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Os movimentos populares e a crise política no Rio Grande


Se fossem noutros tempos, a indignação popular tomaria conta da Avenida Borges de Medeiros, expulsando um governo corrupto e defendendo o direito à liberdade de reunião, manifestação e opinião.

A crise do governo Yeda pautou a agenda do RS nos meses de maio e junho. Mais do que fazer retrospectiva, proponho a análise sem “pré” conceitos. Vejo o rigor analítico como necessidade e considero falsa qualquer neutralidade. Opinião é posição. Opinar com rigor conceitual implica em analisar e incidir.

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Afirmar o ponto de partida analítico importa para dizer de onde falo. Vejo uma oportunidade que passou. Na segunda 16 de junho, os movimentos populares mais fortes do Rio Grande lançam nota repudiando a repressão ocorrida em 11/06 na capital. O texto marca unidade de classe e é assinado pela Comissão Pastoral da Terra, Federação dos Trabalhadores Metalúrgicos, Federação dos Trabalhadores da Alimentação, Levante Popular da Juventude, Movimento dos Atingidos por Barragens, Movimento das Mulheres Camponesas, Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, Movimento dos Pequenos Agricultores, Movimento Sem Terra, Movimento dos Trabalhadores Desempregados, Pastoral da Juventude Rural e Resistência Popular.

Num período de retrocesso das forças sociais, apenas a emissão de um documento assim já seria motivo de júbilo. O texto saiu após os episódios do Levante do Povo Brasileiro. Na quarta 11, cerca de 700 militantes ocuparam o estacionamento de um supermercado de Porto Alegre. A meta era um protesto contra a alta dos alimentos e a intervenção das transnacionais nos destinos do país. Houve forte repressão da Brigada Militar e reação dos militantes ali presentes. O episódio teve presos, hospitalizados, bombas de gás em pleno Parque da Harmonia e o coronel Mendes em pessoa comandando a tropa. A comoção social necessária para atingir no fígado o projeto econômico estava alcançada. O problema já não era a força expressada por uma esquerda social radicalizada, isto havia de sobra. O brete foi canalizar o acúmulo de forma direta e legítima.

Um governo emparedado por denúncias de corrupção não pode ser derrubado por operadores políticos cúmplices do mesmo projeto econômico. A intermediação liberal-democrática, quando um parlamentar “representa” os interesses de setores organizados, não tem frutos a dar por aqui. Ao menos não no campo dos movimentos populares. Para piorar, o recipiente estava errado. O PT já não canaliza a indignação, não depois de 2005. Além do aspecto moral, todas as reivindicações da militância que saiu na quarta 11/06 se opõem às políticas conjuntas do governo tucano estadual (PSDB) e do federal.

Na quinta 19 de junho, a mobilização “unitária” pelo fim do desgoverno juntou partidos da esquerda oficial, bases de movimentos e estudantes. O resultado foi pífio. A CPI do Detran-RS encerrava sem conseguir a prova material contra Yeda. No vazio político da oposição que não quer o impedimento, PSOL e PV já haviam entrado pedindo a queda da governadora. Na Praça da Matriz, a “unidade” foi tática e circunstancial, aja visto que as alianças para disputar as eleições municipais são no mínimo controversas. Aquilo que era estratégico para os protestos de junho, como o financiamento do BNDES para as papeleiras e o empréstimo do RS junto ao Banco Mundial, passaram para segundo plano. Foram escondidas porque todas estas ações de governo aproximam o Planalto do Piratini, isto sem falar na base aliada comum.

É impossível acumular sem interlocução legítima. A carta do dia 16 acabou referendando um protesto pela metade. Deu no que deu. Como cantava o poeta uruguaio Alfredo Zitarrosa:

!el que no cambia todo no cambia nada!

Este artigo foi originalmente publicado na Revista Voto, Ano 4, No. 45, página 74, ISSN 1982-730-X






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