democracia gerencial gaúcha


Yeda e Dilma tem em comum a profissão, o ofício da política Executiva e a impetuosidade característica da conduta gerencial

4ª, 3 de outubro de 2007, Vila Setembrina dos Farrapos, Continente de São Sepé

Em dezembro do ano de 2006 Yeda Crusius sofreu terrível derrota antes mesmo de tomar posse. Quebrando promessa de campanha encaminhou para a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul (Alergs), um pacote econômico de aumento de impostos e que logo ganhou o apelido de “Yedaço”. Foi solenemente derrotada através de uma manobra de aliança de classes, comandada por seu vice-governador Paulo Afonso Feijó, este sim, representante de fato do sistema corporativo empresarial da Farsul-Fecomércio-Federasul-Fiergs. Um ponto de divergência fora o aumento da alíquota de ICMS, imposto estadual que incide na produção e no consumo. Adentrando o mês de outubro, o núcleo duro de seu governo volta à carga.

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Ainda nesta semana, o Palácio Farroupilha, casa legislativa que orgulhosamente se autodenomina Parlamento do Rio Grande, receberá um pacote salgado. Lei de responsabilidade estadual; aumento de ICMS; incidindo sobre consumo (energia elétrica, combustível e telecomunicações, dentre outros); redução de ICMS (para pequenas e médias empresas); revisão de incentivos sem “quebrar” contratos; combate à sonegação; regime de previdência complementar; pagamento de precatórios; venda de imóveis; transformar as fundações em Oscips; venda de estatais e corte de Cargos em Comissão (CCs).

Dada a complexidade do pacote, gostaria de me dedicar aos pontos que considero nevrálgicos. A governadora Yeda Crusius, o secretário da Fazenda Aod Cunha, o do Planejamento e Gestão Ariosto Culau e o da Infra-Estrutura Daniel Andrade não estão de brincadeira. Conformam o núcleo duro de governo, onde as escolhas pessoais da mandatária e as lealdades ideológicas falam mais alto do que as negociações políticas e de bastidores. Não por acaso, os três primeiros nomes são de economistas e o último, engenheiro civil e ex-executivo da Odebrecht. O discurso que unifica, chamado de realismo fiscal, tem um mote de fundo. Afirma que o estado está quebrado – e está mesmo – e por tanto “não resta alternativa”.

A coerência discursiva impressiona, porque este foi o eixo de Margareth Thatcher assim que a dama de ferro assumiu como 1ª Ministra inglesa em 1979. Dando a cara na mídia estadual, o economista de notório saber Aod Cunha afirma que o problema de caixa do Rio Grande é mais sério do que parece. Muitas vezes, por não ter a capacidade de investimento líquido de R$ 500 mil reais, terminam por interromper ou atrasar os investimentos de bilhões. Obviamente que o secretário se refere à avançada da indústria de celulose em toda a Bacia do Rio da Prata-Paraná e cuja matéria-prima são os mananciais do Aqüífero Guarani.

Outro eixo do pacote implica o corte de uma parcela dos benefícios fiscais. O governo afirmou em alto e bom que não vai quebrar contrato algum; sendo que boa parte das isenções tem como base os programas do governo Central. Para bom entendedor, isto significa que não serão atingidas as transnacionais operando no Rio Grande do Sul e gozando de benefícios para mais de trinta anos; não se toca nas exportações primárias in natura (como a soja em grão não-beneficiada) e o urgente é cumprir as metas acordadas com as indústrias papeleiras. Ou seja, o estado necessita de um regime de caixa a qualquer custo.

A solução é mais do mesmo. Privatizações, taxação sobre o consumo e transferência de capacidades do estado para a órbita privada. Thatcher fez algo parecido em março de 1990, na chamada Poll Tax War. Resutado, distúrbios civis em larga escala e a dama de ferro termina renunciando. Até por isso, o neoliberalismo não entra como discurso “puro”.

É necessário contrapor o imobilismo da democracia representativa, onde a maior parte dos políticos profissionais termina agindo com instinto de sobrevivência e causa própria. Não se esperaria deste governo uma promoção da democracia participativa em contra dos intermediários de ofício. Portanto, a crítica da política vem por direita, anunciando a “lógica gerencial” para temas que são essencialmente políticos e de ordem pública.

Por um lado o pacote prevê o corte de 70% dos CCs hoje vagos, equivalendo a 20% do total destes cargos, fato elogiável em qualquer governo. Por outro quer excluir da Constituição estadual a exigência de plebiscito para a venda de estatais. E por quê? Com o cuidado de afirmar que o Banrisul não constaria desta nova cláusula, o Executivo pretende “pressionar” os conselhos de administração das empresas públicas a serem mais “eficientes”. Isto não significa melhor desempenho no serviço, mas sim fechar no azul a qualquer custo. O mesmo ocorre com as fundações, sendo que o intento é transformá-las em Organizações da Sociedade Civil para Interesse Público (Oscips). Transferindo a gestão para o novo regime, diminui o poder dos sindicatos aumentando a barganha para a lógica gerencial. É a mesma fórmula aplicada na Inglaterra reeditada na Província de São Pedro.

Até o final desta semana o pacote será encaminhado aos deputados estaduais, hoje envoltos na CPI dos Pedágios, alvo de muita polêmica e quase nenhuma informação objetiva. As federações patronais já começaram a reclamar do aumento de imposto. A quebra de promessa e mudança de discurso ocorre na “esquerda” também, como no caso da CPMF. Na defesa do patrimônio público, apenas o recurso participativo através de plebiscito é eficiente. Acabar com a possibilidade da consulta direta é uma das metas e isto não é por acaso.

Artigo originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat






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