Bruno Lima Rocha, 18 de fevereiro de 2009
No domingo 15 de fevereiro a população da Venezuela experimentou seu 15º pleito eleitoral em dez anos. Naquele país, o voto é opcional e a ida às urnas tanto pode ser para eleger cargos executivos e legislativos, como para temas de fundo, alterando a ordem constitucional do país ou pondo à prova o presidente eleito. Dessa vez, ao contrário do plebiscito de dezembro de 2007, a proposta de Hugo Chávez saiu vitoriosa.
Até o momento de fechar este artigo a totalização final ainda não havia sido divulgada; portanto trabalho com os 99,75% divulgados pelo Conselho Nacional Eleitoral na tarde de 17 de fevereiro. Foram 54,86% para o SIM a possibilidade de candidatura à reeleição sem limite e 45,13% para o NÃO. Os totais representam um esforço mobilizado das duas partes. O Comando Simón Bolívar, coalizão comandada pelo PSUV governista, somada a legendas como UPV, PPT e PCV, obteve mais de 6.319.636 de votos. Já os partidos que encabeçam o Comando Angostura, capitaneados pelo Podemos, Primero Justicia, Nuevo Tiempo, dentre outras siglas menores, além do que restou dos históricos partidos Ação Democrática e Copei, obtiveram mais de 5.198.996 votos. Já os nulos não passaram de 206.419. A marca elevada seguiu sendo a da abstenção, chegando a 30,08% do total de 16.949.000 pessoas aptas a votar.
É interessante notar que o maior esforço do governo foi o de mobilizar eleitores chavistas. Em 2 de dezembro de 2007, quando houve o plebiscito da Reforma Constitucional, Chávez perdeu por 100.000 votos. Naquela ocasião, mais de 2.800.000 não foram a votar, equivalendo a cerca de 70% dos eleitores. Desses, ao menos 1 milhão e meio eram votantes seguros de Hugo Rafael. Dessa vez a lição de casa foi aprendida, concentrando a mobilização nos bairros de renda mais baixa.
Este é o paradoxo da nova forma de participação de tipo plebiscitária. Na 4ª República (1958-1998), quando vigorava o Pacto de Punto Fijo, havia 35% de venezuelanos em idade de votar que jamais foram registrados. Agora, segundo o CNE, não passam de 6% os inaptos ao voto. A barreira de participação está no paradoxo de mobilizar para votar justamente os setores mais pobres, público alvo das políticas sociais do governo. Em 2007, o clima de “já ganhou” e a profusão de emendas confusas, catapultou a rejeição parcial da proposta e fez com que os cidadãos não saíssem de casa. A diferença mínima que marcou a derrota assustou as forças que compõem o SIM. Em sua meta, elegeram a apatia como inimiga interna e diminuíram a abstenção de 70% para 30%. Ainda assim o número segue alto para a “democracia de massas” promovida desde o governo.
Com o resultado sendo admitido pela oposição, o governo de Chávez e o movimento bolivariano ganham fôlego e tempo para se dedicar aos problemas internalizados no Processo. Como afirmei no último artigo sobre a Venezuela, lá se dá uma disputa simultânea. Ao derrotar pontualmente as antigas forças políticas, os bolivarianos terão dois anos para outra refrega, esta interna. Para além da mobilização plebiscitária, a contenda se dá sobre o projeto de país, incluindo a transferência de parte das decisões fundamentais para a base da sociedade. Mas, cabe uma ressalva. Coordenar o protagonismo popular com o peso de uma liderança carismática é um desafio que até hoje nenhuma sociedade conseguiu realizar.