A candidatura do ex-bispo Fernando Lugo está marcando o cenário político no país vizinho. Marca também a estupidez da maior parte da grande mídia brasileira e da academia nacional, cuja vocação para neo-colonizada mira pro Norte, conjecturando se sai Obama ou Hillary. Não se dá conta a maior parte dos bem informados do Brasil que para onde vai o Paraguay pode ir boa parte da América Latina.
Explico. A república criada quando da separação do Vice Reinado do Prata, desde que fora massacrada na Guerra genocida sob patrocínio inglês, se vê em uma possibilidade de saída estratégica. Caso Fernando Lugo saia vitorioso, se põe em teste a democracia de lá. Se eleito e cumprir as promessas de reformas estruturais, vai emparedar as elites locais, o sub Império chamado Brasil e as tropas dos EUA estacionadas ali. Se ganha e não governa, por traição, sofrerá a pecha de um Jean Aristide ou Lucio Gutiérrez. Este é o pior dos cenários para o movimento popular do país onde 95% é bilíngüe, porque fala guarani e castelhano.
Se Lugo vencer na urna e não levar, as tensões aumentarão no Paraguay, rumo a uma temperatura quase insuportável para o receituário de estabilidade com democracia esvaziada. Pior ainda seria ganhar, começar a governar e ser derrubado. Nem a primeira nem a segunda hipótese aventada neste parágrafo são irreais. Não custa lembrar que além da cambaleante Blanca Ovelar, pelo Partido Colorado; o outro candidato com chance de vitória é o favorito de parte do empresariado e do governo brasileiro, o ex-general, ex-golpista, acusado de narcotraficante, Lino Oviedo.
Oviedo, que até com Lula esteve, ficou asilado primeiro na Argentina e após, durante seguidos anos, aqui no Brasil. Não foi nenhuma novidade, pois Oviedo seguira os passos de Stroessner, que no Brasil passara seus últimos 17 anos de vida. Em 1989, a então mais longa ditadura da América Latina fora derrubada por um parente, em virtude de uma árdua conspiração cujo interesse de fundo era o controle sobre rotas de contrabando e tráfico de drogas e armas.
A vitória de Oviedo, mais do que a continuidade, pode assegurar um peso maior do Brasil dentro do Mercosul e da geopolítica latinoamericana. Com a ex-ministra de educação do Partido Colorado – partido de quase toda a classe política do Paraguay e representante de fato dos 4% de abastados – pouco ou nada mudaria. Já com o ex-bispo, que deixara a batina no final do ano passado, simplesmente tudo pode acontecer. Tanto pode sair um governo nacional-popular, como abrir o caminho para um golpe, uma fraude ou uma mega decepção da parte organizada das maiorias paraguaias.
Como quase sempre ocorre, nosso país joga vergonhosamente de bombeiro do Continente.