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Olívio e os dilemas da esquerda gaúcha


De mãos abertas para novas alianças, seguindo o padrão nacional, com um olho nos eleitores de Simon e outro, nos votos de HH e da filha de Tarso.

3 de outubro de 2006, Vila Setembrina dos Farrapos, Continente de São Sepé

O pleito no Rio Grande ganhou ares emocionantes na última semana. Na quinta e na sexta-feira anteriores ao domingo 1º de outubro, algumas pesquisas já apontavam a Yeda Crusius (PSDB/PFL/PPS) em primeiro lugar e Germano Rigotto (PMDB/PTB/PMN) em segundo. No sábado, 30 de setembro, véspera da eleição, absolutamente nenhum dos três concorrentes tinha certeza do que poderia acontecer. Havia alguma suposição de que a direita ia decidir sozinha ao destino do Piratini para os próximos quatro anos. Qual não foi a surpresa quando, na segunda metade da apuração, Olívio Dutra (PT/PC do B) abriu pequena margem e ponteou na frente do atual governador.

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Na urna a diferença foi mínima, apenas 16.341 votos. Já para as opções estratégicas das esquerdas gaúchas, a presença de Olívio no 2º turno desarruma várias expectativas. No artigo de ontem, a respeito da vitória de Yeda, fizemos uma análise prospectiva da posição dos grandes capitais e oligopólios do estado. Neste, vamos nos ater ao debate corrente na interna da esquerda local. Especificamente, tratamos dos setores mais à esquerda do próprio PT e do movimento popular com maior gravitação no RS.

São três os círculos de influência que podem ser comovidos pela candidatura de Olívio. Um deles passa pela luta política para decidir a linha de esquerda dentro dos sindicatos não oficialistas. Trata-se do embate já deflagrado entre a Conlutas e a Intersindical. Na primeira estrutura, o PSTU é hegemônico, tendo na sua extrema-esquerda não mais que 20% do total de afiliados. Já na segunda, a presença majoritária é de coletivos e tendências mais próximas ao PSOL, mas não conta com uma hegemonia interna definida. Assim como na Conlutas, na Intersindical a extrema-esquerda é minoritária.

Outro círculo de influência e relações políticas, com alguma correlação com o primeiro, aborda o universo de simpatizantes e afiliados do PSOL gaúcho. Este engloba suas várias correntes internas, muitas delas ainda em estágio embrionário, e a gravitação excessiva de Luciana Genro na interna partidária local. Considerando que a filha de Tarso obteve expressivos 185.071 e é a única parlamentar eleita da Frente de Esquerda (PSOL/PSTU e PCB para a majoritária), mesmo com a cláusula de barreira sua influência interna é absurdamente maior do que o restante dos militantes organizados.

O terceiro círculo eu diria que é o crucial para o movimento popular do Rio Grande. Atravessa a Via Campesina de ponta a ponta, e implica na polêmica de posições dentro da coordenação estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ao longo de 2004, foi amadurecendo nestes setores a idéia de abandono da luta institucional e parlamentar. Tanto é assim que o deputado estadual pelo MST, com legenda do PT, Frei Sérgio Goergen, sequer correu para a reeleição.

A direção rachada, apoiara dois candidatos para deputado estadual, Dionílson Marcon (reeleito) e Júlio Quadros, que não entrou. Para deputado federal, novamente Adão Pretto foi eleito, mas já sem o esforço conjunto dos sem-terra em sua campanha. Para que se tenha uma idéia do aperto, o histórico deputado do MST fez apenas 80 votos a mais que o ex-prefeito de Pelotas, Fernando Marroni, não eleito.

Mesmo não explicitando o posicionamento não-institucional, boa parte dos militantes do MST e da Via Campesina apontava uma outra forma de acumulação de forças. Há dois anos sendo formados nos ciclos de debates da Consulta Popular, esta militância se vê no dilema da contradição da opção estratégica com a urgência tática. Some-se a este difícil problema, um sentimento de carinho e respeito pela figura de Olívio Dutra e está feita a confusão.

Mal acabara o primeiro turno e os discursos já se acirraram. O tema centra é a crise estrutural do Estado gaúcho e as saídas para este desafio. Alguns problemas de fundo se avizinham para a campanha, dentre eles: a desnacionalização da terra; a apropriação das reservas de água do aqüífero Guarani pelas gigantes da indústria florestal (Stora Enso, Votorantim e Aracruz); a privatização das estatais sobreviventes ao governo Britto, dentre elas o Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul); o repasse de recursos públicos (a fundo perdido) para os oligopólios do RS; e a questão de isenção fiscal de um lado, com o tarifaço para aumentar a arrecadação de outro.

Dentre estas pautas, o tema das privatizações é o que cala mais fundo. Yeda já afirmou em rede estadual de TV que não vai privatizar estatal alguma, e tudo não passa de boataria de campanha. Disse que não iniciaria um processo como este sem antes passar o processo por consulta direta através de um plebiscito. Ou seja, mesmo a direita prevê a necessidade de recursos de mobilização. E é justo neste quesito que as correntes locais mais à esquerda terão dificuldade de manter a sua militância fora da campanha de 2º turno.

Se apoiarem abertamente a Olívio Dutra, colam suas trajetórias com as práticas pouco republicanas do PT nacional. Caso convoquem para anular o voto, corre-se o risco do isolamento das próprias bases e setores sociais a quem organizam ou influem. O mais provável é a tática de liberar a militância para votar em Olívio, mas sem nenhum envolvimento orgânico na campanha. Ou seja, em função da conjuntura eleitoral, podem perder o acumulo de mais de três anos de refregas e lutas de posições internas.

Conforme já dissemos no artigo anterior, a eleição nacionalizada para o governo do Rio Grande é uma disputa complexa, com várias rodadas e arenas simultâneas.

Artigo originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat






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