09 de março de 2012, da Vila Setembrina, Bruno Lima Rocha
A chiadeira de militares da reserva, incluindo oficiais generais, diante de alguns possíveis avanços da Comissão da Verdade, não espanta. Pode até indignar aqueles que imaginavam tratar-se de questão superada– uma falsa impressão – mas não surpreende quem acompanha o posicionamento de veteranos das três forças e seus discursos após a Abertura e a redemocratização.
É consenso entre a tigrada, o pessoal dos porões e os comandantes do Estado de Guerra Interna afirmar de que no Brasil tanto não houve tortura, como os denunciantes o fazem em causa própria.
Tamanho absurdo materializa-se como um pacto castrense, dirimindo de responsabilidade os operadores e mandantes de crimes de lesa humanidade, portanto, não prescritíveis.
O Brasil tem uma trajetória conservadora e pactuante nos temas da política. Assim fomos desde nossa fundação como Reino Unido com a metrópole lusa e depois como Império rodeado de repúblicas.
O silêncio em relação ao criminoso “processo civilizatório” até hoje existente nas fronteiras agrícolas é o mesmo que tolera a tortura e a violação de direitos humanos em dependências policiais.
É esta a gangorra a ser interrompida, a mesma que recrutara os “brucutus” da Invernada de Olaria e dos Esquadrões da Morte de Rio e São Paulo para as equipes de repressão política.
Se de um lado a inteligência militar mandara oficiais para West Point e reproduzira um ambiente de produção intelectual conservadora na Escola Superior de Guerra, de outro a montagem do Sistema cujo mentor (Golbery do Couto e Silva) reconhecera haver: “criado um monstro!” contou com os piores elementos das delegacias de ordem política e social das polícias estaduais.
Negar que o Estado brasileiro deliberadamente torturou, matou, cometeu desaparição forçada, violentou, liberou seus chacais para saque e botim de bens de opositores é negar a história do país.
Seria o mesmo que ex-nazistas negarem o horror dos campos de concentração ou esperar transformar ex-agentes da KGB (como Vladimir Putin e Cia.) em notórios democratas.
Infelizmente esta mesma negação do óbvio faz com que tenhamos aprovado a Anistia para criminosos oficiais e, ao contrário das demais democracias do ConeSul, sermos o país que menos puniu a seus antigos algozes.
No Chile, Argentina e Uruguai a punição chega a colaboradores civis das ditaduras, ultrapassando a teoria dos dois demônios e tentando passar a história a limpo.
O Estado brasileiro deveria banhar-se em humildade e repetir os bons exemplos de nossos vizinhos.
Este artigo foi originalmente publicado no blog do jornalista Ricardo Noblat.