13 de janeiro de 2010, da Vila Setembrina, Bruno Lima Rocha
O governo de Luiz Inácio segue alguns padrões. Um deles, de equilíbrio de forças e a tentativa inglória de fazer mudanças consideráveis sem desagradar muito sua base aliada. No final do ano, especificamente a partir da assinatura do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) em 21 de dezembro, a chiadeira da direita governista indicara o grau de fratura e incoerência. O conflito surgido com as medidas que consideram os Direitos Humanos em sentido ampliado, expõe concepções divergentes de democracia, ultrapassando o tema da memória, verdade e justiça da ditadura. Seguindo seu próprio padrão de alianças, não podia dar em outra coisa.
Percebem-se duas formas de materialização do bloco do governo. Uma, na composição no Congresso, onde uma parcela do outrora Centrão da Constituinte que o PT se recusou a assinar dá sustentação ao mandato do ex-metalúrgico. Como parte considerável desta mesma base apoiara a ditadura, tudo o que se relacionar ao tema será no mínimo constrangedor. O maior exemplo foi no apoio para a permanência de José Sarney (PMDB-AP) na presidência do Senado. No ápice da luta, o Planalto ordenou a bancada do PT que se aquietara, levando o senador Mercadante (PT-SP) a desmentir a si mesmo em público.
Outra forma de composição de forças está na divisão de poderes entre as pastas de áreas parecidas ou iguais, mantendo a assimetria no acesso a recursos, mas sinalizando um modelo aparentemente salomônico. Na defesa do PNDH, onde se retoma o intento de revisar a Lei de Anistia para criminosos de lesa-humanidade, o ministro da Justiça Tarso Genro e o secretário especial de direitos humanos, Paulo de Tarso Vannuchi, fizeram a frente. Do lado oposto da trincheira, estão o titular da Defesa e ex-ministro de FHC Nelson Jobim, solidário com os comandantes das três forças que se recusam a admitir a culpabilidade castrense e dos oficiais envolvidos diretamente na tortura. O próprio recuo de Lula, ao revisar o decreto afirmando que houve “conflito” e não repressão política caracteriza o tipo de relação na interna do governo e indica para que lado pende a balança no final das contas.
Este mesmo padrão se repete em setores estratégicos, como na agropecuária e na educação. De um lado os agentes econômicos têm seus representantes, como o setor primário com o arenista Reinhold Stephanes ou nas comunicações com o ex-correspondente da Voz da América Hélio Costa. De outro, nos mesmos temas, a “esquerda” se reconhece com Guilherme Cassel (reforma agrária) ou Franklin Martins (comunicação do Executivo). Na ausência de metas generalistas programáticas, o governo Lula se equilibra entre aprofundar o modelo de país e atender reivindicações de maneira episódica, desde que não fira interesses fundamentais de aliados.
As metas de longo prazo são atravessadas por disputas de fundo, que estão além das conveniências ou da necessidade de ocasião do governo. Daí a ter divergências explícitas, fatos políticos midiatizados a exaustão, é um pulo. Como ter disciplina pública entre ministros se o que os unifica é a condição pontual de gerirem parcela distinta do orçamento? A única unidade entre aliados de Lula se resume ao reparto de prebendas e relações de clientela. Nos demais temas, cada um por si e o presidente com a maioria dos apoiadores de ocasião.
Este artigo foi originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat