Este árabe, que por acaso da história tem passaporte francês, caso não fosse craque de futebol, seria mais um “suspeito”, eternamente parado pelas políciaseuropéias para “maiores averiguações. - Foto:
Este árabe, que por acaso da história tem passaporte francês, caso não fosse craque de futebol, seria mais um “suspeito”, eternamente parado pelas políciaseuropéias para “maiores averiguações.
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Há menos de um ano a França estava em pé de guerra. Especificamente, os subúrbios de Paris e das maiores cidades, povoados de jovens desempregados e com origem imigrante. São árabes, magrebinos, africanos de ex-colônias, antilhanos, berberes, todos imigrantes sob o manto da civilização francesa e Estados pós-coloniais como Marrocos, Tunísia, Gana, Costa do Marfim, Argélia, dezenas de ilhas caribenhas e do Pacífico. Milhares de carros incendiados, 10 anos depois da última explosão de ódio, centelha incendiária cujo pavio estourara em 1995.

Não por acaso, depois que a periferia africana da França “cosmopolita” explode e sacode, os movimentos populares e sindicatos da terra de Zola e Foucault se enchem de coragem, deixam de flutuar como nabos à beira da sociedade pós-industrial, e partem para defesa de seus direitos. Ganharam na greve geral contra as privatizações em ’95 e 96, assim como saíram vitoriosos nas greves e bloqueios da juventude contra o fim da lei do 1º emprego.

Voltando aos subúrbios quentes, por ironia da história, estes mesmos jovens são potenciais soldados de Regimentos de Páras, os mesmos que ameaçavam saltar sobre Paris, fuzilar a De Gaulle e retomar a Argélia à bala e tortura. Se vale escrever Nota de análise sócio-política entreverada com futebol e cinema, três filmes retratam literalmente o que minha mente gosta de fazer lembrar aos que sempre querem esquecer. O levante e a ira dos subúrbios quentes está num filme chamado La Haine, O Ódio (1995) – propositadamente rodado em preto e branco, direção de Mathieu Kassovitz. O dos pára-quedistas querendo saltar sobre a sede da civilização francesa é a primeira versão de O dia do Chacal, de Fred Zinnemann, de 1973. O outro, este é tão clássico quanto Argentina X Brasil em Copa do Mundo. É o épico e divino A Batalha de Argel, de Gillo Pontecorvo, produção italiana de 1965.

Toda esta volta, foi para fazer uma cruel ironia. Alguém imagina carrascos como o coronel pára-quedista Jacques Massu esgoelando a Marseillaise a cada ataque de Henry ou jogada genial de Zidane?! E os veteranos da OAS, aliados de Le Pen e a Front National, estarão torcendo por sua seleção?!

Hoje o time francês representa o futebol africano e árabe na Copa do Mundo. Pela lógica dialética, a França é representada pelos mesmos jovens que no anterior incendiaram a periferia parisiense. Portanto, cada gol de Zidane é uma autêntica festa no gueto!

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