Bruno Lima Rocha – novembro 2022

Uma das percepções que temos ao analisar o cenário internacional é que há uma boa expectativa para Brasil a partir de 1o de janeiro de 2022. Se o cenário doméstico segue complicado, o externo pode ser mais convidativo. A participação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva na Cop 27, a 27a Conferência entre as partes abordando as mudanças climáticas, organizada pela ONU e dessa vez sediada no balneário egípcio de Sharm El Sheikh reflete essa perspectiva.

O Brasil chega diferente, com um potencial de retomar acordos internacionais e conseguir se impor, no sentido de preservamos nossos biomas. Pela lógica da ação diplomática, o país poderá se comprometer com políticas de economia verde e exigir ações compensatórias.

O mundo em que vivemos: uma mirada para o norte não tão hegemônico assim

É importante observar que o mundo realmente mudou da primeira década do século XXI para a terceira. Existe uma maior fragilidade hoje na relação entre Europa e Estados Unidos. Quando da chamada Farsa com Nome de Crise (ver o livro de mesmo título deste analista), a praça bancária europeia já saiu mais enfraquecida, quebrando o Sul europeu, somada a fraude coletiva na Islândia e o despejo massivo não executado que seria realizado na República da Irlanda.

A União Europeia (UE) após o colapso do sistema financeiro do varejo e a recessão que atingiu países importantes como Itália e Espanha ficou muito debilitada diante do fator dólar e da pressão da OTAN. O advento de novos países oriundos do espaço pós-soviético, ao contrário do que parece, fragiliza a capacidade de governo de facto entre Alemanha e França. Com a saída da Grã Bretanha na sanha do Brexit, a agenda da extrema direita anglo-saxã vai ao encontro do desenho estratégico do Pentágono e da Casa Branca.

Em entrevista recente, este que escreve observou a seguinte situação. Diante da guerra russo-ucraniana com sanções e bloqueios contra a Rússia, os EUA foram maquiavelicamente geniais em subordinar a UE à sua agenda internacional mais direta, forçando a quebra dos acordos de Minsk e colocando uma guerra na Europa. Era tudo que eles precisavam para, depois do Brexit, acabar de finalizar a capacidade altiva da Europa.

A escassez de combustível fóssil na Europa e a armadilha do greenwashing político

É evidente que todos os países do planeta precisam reduzir a emissão de carbono assim como buscar soluções de energia limpa e renovável. Mas, a capacidade de reconversão energética seria também uma necessidade de recuperar o tempo perdido, iniciado com o golpe parlamentar de 2016 e a aplicação na Petrobrás do chamado Plano de Paridade de Preços Internacionais (PPI). O Pré-Sal pode ser nossa fonte de baixo custo até ampliarmos a diminuição das emissões de carbono. Não fazer isso agora, a partir das reservas de combustível fóssil nas águas ultra profundas, é absurdo.

Repito. Não explorar o pré-sal porque é poluente seria uma sandice. Mas a reconversão de energia verde é uma necessidade do mundo, e, como tal, creio que os países com a maior vocação de produzir energia limpa, como o Brasil, devem liderar esse processo. É preciso um plano nacional de reconversão energética, e o maior centro de pesquisas e de excelência que temos é a própria Petrobrás e o que restou da Eletrobrás (que pode e deve ver revertida sua dilapidação pelo Desgoverno Guedes e Bolsonaro).

Em outra entrevista, quem aqui escreve afirma a necessidade de discutir em escala mundo um fundo de compensação a ser pago pelos países já desenvolvidos e que construíram suas economias outrora e ainda industriaisi em cima daquilo que hoje seria considerado como anti-ecológico.

Já no plano doméstico, e preciso transformar a preservação dos biomas em produção científica. Não é possível que na Amazônia brasileira a maior presença de ciência aplicada seja de pesquisa japonesa (e as consequentes patentes e registros de direito de propriedade industrial), isso realmente configura um absurdo. Podemos ter grande aprendizado a partir da preservação das florestas e dessa aliança com povos originários dos países amazônicos.

Duas constatações são necessárias. A primeira é que a hipocrisia europeia e dos países anglo-saxões é indefensável e a manobra do greenwashing político é uma pressão da opinião pública destes territórios e pode constranger o desenvolvimento industrial latino-americano, africano e em parte asiático. Logo, uma política ambiental em escala mundo deve ser financiada pelos maiores poluidores garantindo as condições de vida do Sul Global.

A outra constatação é a emergência climática. Não é uma mentira construída em “agenda gobalista” e menos ainda uma hipótese a ser comprovada, como o lobby do petróleo nos Estados Unidos insistem em afirmar. Logo, esta agenda é necessária, independente das falas demagógicas e hipócritas de certas lideranças mundiais. Portanto, é dever da diplomacia brasileira propor saídas e buscar a concertação partindo das relações Sul Sul. Talvez a dimensão doméstica brasileira não permita tanto, mas indo além da eterna timidez e precaução excessiva de Lula e sua equipe, se trata realmente de algo a ser feito no curtíssimo prazo.

Bruno Lima Rocha é cientista político, jornalista e professor de relações internacionais

(@blimarocha / blimarocha@gmail.com / estrategiaeanaliseblog.com)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *