10 de junho de 2010, da Vila Setembrina de Farrapos derrotados em uma guerra pela metade, do Continente de São Sepé e Lanceiros Negros entregues à morte na Chacina de Porongos, na Liga Federal de Charruas tombados pelas costas em Salsipuedes, Bruno Lima Rocha
No início desta semana, indicado pela universidade onde leciono, tive a oportunidade de debater ao vivo um interessante problema político. A ocasião se deu em um programa radiofônico matutino, tipo mesa redonda, em relevante rádio AM da Região Metropolitana de Porto Alegre, localizada no Vale do Rio dos Sinos. Na companhia da bancada estavam o âncora e dirigentes partidários de um rico município com raízes teuto-brasileiras. O tema do debate, “a relevância ou não de se votar em candidatos da região onde se vive”, aparentemente remetia para a camisa de força de uma cultura política localista e paroquiana. Se a prosa girasse em torno do senso comum, tudo não passaria de pragmatismo e anúncios públicos de “pré”-candidaturas. Por sorte e alguma provocação de minha parte, não foi o que ocorreu.
A conversa girara em torno de temas de fundo, tais como voto distrital (e distrital misto), oportunismo eleitoral (através de dobradinhas e relações de parentesco), verticalização de alianças e distribuição de recursos oriundos do fisco. Neste último item, concentrei o foco. Entendo que o interesse pragmático é uma forma de sobrevivência dos políticos profissionais ou dos aspirantes a tal. A noção de tribuno do povo confunde-se com a do captador de recursos, por dentro e com rubrica. Isto assim ocorre porque a retribuição da confiança em um país onde o debate estrutural é tão familiar como o futebol australiano, vem na forma de prebendas. A moeda de troca do voto, lícita e dentro da lei, é a sanha por emendas, benefícios e obras, reiterando um mecanismo injusto. Só existe essa prática porque os níveis de governo sub-nacionais (estados e municípios), não são dotados de recursos relevantes para cumprir com a função social do Estado no provimento de direitos sociais garantidos na Constituição Federal de 1988. É uma conseqüência óbvia. A ausência de um federalismo fiscal reforça o papel do intermediário com mandato parlamentar.
Como a União concentra mais de 60% do total dos recursos arrecadados em tributação e seu caixa equivale a quase meio PIB do Brasil, ou se peregrina rumo à Brasília de pires na mão e sorriso estampado na face, ou se vive a míngua. No caso dos municípios, idas e vindas às respectivas capitais dos estados também implica em brigar por repasses. Nas comitivas de prefeitos, governadores e secretários de toda ordem, encontram-se deputados defendendo sua região, ou seja, sua base eleitoral. Cabe uma digressão. Dependendo da relação e do controle dos mapas de votação, ainda cabe o termo “curral eleitoral”. Embora ainda válido como conceito, já não é generalizável. A relação de clientela de tão forte tornou-se institucional. Conclama-se a votar em quem fez ou pode fazer pelos seus munícipes ou conterrâneos. Isto não é obra do acaso. Se os recursos estivessem mais próximos dos eleitores, a capacidade de pressão da sociedade organizada estaria em menor desvantagem. Na prática, qualquer estrutura federalista aumentaria o poder do povo perante os adversários, até porque o alvo da disputa se torna visível. Talvez por isso nunca venha a ocorrer.
Pude fazer todas estas críticas e os presentes reagiram com sobriedade. Deixei explícito que o papel deles, como dirigentes políticos em ano eleitoral, é aplicar o calendário de resultados. Já o papel da ciência política (ou politologia, termo que prefiro) é debater estrutura, forma e conteúdo da organização do poder, indo muito além da corrida de obstáculos ou dos fatos consumados.
Este artigo foi originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat