Registrado está na história do Brasil às situações onde a mídia operou como um agente político. Não se trata de crítica, mas de constatação. Na semana da queda do campeão de audiência do estado, o escândalo foi outro. Vítor Vieira e seu portal Vide Versus simplesmente falaram aquilo que é de conhecimento público. Na era da desinformação, a edição dos enunciados é tão importante como a forma de proferi-los.
O eixo da denúncia passou pela constatação de que o delegado de Polícia Civil gaúcha, Luís Carlos Ribas, respondia a processo na Justiça Federal. Ou seja, a crise e o problema seriam fáceis de evitar. Bastaria com que Enio não o chamasse da Prefeitura para a Secretaria de Segurança Pública. Não quero com isso dizer que alguém processado seja condenado a priori. Longe disso. Mas, para impedir a fumaça, é preciso que não haja fogueira.
A mala direta com mais de 91.000 emails foi se referindo ao caso como o mar batendo no rochedo. Foi necessário um momento propício para que a denúncia de um processo judicial se tornasse ferramenta de trabalho político. E por quê? Pelo simples fato de que a verdade factual por si só não basta.
Uma mentira repetida mil vezes tem a chance de se tornar uma meia verdade. Mas, uma verdade inconclusa e parcial torna-se uma idéia pensável. Este conceito não é meu, mas de Noam Chomsky. Assim, quando no 1º escalão da área mais sensível de qualquer governo estadual do Brasil, não se pesquisa a vida pregressa nem a folha corrida no Judiciário, algo está errado.
Quando este erro é reiterado pela omissão da grande mídia, por interesses vários, é fatal que a mesma seja furada. Eis o ocorrido. Menores cotas de patrocínio e publicidade pode implicar em maior recuo, jogando na defensiva, ou então o diferencial. Não por acaso o lema do finado semanário Pasquim era: “O rato que ruge!” Na esteira do comportamento passivo e pouco crítico da maioria dos jornalistas brasileiros, em geral (me perdoem as exceções) o que se nota é a cobertura adesista.
Dezenas de âncoras de rádios de noticias do Rio Grande eram fãs de carteirinha de Enio Bacci. Mas, como jornalistas diplomados e com registro profissional, o mínimo que deveriam fazer era verificar a origem das denúncias. Bastava um colaborador com carteira da OAB e estava solucionado o “mistério”. Entre a prática chapa branca e o fontismo, por uma semana, o governo do estado parou.
Por motivos diversos, incluindo um grau de barganha ávida por mais cargos, o PDT se solidarizou com seu secretário mais popular e debandou do governo de Yeda, Ariosto, Carlos Crusius, Aod, Schüller e cia. Sem nenhum problema, o partido de tradição brizolista, salta do Piratini ao Planalto com grande desenvoltura. Juntou-se a fome com a gula. Com mais popularidade do que a mandatária, Bacci caiu, abdicando momentaneamente da possibilidade de investimento a largo prazo para que os herdeiros políticos de Leonel de Moura Brizola retornem ao governo do Rio Grande.
A internet e os colunistas mais conhecidos, reproduzem um impacto outrora atribuído à extinta Folha da Tarde. O editor da Revista Voto, Afonso Licks, uma das penas mais inteligentes e éticas do Rio Grande, me explicou o papel do veículo. O ágil vespertino circulava entre os corredores do poder do Estado, no meio do funcionalismo. Entre o Centro Administrativo e a Praça da Matriz, um terço dos formadores de opinião com caneta forte recebiam o produto do antigo Grupo Caldas Jr. A Folha da Tarde era temida.
Considerando que a mídia impressa perde agilidade para os meios eletrônicos, o temor passou para o jornalismo na internet. É certo, cada vez mais o colunismo substitui a reportagem. Mas, ainda que lavado, o discurso jornalístico, disparado por uma mala direta poderosa, munida com informações factíveis, segue causando destroços. Enio Bacci que o diga.
Artigo originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat