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Delfim, Lula e o centro da política


Delfim, conselheiro de Lula, reforça a velha política de crescimento econômico dos seus tempos de Ministro da Fazenda na ditadura militar: aumentar o bolo cada vez mais. Dividir? Depois ele pensa nisso.

4a, 25 de dezembro de 2007; Vila Setembrina dos Farrapos

No domingo dia 23 de dezembro, o jornal Zero Hora trouxe uma entrevista com Antonio Delfim Netto. Nas páginas 10 e 11, o repórter Moisés Mendes decorreu sobre sua conversa ao telefone com um dos conselheiros do ex-líder sindical Luiz Inácio da Silva. Li e reli a matéria e me veio à mente uma afirmação que considero falsa. Segundo as palavras do ex-ministro de Emílio Garrastazu Médici, ele se posiciona no “centro”. Por esta lógica, no Brasil não existe direita. Digo mais, a ausência de direita assumida, permite a confusão ideológica, escamoteando legendas de “esquerda” que governam por direita. É o caso de Lula.

Discordo profundamente da idéia de ausência de polarização ideológica.. No Brasil temos direita sim. Pode-se afirmar a existência de uma direita hegemônica, pregando o neoliberalismo através de receituário macroeconômico que não passa de política financeira. Os demais projetos rendem subserviência a esta primeira. É por isso que na essência, não existe diferença entre os projetos desenvolvimentistas capitaneados por Dilma Roussef, e as críticas internas feitas por José Serra durante o segundo mandato de Fernando Henrique. Este consenso de “maturidade política” é tão forjado quanto os produtos piratas campeões de venda nas ruas do Centro de Porto Alegre.

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O motivo deste tema para o último artigo do ano é porque o economista Delfim Netto afirmou justamente o oposto durante a entrevista. Na página 11, o criador da maxidesvalorização do cruzeiro (em 1983), apresenta uma pérola:

“Esse negócio de esquerda e direita não passa de sinal de trânsito. Todo mundo viu onde termina a esquerda. Em geral no buraco. A direita também no buraco. De forma que é melhor ficar no centro.”

Estas palavras provêm de uma das maiores autoridades econômicas do Brasil, professor da USP e um dos cérebros da ditadura. Portanto, não é presumível que sejam proferidas dentro de uma pretensão acadêmica ou teórica-analítica. Como saem da boca de erudito e não tem rigor algum, formam parte de um enredo que é pura peça de propaganda política. Eis que o homem que foi ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento servindo a ditadura antes, durante e após o AI-5 não é de direita. Se Delfim Netto não é de direita, então não existe direita no país.

É outro fenômeno de nossos tempos. A trajetória política fica encoberta mediante uma simples declaração. Por mágica, o passado se apaga ou torna-se fato indesejável. Personagens são reconfigurados e o país perde a memória. Romeu Tuma deixa de ser o cérebro da máquina repressiva cujo braço era Sérgio Paranhos Fleury e torna-se o “Xerife do Brasil”. O então presidente José Sarney, deixara de ser da UDN, da Arena e do PDS e governa pela aliança “democrática”. Um que outro político defende a ditadura e o período de exceção, mas são mais caricatos do que orgânicos. Isto é típico de um país desconhecedor da própria história. Sem memória, o futuro é o passado.

Retornando às pérolas de Delfim, a seguinte chama ainda mais atenção: “Continua essa idéia de que ser de esquerda é elegante e ser de direita é pernicioso. Por quê? Porque são estereótipos que foram inventados.” Ou seja, aspirações humanas surgem no discurso do homem responsável direto pelo endividamento brasileiro como chavões. Responde ao seu próprio estereótipo – aliás, mais que merecido – com outro. Ele está no “centro”, seja lá o que isso queira dizer. Já o patrimônio simbólico da classe trabalhadora tem de conviver com o criador do Milagre e uma de suas criaturas, Lula, jogando no mesmo time. Isto porque, mesmo governando com o estigma e a marca eleitoral de “esquerda”, o governo de Luiz Inácio assegura a mesma correlação de forças em todos os setores e eixos de poder no Brasil. Traduzindo, é um governo de direita.

A presença de tucanos em postos estratégicos do governo assegura essa continuidade. O caso mais conhecido é de Henrique Meirelles, como regente do Banco Central e à frente do Copom. Outro tucano, ganhando destaque recente é Ronado Sardenberg, presidente da Anatel. Capitaneando a nau da convergência e abrindo espaço para a presença de transnacionais na produção de conteúdo, o ex-chefe de inteligência do primeiro mandato de FHC tem importância cada vez maior. Outra forma de assegurar a configuração de direita do governo, além dos tucanos e do baixo clero da base “aliada”, é a lista de

Arenistas dentro e ao lado do Planalto. Neste time, Delfim Netto é o craque, mas não é o único.

Na área sensível da inteligência pouco ou nada foi mudado. O ex-Diretor Geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, hoje dirigindo a Abin, é homem de confiança de Romeu Tuma. Seria o mínimo de sensibilidade e tato político evitar a continuidade na política econômica e no controle do aparato repressivo. Ocorreu justo o oposto. Entendo que com este co-governo de ex-desafetos políticos, fica completa a transição política no Brasil. Isto porque a política é uma interseção da economia e da ideologia, e vice-versa. Ninguém apaga seu passado político, por mais que o esconda. Renegar é como trair; e a traição é parte da política profissional. O economista de São Paulo é tão responsável pelo horror da ditadura quanto o foi Orlando Geisel ao comandar o estado de guerra interna. Delfim Netto é um ícone.

É mais significativa sua aliança com Lula do que a presença de Márcio Fortes, homem da cota de Severino Cavalcanti (PP), no Ministério das Cidades. De certo modo, o ex-metalúrgico é um pouco cria do criador do Milagre. Delfin promoveu a dívida e compartilhou em parte dos planos do Brasil Potência. Roeu a corda duas vezes. A linha dura militar acreditou neste projeto, mas perdeu a luta interna. Delfim pegou “exílio” na embaixada brasileira na França e depois voltara para servir no governo Figueiredo, onde quem dava as cartas eram os “sorbonistas”, com Golbery manejando as cordas. Ficou ao lado dos vencedores e enterrou seu Milagre com uma pá de cal. Nunca custa lembrar que o arrocho salarial foi fator de mobilização ainda mais forte do que a Anistia e a redemocratização. Assim, os peões foram para as ruas contra Delfin. Hoje, a grande liderança popular da Abertura governa ao lado de seu maior inimigo. Quem traiu?

Voltando à matéria, Delfim joga confetes para todos os lados. Elogia os governos de São Paulo, de Minas, da Bahia e do Rio Grande. Compara-os com o governo Central, dizendo literalmente: “O governo está realmente privatizando tudo o que pode, fazendo concessões, acelerando investimentos do PAC”. Enquanto isso, reconhece que as verbas da CPMF dificilmente iriam para a sáude, e ainda se fossem, não solucionariam o problema crônico do SUS. Rasgando elogios aos planos e metas de desenvolvimento subordinado ao capital financeiro, o ex-candidato a deputado federal pela legenda de Orestes Quércia dá a entender que não existe saída por fora da ciranda financeira e do “ajuste austero”. Existe sim

Esta é apenas mais uma afirmação falaciosa. É algo tão absurdo quanto dizer que Delfim Netto não é de direita, mas de “centro”. É tão errado quanto concluir que um governo que paga quase R$ 17 milhões de juros por hora possa ser de esquerda.

Artigo originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat.






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