22 de janeiro de 2016, Bruno Lima Rocha
O debate comunicacional é um problema permanente e passa por um período crítico na América Latina. Crítico porque de forma correta os donos de meios são caracterizados como bastião ideológico tanto da direita como dos capitais transnacionais. Para comprovar a tese, basta observar o papel da SIP (Sociedade Interamericana de Impresa), do GDA (Grupo Diários América) e ver a atuação dos maiores conglomerados de comunicação social e entretenimento midiático em cada um de nossos países.
O período também é crítico porque de forma equivocada, a centro-esquerda ainda insiste na tese leninista da comunicação social como agitação e propaganda da direção ou governo de turno e não para conformar um espaço público dos debaixo. Como para esta gente ideologia ainda é, em grande parte, um dilema de falsa consciência, logo não espanta tal equívoco ou posição autoritária e conservadora. Na ausência de um espaço público das esquerdas e do movimento popular, simplesmente não temos onde e com quem debater. Pela belicosidade que marca o pensamento à esquerda desde o racha da 1ª Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), associamos o debate a uma disputa de ideias para convencimento da audiência (subordinando as audiências) e para desconstrução da validade das ideias dos adversários políticos. Se em termos de política de base isso ocorre, o mesmo fenômeno é devastador em termos de grandes públicos receptores, ainda mais falando para quem está desorganizado.
Como disse já venho afirmando aqui, é necessário garantir ou ao menos brigar de forma estratégica – logo de longo prazo – para constituir espaços não monetários e onde possamos reproduzir como modelo em pequena escala o que queremos como sociedade e suas formas de acumulação de força para atingir este lugar. Se o modelo de debate em pequena escala é uma insana e sectária disputa por direções e hegemonias reais ou fictícias, logo, estamos reproduzindo – novamente – a pior tradição leninista com as práticas mais tolerantes com a convivência pacífica com o inimigo de classe. O pior dos mundos resultou nisso mesmo. Uma relação ambígua com o inimigo interno (na busca incessante pela tal burguesia nacional progressista) e a subordinação do movimento popular para o governo de coalizão da direita para garantir a tal da governabilidade.
Se em algumas pautas a agenda social melhorou, na democracia na comunicação foi tudo ao contrário. O exemplo brasileiro é entre o péssimo e o horroroso, mas mesmo onde houve mais avanços materiais – como na Argentina e na Venezuela – a subordinação e o atrelamento a Linha K na primeira e aos chavismos da segunda – matam na raiz a riqueza e a potência da comunicação popular com democracia de base como um espelho de um espaço público horizontal entre os diversos setores oprimidos e explorados. Não por acaso, a maior parte destes setores carrega no lombo a herança maldita do colonialismo e precisa construir e reconstruir as culturas do povo a todo o momento.
Quem amarra os fragmentos do povo e das classes subalternas é justamente a capacidade de comunicar e aglutinar, estando de portas abertas as mídias massivas sob o controle popular. O tecido social é a base do embrião de poder popular, desde que combine vida cotidiana, atividades associativas e lutas diretas através de sujeitos coletivos. Esta combinação de realização organizativa e reivindicação de direitos passa pelo poder das pessoas comuns e desorganizadas e como tal só pode se dar de forma difusa através da comunicação social em escala massiva, mas de forma autogestionária.
Infelizmente estamos anos luz desta realidade, mas temos saídas – múltiplas – de forma parcialmente consolidada ou embrionária. Esta frente de luta popular não pode depender dos governos de turno embora esteja visceralmente ligada – em contraposição – aos níveis decisórios do aparelho de Estado. Para isso é preciso bloquear a sedução e a cooptação ideológica de delegados e negociadores. Não é aceitável que a cada audiência ou recepção com o sub do sub do sub do quarto escalão de um ministério percamos um ou mais militantes para a sedução ideológica de uma bandeja prateada de cafezinho ou água gelada com tapinha nas costas e promessas protocolares nunca cumpridas. É preciso sempre lembrar que do lado de lá do balcão está o representante do inimigo e não apenas um burocrata equivocado ou carreirista de plantão. Se alguém em posição de coordenador ou coordenadora esquecer desta obviedade, daí o controle coletivo e a cobrança política tem de fazer esta dura lembrança.
A política do povo em luta é cheia de armadilhas. Audiência demais e peleia de menos é o método mais eficiente para gerar mais um traidor de classe, ainda mais com microfone de rádio na sua frente.
Sigo com o tema mais adiante.