No texto que segue consta o conjunto das análises realizadas ao longo da semana antes, durante e após a votação do PL 4330, cuja tensão antecede os atos da direita dominical, que sai às ruas após o almoço de domingo, 12 de abril.
Análise preditiva da semana
Estamos na semana do 12 de abril, marcada pela agenda de protestos convocados de forma cívica para o próximo domingo de tarde. A intenção da direita é pedir a renúncia do Executivo, algo que está longe de ocorrer. Se alguém prestou atenção para a correlação de poderes políticos de fato - novamente insisto - a bola está quicando na frente do gol, mas falta condição do time à esquerda de chutar. Méritos do lulismo, que só vai deixar reorganizar este campo político (a centro-esquerda ou o que dela resta) ao final da decadência deste fenômeno.
A data de 12 de abril marca certa perda de fôlego, até porque o verdadeiro poder não está mais na direita ideológica (neoliberal de linha chilena) e sim na capacidade do cardeal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) de brecar as iniciativas do Planalto e também, de impor uma agenda anti-popular. O mesmo se dá com outros transformistas da política, como o deputado federal Paulinho da Força (SD-SP). Hoje cacique de seu próprio partido, a Força Sindical ocupara postos-chave no Ministério do Trabalho de Lula e Dilma e agora vocifera na TV que vai se opor às medidas impopulares do tucano Joaquim Levy, que fizera campanha para o Armínio, tal como o próprio Paulinho. Além do ataque frontal aos direitos de trabalhadores, como a revisão das condições de pagamento do seguro-desemprego, Cunha ameaça entrar em temas de ordem estratégica, como o modelo de exploração do Pré-Sal, revisando a fórmula da partilha e retomando a forma de exploração do período FHC.
Como a(s) direita(s) dentro e fora do governo estão impondo a agenda e colocando o que resta de força social organizada contra a parede, o governismo opera como falsa hegemonia dentro do movimento popular ou o que dele restara. Refluxo é sempre complicado, embora sempre seja possível esboçar alguma reação.
A força política reacionária que assume o PL das terceirizações
Estamos diante de um ataque frontal contra a estrutura da regulação das relações de trabalho no Brasil. Eis a contradição. Hoje o pelego histórico Paulinho da Força está na oposição. Mas quando a herança do trabalhismo (quando da fusão entre PDT e Força Sindical) colocou os trabalhistas no Ministério do Trabalho e Emprego à frente da pasta, Paulinho era pessoa forte no Executivo. Assim houve escândalo de mau uso de fundos no CODEFAT - onde vergonhosamente as centrais sindicais têm assento mesmo antes de estarem regulamentadas - e de onde as relações de classe se transformam em autêntica colaboração. Agora a Força Sindical e sua legenda, o Solidariedade de Lech Walesa e não o dos Conselhos Operários de Gdansk, se posiciona na bancada oposta e faz coro com Eduardo Cunha e o Blocão do baixo clero.
Para quem conhece os meandros do Parlamento já está explicado. O SD faz uma troca e, operando como “cavalo de batalha” das entidades empresariais adianta esta proposta absurda de terceirização e não aborda o sentido contrário, que seria a Convenção 158 da OIT. Ao mesmo tempo o pelego que também já foi governista vai para a TV para defender a manutenção das regras do FGTS e do seguro desemprego. Assim prende uma vela para cada santo e preserva o acordo com o cardeal demoníaco, Eduardo Cunha.
Estamos com a ameaça real de cumprimento da profecia de FHC (o final da Era Vargas) e justo por um sindicalista que traz a herança maldita de Getúlio, o sistema federativo de Joaquinzão e sua descendência de pelegos históricos como Antônio Rogério Magri e Luiz Antônio Medeiros. A CUT foi fundada em 1983 na base da cadeirada. Hoje após 12 anos de co-governo de coalizão vivemos o absurdo de ver andar um projeto anti-povo desta envergadura. O mínimo seria uma greve geral para responder a esta provocação patronal. Mas a mentalidade de conciliação desarma a capacidade de resposta articulada da força de trabalho. O absurdo político aumenta a cada dia, pois no Brasil do Lulismo, o aumento do emprego formal não resultou em crescimento da sindicalização e do poder das entidades de classe.
A tática do Planalto é ainda mais vergonhosa. Jogou para tentar adiar a votação e ao mesmo tempo chegou a flertar com o ex-ministro dos Transportes de FHC, Eliseu Padilha, para passa-lo para a pasta da Articulação Política (Secretaria das Relações Institucionais) para fazer dobradinha com o ex-ministro da Justiça de FHC Renan Calheiros e o cardeal do mal Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O recâmbio do ministro Pepe Vargas para a pasta dos Direitos Humanos acabou por acumular as funções com Michel Temer, eminência cada vez menos parda no seu governo. José Dirceu queria governar junto ao PMDB. Fez-se o seu desejo, pois agora quem governa é o PMDB. O burocrata histórico deve estar contente, pois recuou de posição menchevista para uma situação pré-Kerensky. Parabéns Dirceu, sua aliança profetizada em 2005 se concretizou!
Ainda quanto ao PL 4330, havia a torcida de que o projeto não passasse (expectativa não confirmada), mas afirmo que este andamento já implica em absurdo retrocesso de direitos. Os direitos -como ensina a atual experiência europeia após crise de 2008 - têm de ser conquistados e, em permanente estado de atenção e disposição de luta, preservados e ampliados. Que nos sirva de lição este fatídico 7 de abril.
Fragmentos da derrota ideológica e da resistência ainda que tardia
No auge dos confrontos de 7 de abril, constatei as seguintes evidências: Governo de "esquerda” que não muda mentalidade dá nisso. O companheiro Rodrigo Silva Do Ó (um dos melhores analistas alternativos da atualidade) está coberto de razão e para concluir a desgraça a base sindical faz pouco ou nada. Apoio crítico dá nisso. A base do governo saiu para as ruas com duplo discurso dia 13 de março e perdeu as condições de defender os interesses da classe. Fim de ciclo é o inferno. Neste momento derrotar este retrocesso é a maior das prioridades
Fica o alento de ver algo inesperado. É tão raro ver a CUT lutando que as fotos da Esplanada dos Ministérios transformada em praça de batalha até valem como registro histórico. Só se espera que ao fim do mês não estejamos de luto pelo falecimento das bases da regulação do trabalho. Mesmo que o projeto do PL 4330 maldito venha a ser aprovado por todo o rito legislativo, a batalha final pelo veto resultará no esboçar de alguma reação de quem pouco ou nada se esperava. Novamente abrem-se janelas de oportunidades e agora seria o momento ideal de fazer esta disputa por esquerda. É animador.
PARA CAIR DA CADEIRA 1 – A política como ela é e a democracia cada vez mais distante
O líder do governo na Câmara, o deputado federal José Guimarães (PT-CE), declarou no dia 7 de abril, no meio dos protestos das bases sindicais contra o PL da precarização, que sua função como líder do Executivo era ponderar e equilibrar as propostas. Chegou ao cúmulo de pedir "bom senso" para empresários e trabalhadores, como se fosse possível construir acordo na retirada de direitos fundamentais. Este PL começa a realizar a profecia de FHC - o Fim da Era Vargas - ao menos nas relações de trabalho. O Planalto jogou para o adiamento e perdeu feio. Se alguém ouviu Dilma afirmar que vetaria este projeto de todas as formas e que faria de tudo para impedir a precarização das regras do trabalho formal, me digam. Se isto sair, novamente a Vaca vai estar tossindo, e muito.
PARA CAIR DA CADEIRA 2 – A política como ela é e a democracia cada vez mais distante
A maior parte dos deputados federais desconhecia a matéria do maldito PL 4330 ainda na manhã de 08 de abril. O texto avulso ainda não havia sido distribuído e o mesmo já está todo emendado. O autor do projeto é o impagável Sandro Mabel (PMDB-GO)- ex-mensaleiro do PL de Goiás - e o relator é o deputado federal Arthur de Oliveira Maia (SD baiano, ex-PMDB-BA, da ala do também impagável Geddel Vieira Lima, este por sinal afilhado político de Antônio Carlos Magalhães, ACM) e quem está dando suporte para esta precarização institucional é o Partido Solidariedade (SD), sendo que esta força política, quando ainda era embrionária no PDT, ocupara postos-chave no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Estamos diante de um absurdo onde o baixo clero vota e aprova o que sequer entende, a pauta do Parlamento está trancada pelo cardeal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o governo de coalizão tentou arrumar a melhor solução para si: adiar a pauta, o que não conseguira. No país dos absurdos, 12 anos consecutivos de colaboracionismo e peleguice de quem ainda não era tão pelego deu nisso. Agora é para fazer todo o possível para barrar este PL – e só vejo a possibilidade remota do veto presidencial - sabendo que outros tão ruins quanto virão pela frente.
A profecia do fim de ciclo e fim de governo
O governo Dilma vai acabar se este PL for aprovado na Câmara e no Senado e a presidenta não o vetar. Na verdade, se fosse para ao menos fazer uma simulação de governo de centro-esquerda, deveria estar fazendo campanha contra e dizendo em rede nacional que o projeto já está vetado. Já que o governo de fato está fazendo a vaca tossir todos os dias e a equipe econômica liderada pelo representante do Bradesco já acertou a bagatela de 20 bilhões de reais para o Fisco - tudo pelo superávit - caso o PL da excrescência seja aprovado - restaria ir com tudo para brecar esse retrocesso na Câmara e assim matar o mal pela raiz. Como a proposta passou na Câmara Baixa e deve ser aprovado ao ir para o Senado, a arena definitiva é passar ou não pelo veto do Poder Executivo. Aí é o fim ou finalmente alguma tomada de posição à esquerda da ex-guerrilheira. Como não creio na tal da vaca que não tossirá jamais, seria preferível matar a serpente agora a assistir o veneno se espalhando. Depois fica quase irreversível, como a PEC do diploma do jornalista, que rema a passos de cágado nas vielas do Congresso e não anda. Frear essa chibata pós-fordista é urgente, e ainda dá tempo.
Na noite de 8 de abril cumpriu-se o sonho da UDN, o pesadelo dos trabalhadores, o racha do movimento sindical e a inflexão tardia de CUT e CTB de vez em quando lembrando que sem classismo não há luta sindical. Ainda dá tempo de reagir, ou será a hora de enterrar de vez o que resta do governo Dilma. Se ela não vetar (caso o texto mantenha o seu núcleo central após passar pelas duas casas legislativas), todo o rebanho não apenas estará tossindo, mas as vacas terão pneumonia terminal.