A campanha de Harris conseguiu ir ainda pior. Vale comparar, o desastre de 2024 repete o de 1968. Não tem os bombardeios contra o Vietnã sendo televisionado, mas o genocídio palestino em rede social (e tempo real) atingindo a juventude votantes nos democratas.

Novembro de 2024 _ Bruno Lima Rocha (@blimarocha)

Trump ganhou e avançou em terreno eleitoral da classe trabalhadora estadunidense. Não apenas a maioria branca com baixa escolaridade e na AmeriKKKa profunda, mas também outros setores. A centro-direita representada pelo Partido Democrata diminuiu sua incidência entre afro-americanos e latinos. Vale observar alguns dados com mais afinco.

Conforme publicado na revista Movimento, em artigo intitulado “Algo fundamental deve mudar nos EUA” (de autoria de Neal Meyer, publicado originalmente em The Call), trago aqui duas passagens que demonstram como as bases do Partido Democrata foram corroídas pela percepção (correta) da perda de capacidade salarial das maiorias (ou da maior parcela de “amplas minorias”). vejamos:

“Os ganhos salariais reais obtidos durante o governo de Trump superaram o crescimento salarial durante o governo de Biden. Isso não se deve às políticas de Trump, mas a maioria das pessoas não vê as coisas dessa forma.”

A campanha de Harris conseguiu ir ainda pior. Vale comparar, o desastre de 2024 repete o de 1968. Não tem os bombardeios contra o Vietnã sendo televisionado, mas o genocídio palestino em rede social (e tempo real) atingindo a juventude votantes nos democratas. Eis os números do artigo citado:

“A campanha perdeu muito mais terreno com a base tradicional dos Democratas entre os trabalhadores racializados. As pesquisas de boca de urna sugerem, por exemplo, que Harris obteve cerca de 52% do voto hispânico, em comparação com cerca de 65% para Biden em 2020 e 71% para Hillary Clinton em 2016. Em 2020, Biden conquistou 55% dos eleitores que ganham menos de US$ 50.000 e 57% dos que ganham entre US$ 50-100.000. Os números de Harris? 47% e 46%, respectivamente. Ela inverteu os números de Biden entre os que ganham mais de US$ 100.000: Biden obteve 42%, Harris 51%.”

O voto de classe era uma clivagem razoavelmente estável nos Estados Unidos, era. Por mais que nos deixe indignados e indignadas saber que latino-americanos e afro-americanos votaram em um escroque racista e canalha, as contas chegam no final do mês. E há um enorme esforço de “normalização da estupidez” através das redes sociais e da “guerra cultural conservadora”, sabe-se lá o que isso significa em termos concretos.

No cenário doméstico do Hamburguestão, não tem como Trump atender aos milhões de eleitores que para ele migraram de 2020 para cá. Menos ainda canalizando a liberação dos freios do capital em uma condição quase absoluta. Muito se debate sobre as projeções geoestratégicas do Império: aliviar com a Rússia; tentar afastar Kremlin de Pequim (algo impossível) e reproduzir a metástase da extrema direita republicana pelas periferias do Ocidente, com degeneração acelerada na América Latina. Podemos estar diante de uma autocracia dos bilionários no coração do Império, uma Era Reagan-Bush sem travas e desavergonhada. Pode ser.

KAMALA HARRIS E SEU MUITO TRISTE DISCURSO EVASIVO DE DERROTA

Em plena Howard University, celebrada instituição de ensino da juventude afro-americana, a ex-candidata e ainda vice-presidente dos EUA pelo Partido Democrata deu mais um sinal patético do que é o “progressismo evasivo” da Gringolândia. O seu discurso de reconhecimento da derrota foi simplesmente lamentável.

Kamala Harris discursando é uma mescla de legalismo babaca diante de um criminoso convicto e a hipocrisia democrata de sempre. Os gringos decidiram por um canalha ao invés de um bando de inúteis, fato não dito. Depois de um conjunto de nulidades enveredou pela micropolítica. E não disse uma palavra em melhorar a qualidade de vida, aumento de salários e garantia de direito a alimentação, moradia, transporte e aposentadoria. Enfim, está à direita do keynesianismo.

Coleção de bobagens e inutilidades proferidas por Kamala Harris foi típica de uma fração dirigente em ascensão. Discurso elitista e nada de reivindicação popular. Não falou a palavra sindicato em nenhum momento. Depois falou de “lei e ordem” na forma de auto ajuda em sua experiência como procuradora em San Francisco e na California. Quanta bobagem. Nada sobre encarceramento em massa, nada contra a privatização das prisões; depois fala de historinha tipo fábula.

“Otimismo, fé, vocação de serviço e luz”….MUUUNNNN RAHHHH. Kamala Harris, ex candidata, vocacionada para ser “coach”. Que vergonha, sequer citou a defesa necessária do Obama Care para a população mais pobre. Enfim, a AmeriKKKa se posiciona entre o voto popular branco e pobre em bilionários canalhas ou a “opção progressista” que ajuda a destruir a Argentina e o Equador e financia o genocídio palestino.

O IMPERIALISMO DEMOCRATA, O VOTO CASTIGO EM TRUMP E O ESCROQUE RECONDUZIDO AO PODER

Como observamos em outros momentos, os limites de governos liberal democratas com tímidas políticas de corte social-democrata estão cada vez mais visíveis. No caso dos EUA, para seu público doméstico, o Partido Democrata perdeu onde jamais perdera desse jeito, de forma tão escancarada: no voto sindical. A central estadunidense AFL-CIO, não tirou apoio para Kamala Harris. Tampouco tiveram prévias na interna, sendo Biden candidato para a reeleição por uma canetada. No início do governo Obama – no primeiro semestre de 2009 – a Superpotência vivia a dor de cabeça pós “farsa com nome de crise” da quebradeira do sistema financeiro através da especulação imobiliária e a venda de derivativos tóxicos. Ocorreram então dois fenômenos.

Barack Hussein (sim, Hussein, de origem paterna, um economista queniano com família islamizada) tentou promover uma inflexão econômica e deixou como legado, além da criação de empregos precários (tal como Biden), o ObamaCare, um sistema de saúde menos cruel. No plano de repressão interna, seus oitos anos foram campeões de deportação de imigrantes ilegais (mais de 85% de origem latino-americana) e também, construiu a nova política imperial da Lawfare, o famigerado Projeto Pontes, que deu origem na Lava Jato.

Com essa ferramenta e acessórios, obteve vitórias importantes contra nós, nosotros y nosotras da América Latina: junho de 2009, golpe de Estado em Honduras; junho de 2012, golpe de Estado no Paraguai e abril de 2016, golpe de Estado no Brasil. Tem mais, em novembro de 2015 Mauricio Macri ganha na Argentina alimentado por uma Operação de Lawfare, através de um operador sionista e da CIA, o procurador Alberto Nisman. Curiosamente este apareceu “suicidado” em janeiro daquele mesmo, em seu apartamento em Puerto Madero, Buenos Aires capital.

Democrata ou Republicano, o Império é imperialista com os outros, especialmente com o chamado Sul Global. E a projeção de poder para a América Latina não pára. A diferença é que os estadunidenses, incluindo o voto afro-americano e latino, resolveram punir ao Partido Democrata por sua timidez e platitude elitista. A “punição é o sofrimento coletivo” elegendo novamente um escroque, criminoso e canalha para sentar na cadeira de presidente do país que ainda é o mais poderoso do mundo.

Do México à Patagônia temos muito o que fazer e lembrar. O golpe de 1964 no Brasil foi dado pelo Partido Democrata. Já a Operação Condor e os golpes de Chile, Argentina e Uruguai foram aplicados por Nixon, republicano, e dado sequência com Gerald Ford. A política de terra arrasada na América Central foi perpetrada pelo pior dos anos Reagan. O Plano Colômbia e o reino da DEA no México são obras macabras de Bill Clinton, democrata. Qualquer esquerda que se veja como tal não pode nutrir nenhuma empatia ou sinal com proximidade com ambos partidos imperialistas.

Sempre dependemos de nós mesmos e é possível pensar em alguma aproximação com a classe trabalhadora (e marginalizada) latino-americana no seio da AmeriKKKa. No cenário doméstico estadunidense, o voto castigo na centro-direita liberal democrata é um gesto de raiva. O afastamento e nova desilusão com os escroques e canalhas virão antes que se imagine.

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