Uma falha profunda na análise política brasileira é a infelicidade recorrente de se pensar aos sistemas políticos como receita de bolo. Vão reproduzindo tipos ideais vindos de democracias consolidadas e com sociedade de consumo europeu. Saem taxando, nossos scholars, de “populistas” ou “movimentistas”, a partidos políticos fora do esquemão “clássico” de partidos de tipo burguês.
O caso do MAS boliviano é típico da incompreensão dos “pensadores” brasileiros e sua esquizofrenia ao se contentar com o medíocre papel de reprodutores de pensamentos estratégicos do pensamento único dos países centrais. O nome e o conceito fundador do MAS é Instrumento Político dos Povos Originais da Bolívia. É um passo além da poderosa CONAIE equatoriana. Discutem abertamente o poder, cogitam em exercê-lo através da reconstrução do Estado, e abrem margem para o exercício do Poder Popular, expressado por vigorosos e multi-étnicos movimentos populares.
Se Morales não começa a mover céus e terras, ele, justo ele o líder cocalero, iria começar a padecer de forma vigorosa, derrocado pelas mesmas massas que nele votaram. Isto, além da conspiração necessária com os oficiais nacionalistas e adversários dos setores de milico-traficantes tão típicos daquele país. O emprego das forças armadas denota este entendimento, e fratura deve estar maior que as alturas andinas.
O MAS como instrumento expressa uma parte de um Poder mais profundo, nacionalizante, nacionalista, nativista e popular. Uma das expressões deste Poder vai além do palácio de governo ou do governo em si. Na avançada em que se encontra este povo, se e caso Morales não vir a ser mais um líder carismático que desorganiza a iniciativa popular, simplesmente tudo pode acontecer.
Definitivamente, a Bolívia é um campo de batalhas, no momento travando diversas escaramuças.