Logo, ainda segundo o próprio, este seria um ensinamento positivo. Concordo com a caracterização: a China é um espaço paradisíaco para o investimento externo, onde a taxa de permanência de capital vale pelo gigantismo de seu mercado interno. Mas, ao mesmo tempo, não pode ser baliza de comportamento político para nenhum governo preocupado com a soberania popular. Para Sardenberg, Dilma faz o inverso, e por tanto, erra:
"Pois parece que a presidente Dilma está com o mesmo dilema, invertido: como seguir pela esquerda, mas dando sinal à direita?"
De novo o jornalista referência para o Instituto Millenium acerta na caracterização, comigo discordando apenas da crítica. Este analista (o que aqui escreve) afirmara em diversas ocasiões que Dilma, Lula, o partido de governo e o lulismo como um todo, fizeram campanha por esquerda para governar à direita. Para tanto, gostariam de contar com banqueiros em postos-chave, tal seria o caso de Luiz Trabuco (Bradesco) e Henrique Meirelles (Bank Boston). Na versão de Sardenberg, cada qual seria um heróico self made man, entrando na base da hierarquia destas gigantes financeiras e terminam suas carreiras no topo da cadeia alimentar corporativa. Não posso discordar, estes operadores brasileiros venceram milhares de obstáculos para alcançar o topo de suas carreiras.
Fica a contradição. O mérito individual destes não altera a natureza da atividade bancária em sua versão especulativa e como bomba de sucção da economia. Não deve haver ilusão, caso não tivéssemos o Estado alimentando a política industrial e o consequente emprego direto, não haveria possibilidade de crescimento com trabalho estável. Dilma tampouco reduziu os ganhos do mercado financeiro, pois após algumas quedas sucessivas na famigerada Selic, esta voltara a subir, assim como o "sinal à direita" dado pelo aumento logo após a reeleição. Nem assim o "mercado" se acalmou, pois segundo Sardenberg (e ele sabe o que fala, pois escreve como sendo o espelho de suas fontes), a confiança seria verdadeiramente sinalizada caso:
"Isso exige ajuste fiscal, ou seja, economia no Orçamento, superávit primário maior, gastos contidos. Essa austeridade é condição para segurar a inflação. Quanto maior a austeridade das contas públicas, menor a taxa de juros necessária para derrubar a inflação."
Aí entra minha profunda discordância com o comentarista da CBN. Ninguém em sã consciência pode acreditar que a inflação seja controlada através do aumento da taxa básica de juros. O artigo de autoria de Maria Lucia Fattorelli (A inflação e a dívida pública) publicado no Le Monde Diplomatique e referência para o tema demonstra de forma incontestável o absurdo deste argumento. O professor da PUC-SP, Ladislau Dowbor demonstra o mesmo com riqueza de detalhes.
O problema é que o animal é faminto, e sua gula é infindável. Parece que os Executivos à frente dos grupos econômicos aqui operando querem, literalmente, o controle sobre os recursos coletivos, não importando se as regras do jogo desta democracia indireta e incompleta, onde o 3o turno condiciona o resultado do 2o, sejam ou não respeitadas.
Sardenberg termina dizendo que caso Trabuco ou Meirelles (aceitassem, este analista não crê nestas possibilidades), seria um verniz diante do discurso da presidente em função de suas escolhas e anúncios na campanha. Infelizmente, estamos anos luz deste pânico, do verdadeiro alarmismo que corre na(s) direita(s) brasileira. A recomendação do jornalista econômico é interessante, ao afirmar que:
"Ora, um ministro da Fazenda vindo da esquerda, um novo Mantega, um Mantega mais esperto, conseguiria dar os sinais à direita? Dilemas difíceis levam à paralisia. No caso da presidente Dilma, isso seria apenas trocar o ministro e manter tudo como está, dobrando aposta na “nova matriz”, essa de hoje, como disse na campanha."
Ou seja, Sardenberg aposta que Dilma se posiciona por esquerda, indicando que houve a escolha pela "nova matriz" e esta poderia ser materializada com a indicação de algum economista vinculado ao desenvolvimentismo, como aqueles que assinaram o manifesto publicado na semana de 09 de novembro na capa da Carta Maior. Digo que, apesar de ter votado com a disciplina orgânica de sempre (em Zumbi e Sepé), entendo que este momento - caso venha a ocorrer (no todo ou na parte) - seria interessante.
Porque assim teríamos a chance de ver os porta-vozes da direita mais acuada e uma possibilidade de mobilizar as bases sociais para ao defender seus interesses diretos. Óbvio que tais bases sociais estão, hegemonicamente, vinculadas ao lulismo, e por tanto, longe de serem reorganizadas por esquerda. Mas, ainda assim, como o partido de governo deixou há muito qualquer tipo de posicionamento popular ou classista, poderia ser a oportunidade de ao menos traçar a unidade sindical que tarda, no mínimo dez anos em ocorrer. A obviedade indica uma aglutinação de rumando à esquerda da CUT, acumulando forças as correntes eleitorais e não-eleitorais.
Vamos então torcer para que a profecia de Sardenberg seja anunciada. Infelizmente, este analista não crê tampouco nesta possibilidade. Fica a corrente prá frente.