11 de março de 2010, da Vila Setembrina dos Farrapos traídos e desenganados em Ponche Verde, Bruno Lima Rocha
A Organização Mundial do Comércio (OMC) autorizou o Brasil a aplicar sanções em produtos dos EUA como resposta a uma política imperial e desrespeitosa dos acordos internacionais. Entendo que isso é motivo para comemoração. Não é de hoje que o país briga na OMC e em outros fóruns globais contra os subsídios ao setor primário dos Estados Unidos e de outros centros do capitalismo. Isso se dá porque, ao contrário do que pregam em receituário, os países de economia desenvolvida admitem ser impossível sustentar a agricultura sem subsistência e também destinam bilhões em verbas estatais para financiar atividades econômicas, produtivas ou não. Infelizmente, nestas situações, sobram críticos brasileiros quando temos a rara ocasião de ver o governo se portando de forma correta. Isto é, com postura de autodeterminação e não se inserindo no mundo de forma subordinada e subalterna. Se há crítica, é pelo fato desse tipo de medida ser rara e não recorrente.
Li com atenção a longa lista divulgada pela Câmara de Comércio Exterior (Camex) contendo os produtos importados dos EUA a serem sobretaxados. Como se sabe, o valor destes itens totaliza US$ 591 milhões e o restante do valor para atingir aos US$ 829 milhões autorizados pela OMC será aplicado no setor de serviços ou propriedade intelectual. De tudo o que ali consta como importado, hoje não deve haver quase nenhum produto que não possamos produzir em escala considerável. Aquilo que consumimos e não alcança nossa produção, como o trigo, teríamos outras fontes de abastecimento. Ao mesmo tempo, é nestas horas que percebemos nossa vulnerabilidade diante de um espelho torcido. Já tem “especialista” alertando para uma possível pressão inflacionária vinda da sobretaxa de produtos que podemos ou fazer aqui, ou comprar de países vizinhos (como o trigo argentino e uruguaio). A retaliação em termos de balança comercial tampouco implica em risco. O Brasil importa apenas 13% de seu PIB e exporta em volume proporcional, na ordem de 14% do que circula de riqueza aqui. Já o volume de exportações dos EUA para o mercado brasileiro representa apenas a 2,5% do que a potência imperial vende.
Um Estado com a pretensão mundial do Brasil deve comportar-se como tal. Era de se esperar uma reação imediata dos EUA, mas a mesma foi declaratória, e por enquanto não belicista. Caso venha a sair uma solução negociada, esta será fruto da postura firme de nosso país em cumprir a resolução da OMC e não em continuar cedendo em uma relação de trocas injustas. Ou seja, este não é um problema comercial, mas sim da política internacional. Está aberto o precedente para outras batalhas brasileiras, ou do bloco latino-americano, no cenário mundial. Portanto, a simples decisão de partir para a ação de retaliar em torno do preço do algodão, como parte da política externa brasileira contra os preços praticados e as condições de produção de gêneros agrícolas estadunidenses, é uma vitória histórica. Atenção, a vitória é sobre nós mesmos, como povo e nação que por vezes assim se assume. E, como toda possível vitória política, a mesma cobra seu preço, ainda que alto.
Este artigo foi originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat