Um vídeo da marcha do Occupy OakLand realizada na quarta-feira, 25 de outubro, realmente parece e soa como um campo de batalha. O barulho dos disparos é quase permanente no vídeo. A polícia lançava gases lacrimogêneos contra a multidão, quando de repente surge alguém gritando “Um médico!”. Os civis correm até um manifestante deitado de costas na rua. A poucos passos, um grande número de policiais de negro, vestidos com uniformes anti-distúrbios, aponta suas armas contra os manifestantes que tentam prestar os primeiros-socorros ao ferido.
A vítima, Scott Olsen, é um ex-oficial da marinha dos Estados Unidos que já serviu duas vezes no Iraque. O vídeo, que é de domínio público, mostra Olsen parado tranquilamente junto ao veterano das forças armadas Joshua Sheperd, sustentando uma bandeira dos Veteranos pela Paz. Pedi a Sheperd que descrevesse a cena: “Estava de pé, usando meu uniforme, e Scott estava parado ombro a ombro junto a mim em uma atitude pacífica. Flamejava a bandeira dos Veteranos pela Paz e, de repente, veio o caos. Nunca estive em uma batalha, mas o que aconteceu ali foi muito similar a uma guerra ou a uma zona de guerra”.
Olsen vestia uma jaqueta camuflada, um gorro com viseira e uma camiseta do Veteranos do Iraque Contra a Guerra (IVAW, sigla do nome original em inglês). O impacto do projétil policial foi todo na cabeça, provavelmente o cartucho de um gás lacrimogêneo, que fraturou seu crânio. Enquanto um pequeno grupo de pessoas se aproximava para ajudá-lo, um policial lançou uma granada de mão em sua direção. A granada explodiu imediatamente.
Quatro ou cinco pessoas alçaram Olsen e o afastaram rapidamente do cordão policial. No hospital de Oakland, induziram-lhe ao coma para diminuir a inflamação cerebral. Agora está consciente, mas não pode falar. Comunica-se por meio de um caderno.
Entrevistei um amigo de Olsen, Aaron Hinde, também veterano de guerra no Iraque. Hinde participava dos protestos de Occupy San Francisco quando começou a receber uma série de mensagens no Twitter sobre um veterano ferido em Oakland. Correu em direção ao hospital para ver seu amigo. Depois me falou de Scott: “Ele veio à São Francisco três meses atrás. Antes esteve em Wisconsin, onde de fato participou da ocupação no Capitólio estatal. Scott é provavelmente um dos sujeitos mais amáveis e bondosos que conheço. É do tipo que está sempre com um sorriso no rosto e nunca tem um comentário negativo... Creio nesse movimento de protesto porque o que está acontecendo neste país é claro, principalmente para nós, os veteranos de guerra. Abrimos os olhos após ter ido à guerra lá fora. Por isso, há um pequeno grupo nosso aqui e estamos todos muito motivados e comprometidos com a causa”.
Enquanto cobria uma das manifestações do Occupy Wall Street na Times Square em 15 de outubro, encontrei o Sargento Shamar Thomas visivelmente irritado. A polícia montada avançou sobre os manifestantes. A única coisa que os deteve foi um cavalo que caiu de joelhos. Outros policiais conseguiram levantar as barricadas de metal e acossavam uma multidão assustada contra os canos de calefação. Thomas vestiu seu uniforme camuflado. Tinha várias medalhas de sua turnê de combate no Iraque presas ao pescoço. Gritou para a polícia, denunciando o tratamento violento destinado aos manifestantes. O veterano depois escreveu sobre o incidente: “Há um problema claro neste país. As pessoas pacíficas deveriam poder protestar sem que houvesse brutalidade. Estive em uma situação de distúrbio em Rutbah, no Iraque, em 2004 e não tratamos os cidadãos iraquianos como estão tratando os civis desarmados em nosso próprio país”.
Há pouco foi criado um grupo que se autodenomina “Veteranos dos 99 por cento”, que, junto com o capítulo de Nova York do IVAW, fixou o dia 02 de novembro como o dia da marcha até a Praça da Liberdade para somar-se formalmente ao movimento e apoiá-lo de maneira direta. Sua convocatória diz: “Veteranos dos 99 por cento chamam a atenção sobre a forma como os veteranos de guerra são afetados pelos problemas econômicos e sociais combatidos pelo movimento Occupy Wall Street. Esperamos contribuir com a participação dos veteranos e membros do exército ‘em atividade’ para que este movimento seja mais visível e completo”.
José Vásquez é um dos manifestantes que participou da marcha. Ele é diretor-executivo do IVAW. “Convocamos todos os veteranos e o pessoal do exército em atividade para que apresentem em sua sede local do Occupy e tornem público que são veteranos de guerra. Queremos que todos conheçam a nossa voz. O 1% usa a polícia e às forças armadas para conservar o que tem. Estou aqui para dizer-lhes que nós, as forças armadas e os veteranos de guerra, estamos enojados pela forma como as pessoas estão sendo tratadas”.
Quando passei pelo Occupy Louisville, em Kentucky, no fim de semana passado, as duas primeiras pessoas que conheci ali foram veteranos. Um deles, Gary James Johnson, disse-me: “Servi no Iraque durante um ano e meio. Uni-me às forças armadas porque pensei que era minha obrigação ajudar a proteger este país... Neste momento, há outra forma possível de contribuir e ajudar à população”.
Os analistas prevêem que o frio vai enfraquecer o movimento de protesto que ocorre em todo o país. Perguntem a qualquer veterano que esteve no Iraque e no Afeganistão sobre sobreviver à intempérie em temperaturas extremas. E pensem nas palavras que outro veterano escreveu em um cartaz que sustentava no alto da Praça da Liberdade: “É a segunda vez que luto pelo meu país e a primeira em que conheço o inimigo”.
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Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna.
@2010 Amy Goodman
Texto em inglês traduzido por Mercedes Camps y Democracy Now! em espanhol,
Esta versão é exclusiva de Estratégia & Análise para o português. O texto em espanhol traduzido para o português por Rafael Cavalcanti Barreto, e revisado por Bruno Lima Rocha.
Amy Goodman é âncora do Democracy Now!, um noticiário internacional que emite conteúdo diário para mais de 650 emissoras de rádio e televisão em inglês, e mais de 250 em espanhol. É co-autora do livro “Os que lutam contra o sistema: Heróis ordinários em tempos extraordinários nos Estados Unidos”, editado pelo Le Monde Diplomatique do Cone Sul.