A juíza Patrícia Lourival Acioli deparou-se com os limites físicos entre os poderes reais e os formais. No mundo da vida, a morte foi ao encontro da subordinação do formal para o brutal. Nenhuma novidade para as populações carentes de Rio e Grande Rio. A metrópole fluminense segue em seu processo de “mexicanização”.   - Foto:correaneto
A juíza Patrícia Lourival Acioli deparou-se com os limites físicos entre os poderes reais e os formais. No mundo da vida, a morte foi ao encontro da subordinação do formal para o brutal. Nenhuma novidade para as populações carentes de Rio e Grande Rio. A metrópole fluminense segue em seu processo de “mexicanização”.
Foto:correaneto

 25 de agosto de 2011, da Vila Setembrina, Bruno Lima Rocha

O assassinato da juíza Patrícia Acioli, de fronte à sua casa no bairro de Piratininga, região oceânica de Niterói (estado do Rio de Janeiro), traz à memória situações que, como por mágica, imaginávamos superadas após a espalhafatosa “Guerra do Rio” em novembro de 2010. Ledo engano. Ao mesmo tempo em que é injusto marcar todos os membros das polícias fluminenses como corruptos e lenientes, é de uma perigosa e cúmplice inocência supor que problemas de fundo – como os para-policiais (milícias) – foram superados. Um conceito surge com força para explicar o tamanho do fosso, e este é o de insulamento e autonomia de corpos burocráticos.

 Se o problema inicial do Estado no Rio de Janeiro, seria retomar o controle de territórios urbanos e metropolitanos, tomados (ou entregues) para as redes de quadrilhas do varejo do narcotráfico, o desafio revela-se ainda maior. Os “comandos”, embora tenham adquirido certa capacidade operacional, revelam-se uma ameaça menor às garantias de um Estado Democrático do que a autonomia de corporações burocrático-policiais. A analogia do momento seria uma necessária “lavagem intestinal” por dentro das polícias, Civil e Militar, além do Corpo de Bombeiros e do Departamento Penitenciário.

Fazer a limpa de uma instituição por dentro, implica reinventá-la, modificar não apenas seu modus operandi, mas a origem deste, o modus vivendi. No caso brasileiro, significaria acabar com o subemprego policial e modificar seu universo de representação ideológica. Uma delas é o uso indevido da brutalidade. Quase sempre associam a idéia de direitos humanos com complacência para a criminalidade. A associação subseqüente é a da violência policial com a intolerância na defesa da sociedade. Nada pode ser mais falso.

O aparelho policial que age para além da lei, termina-o fazendo em causa própria. Se toda instituição tende a criar uma cultura interna, com regras reais de conduta para além dos códigos que vêm a público, essa característica exacerba-se por dentro das polícias. Daí a compreenderem-se como vítimas de uma pirâmide social injusta e hipócrita, e buscarem a sobrevivência e certa ascensão a partir do domínio sobre setores ilegais da economia e populações marginalizadas, não custa muito.

A execução da magistrada comprova o óbvio. A “limpeza” das polícias do Rio é uma necessidade primária, algo estruturante para a ação dos governos fluminenses e passa muito longe da pirotecnia dos preparativos publicitários para os grandes eventos internacionais.

Este artigo foi originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat

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