04 de agosto de 2011, da Vila Setembrina, Bruno Lima Rocha
A polêmica que se dá na interna do Partido dos Trabalhadores, a respeito do problema de filiação em massa e dos possíveis filtros necessários (ou não), para ascender na representação partidária reflete um tema de controle político. Não se trata absolutamente de problema novo. Sempre foi tensa a relação entre massificar o número de filiados e qualificar a participação política. Tentar impor etapas de formação antes de garantir plenos direitos e deveres pode ser visto como uma possível barreira para novos adeptos.
Para um partido como o PT, que em sua origem se organiza como um guarda-chuva de correntes de esquerda anti-estalinistas, a filiação direta sempre se contrapôs ao poder das tendências internas e suas massas críticas organizadas. Na prática, está em jogo o ato de premiar a militância orgânica e com formação política ou fortalecer o papel de dirigentes, reforçando o conceito de oligarquias partidárias.
Trata-se de um paradoxo. O aumento dos membros nominais de um partido não implica em nenhuma garantia de engajamento, é justo o contrário. Considerando o senso comum como uma negociação permanente entre a sobrevivência e a condensação das idéias dominantes, temos um problema de doutrina político-partidária. A presença de membros plenos de direitos e deveres, mas que não são capacitados a atuar em nome do coletivo ao qual pertencem, abrem um flanco muito perigoso. Essa maioria despolitizada facilita a reprodução dos piores aspectos da cultura política brasileira, como o caciquismo, patrimonialismo, clientelismo e fisiologismo. De tão forte, o fenômeno ganhou uma denominação de uso comum na militância. Massa mobilizada sem politização é chamada de “boiada”. Triste notícia, a prática é antiga.
Evitar a conformação de “boiadas” deveria ser preocupação permanente, ao menos das esquerdas (em sentido amplo) existentes no Brasil. Ao contrário do que possa parecer, aumentar a participação é inversamente proporcional ao ingresso de membros sem condição de militância. O militante tem de ser alguém minimamente dotado de informação e conceitos de modo que possa emitir opinião e posicionar-se a respeito de temas de envergadura, tanto para a conjuntura como para as instâncias internas da organização. É uma equação simples. Não havendo militância, a vida partidária se esvazia e prevalece a lógica da concorrência eleitoral e a simples partilha de cargos e poder.
Quando a maioria que ingressa é pouco ou nada politizada, os mandos pertencerão aos dirigentes de sempre.
Este artigo foi originalmente publicado no blog do jornalista Ricardo Noblat