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A norma e a crise

Viamão/RS, 28 de outubro de 2005 (data que o artigo foi escrito)

O cotidiano político nacional é o da crise. Ao menos, esta é a impressão que fica para a maioria dos brasileiros. Conforme dissemos no artigo da semana anterior, o grau de confiança nas instituições de representação e também nos braços regulatórios e repressivos do Estado são baixíssimos. Vale lembrar, segundo o nada contestador Ibope, apenas 8% dos brasileiros confiam nos políticos e 10% nos partidos políticos como estruturas representativas. A pergunta portanto é, que crise é essa?

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Vivemos na era da informação imediata, onde quase tudo é revelado a respeito de quase todos a todo o momento. Estaríamos assim acostumados a ter como norma a um escândalo político, correto? E porque então nos comportamos justo ao contrário? Uma boa variável explicativa é o fato de nos acostumarmos com uma idéia de norma a ser perseguida. Ou seja, um tipo ideal de funcionamento e “normalidade” democrática, noite e dia defendido pelos “especialistas”, os partidos e a grande mídia. Também, através dos fatos revelados e bombardeados por esta mesma mídia, aí sim de todos os tamanhos, esta “normalidade” é desmentida.

Apenas nos três dias anteriores da publicação deste artigo, o cenário político brasileiro viveu os seguintes atos, aqui apresentados em ordem aleatória e sem nenhum intento de combinação subliminar. O senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), ex-governador de Minas (segundo maior colégio eleitoral) deixa a presidência do partido que governou o país por oito anos consecutivos por denúncias de Caixa 2 em sua campanha para reeleição em 1998. O senador Geraldo Mesquita (PSOL-AC), desfilia-se da recém criada legenda sob denúncias de cobrar taxas sobre os salários de seus assessores, algo “tecnicamente” conhecido como rebate. O secretário particular do presidente eleito, seu amigo pessoal, Gilberto Carvalho, vai a CPI dos Bingos para uma acareação (medida de investigação criminal) com os irmãos do ex-prefeito assassinado de Santo André, o petista Celso Daniel. O senador João Capiberibe (PSB-AP), ex-governador do Amapá, é cassado pelo TSE.

Se alguém já se mostrou cansado, em função da leitura de temas requentados, pedimos que relaxe porque tem mais. O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, perde recurso impetrado, o parecer do deputado de Júlio Delgado (PSB-MG) é lido e aprovado por 13 votos a 1. Todos pedem a cabeça de Dirceu, inclusive o Ministério Público, que entra com processo de improbidade administrativa contra Dirceu, seu filho Zeca Dirceu (prefeito da hoje notória Cruzeiro do Oeste/PR) e o ex-assessor Waldomiro Diniz. No senado, o PSDB força o governo ameaçando criar a CPI do Caixa 2. O PFL embarca na medida que pode vir a destruir todo o sistema político do Brasil. A ameaça é protocolada com 38 assinaturas e soa como brado na voz do senador Artur Virgílio (PSDB-AM). Voltando às medidas clássicas de investigação criminal, a CPI do Mensalão promove grande acareação, estrelando o tesoureiro expurgado do PT, Delúbio Soares; o ex-operador financeiro do PSDB mineiro recrutado pelo PT, Marcos Valério; o ex-deputado Waldemar Costa Neto e o tesoureiro “informal” do PL, Jacinto Lamas.

Justiça seja feita, esta “norma” na arte de fazer política no Brasil não é exclusividade do governo Lula. Talvez por sua inexperiência no governo da União, pela escolha de aliados de 2º escalão nas oligarquias brasileiras (como o PL, PTB e PP) e a força da oposição sistemática de um PFL que ficou no governo de 1964 a 2003, o governo de Dirceu e cia. tenha metido cedo os pés pelas mãos. Tivesse a oposição ao governo FHC tanta força no Congresso como agora, escândalos como estes e talvez piores iriam estourar em 1998, o ano do leilão do sistema Telebrás e do grampo do BNDES. Ou no verão de 1999, quando da desvalorização do Real. Talvez com investigações sistemáticas, tanto nas CPIs como em forças-tarefa do MP e da PF, tendo como alvo a figuras como Sérgio Mota, Luís Carlos Mendonça de Barros, Ricardo Sérgio de Oliveira, o insubstituível Eduardo Jorge Caldas e, certamente, os últimos 4 anos de Fernando Henrique seriam tão agitados como está sendo 2005.

Voltando a crise, na ausência de uma luta de fundo classista ou contradição que obrigue os agentes a se posicionarem, sobra apenas a guerra intestina dos gabinetes e corredores do Congresso e do Planalto. Nesta arena política onde não há luta popular envolvida, resta a “normalidade” da classe política brasileira. Ou seja, fica aquilo que já estamos acostumados: desvio de dinheiro público; abuso de poder; ações de tipo criminal; golpes de colarinho branco; conluio para favorecimento de parentes e amigos; alianças com setores mercenários, tais como publicitários, banqueiros de investimento e doleiros, antes trabalhando para o adversário; espólio do Estado para benefício de grandes grupos econômicos nacionais e estrangeiros. Isto, dentre outras dezenas de manobras clássicas e experimentais (como o Mensalão), tantas que poderíamos ficar descrevendo-as por dias seguidos.

Para concluir esta curta mostra de fatos mesclados com análise indireta, entramos na terça-feira 25/10 em clima de crise. Brasília amanhece coberta por 3.000 cartazes mostrando Herr Bornhausen segurando uma revista Veja nas mãos. Por “coincidência”, o ministro do Trabalho e ex-presidente da central sindical hoje oficial, a CUT, havia declarado algo parecido há bem pouco tempo. Para cúmulo das contradições, a ação “subversiva” é paga com cheque pessoal e a arte dos cartazes é enviada a partir de um endereço eletrônico localizado em domínio oficial, com CNPJ e tudo.

Fazer política oligárquica sempre é pôr a militância em crise, e mais uma vez não deu outra. Nesta singela operação macarrônica vemos um problema de fundo. Um dos fenômenos que ocorrem com os militantes quando estes vão se adequando ao jogo burocrático e as comodidades do luxo, é deixar a guarda baixa. Pouco a pouco as direções se distanciam das pessoas que as elegeram e vão ficando preguiçosas. Perdem o jeito tanto para o trabalho de base como os mínimos reflexos operacionais. Ao fazerem uma ínfima operação de propaganda, já se atrapalham, deixam rastros e o esquema cai em menos de vinte e quatro horas. Esta gente, esqueceu como se milita no movimento popular e ainda não tem o gabarito para fazer política tradicional, de acertos, gabinete e corredor.

Vale lembrar do comentário de Willian da Silva Lima, o Professor, fundador do Comando Vermelho, veterano da Ilha Grande, quando viu seus colegas de cela serem anistiados pela revogação da Lei de Segurança Nacional apenas para os presos políticos:

“Isso não é coisa de bandido sério!”

E não é mesmo.

Originalmente publicado no blog de

Ricardo Noblat






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