16 de novembro de 2011, de São Leopoldo, Anderson Santos (editor), Dijair Brilhantes e Bruno Lima Rocha
Nem esta coluna, nenhum jornalista brasileiro, muito menos espanhol, inglês ou de qualquer outra parte do mundo imaginava que isso ocorreria. Dava-se como certo que em 2012, provavelmente após os Jogos Olímpicos, que o principal jogador do futebol brasileiro iria atuar na Espanha, fosse Real Madrid ou Barcelona.
O Santos Futebol Clube, que já teve um timaço com nomes como Gilmar, Pepe e o “Rei” Pelé; já contou com Robinho e Diego em grande fase; com dribles, pedaladas e jogadas de grandes nomes do futebol brasileiro e o maior nome da história do futebol acaba de, novamente, fazer história.
2011 pode marcar não só o ano do primeiro título de Libertadores pós-Pelé (68 anos depois) ou de uma possível e magnífica vitória sobre o incrível time do Barcelona no Mundial de Clubes. Luis Álvaro de Oliveira Ribeiro e sua gestão podem entrar para a história do futebol brasileiro ao não só renegar propostas de grandes clubes europeus, como manter o maior de nossos talentos por um tempo inimaginável, ao menos, até os 23 anos.
Na última quarta-feira, dia 9 de novembro de 2011, o presidente santista anunciou que o atacante Neymar havia renovado contrato com o Santos até a Copa do Mundo FIFA 2014 – como sempre lembramos, a Copa é deles (FIFA, Blatter, Havelange e cia.) e ninguém tasca, nem os tiram do nome oficial.
A entrevista coletiva foi destaque na imprensa mundial, pois era algo que ninguém esperava, principalmente quando a sua contratação pelo Real Madrid era dada como certa devido a uma série de testes que o atacante teria feito em companhia do diretor médico do time da capital espanhola. Os sites esportivos de lá ficaram ainda mais surpresos; os torcedores, em seus comentários, ficaram “revoltados” com a negação.
O mandatário santista disse que ligou para os presidentes de Barcelona e Real Madrid para comunicar a renovação. Segundo ele, o telefonema era só para manter um bom relacionamento, já que ambos sabiam do interesse do Santos de permanecer com Neymar. No momento em que o craque vive o melhor momento de sua carreira, em que está entre os 23 melhores jogadores do mundo, em anúncio realizado pela FIFA no mês passado, o Santos faz o que Neymar costuma fazer, uma grande jogada.
O mito
No ano passado, o camisa 11 santista negou o Chelsea (Inglaterra) e este ano, se tudo se confirmar, renega qualquer outro clube do mundo por, pelo menos, mais três anos. Vale lembrar que o responsável pela carreira do jogador é o seu pai – apesar de ser agenciado por Wagner Ribeiro, que já foi intermediário de Robinho e Kaká. Entre a opinião de todos que ele só poderá ser o melhor do mundo jogando na Europa, optou ficar ao lado da família, com o filho Davi Lucca nascido este ano contando muito para esta decisão.
É claro que para além das palavras do presidente Laor – que já se lançou à reeleição para o ano que vem – tem-se também toda a conjuntura econômica brasileira, que permite fazer parcerias para pagar um salário de mesmo nível que em qualquer lugar do mundo. O valor da moeda, mesmo com algumas quedas nos últimos meses, está numa posição boa frente às estrangeiras, com um bom valor. O Brasil é a sétima maior economia do mundo, caminhando para ultrapassar mais algumas – especialmente, as européias, continente que vive em crise.
O negócio se deu pela mudança no contrato. Neymar teria reduzido o seu vínculo de 2015 para 2014, podendo sair sem quaisquer ganhos para o clube após a Copa do Mundo – apesar de haver quem diga que, na verdade, o contrato foi ampliado até 2017, e não diminuído.
A multa rescisória, que era de 45 milhões de euros, aumentou ainda mais, apesar de não ter o valor revelado. Vale lembrar que os boatos deram conta que o Madrid oferecera isso para tê-lo no meio do ano, e poderia oferecer até 60 milhões de euros em janeiro. O Barcelona teria ofertado 53 milhões de euros para levá-lo em janeiro.
O jogador, que mais faz campanhas publicitárias no Brasil, recebia cerca de R$ 1,3 milhão de reais por mês e deve passar a receber, pelo menos, R$ 1 milhão a mais a cada 30 dias. O Santos retirou os 30% que tinha direito nos contratos do atleta.
Para variar, mesmo Neymar tem o passe fatiado e ninguém sabe como ficarão os “investidores” caso ele possa ser liberado sem qualquer ganho. 50% do seu passe pertence ao Santos; 40% pertence à DIS, braço esportivo do grupo Sonda; 5% da Teisa (Terceira Estrela Investimentos S.A.), que é formada por conselheiros do clube; e 5% ao Neymar (pai). Cogitava-se que a DIS teria negociado sua parte com o Real. O fundo de investimentos já teve rusgas com a diretoria santista por conta do meia Paulo Henrique Ganso.
Interferência estatal?
Mais um dos boatos que surgiram, assim que Laor anunciou a coletiva, dava conta de que o estatal Banco do Brasil teria ajudado para esta redefinição de contrato. A base para isso é que o presidente santista nunca negou que pediria ajuda à presidenta Dilma Rousseff para manter um “patrimônio” do futebol por aqui.
Neymar realmente é o novo garoto propaganda do BB, mas todos negam que isso tenha a ver com a renovação contratual. A ação de marketing do grupo seria visando a Copa do Mundo FIFA 2014.
Além disso, o Santos renovou contrato com outro banco – também ligado com o Governo, dessa vez no suposto caso do “Mensalão”. O BMG segue como um dos principais patrocinadores do clube até o fim do ano que vem. O clube receberá em 2012 cerca de R$ 24 milhões. O banco mineiro patrocina, seja no espaço principal, na barra da camisa ou nas mangas, muitos clubes do país, de diferentes estados e séries do futebol brasileiro. Só para citar dois: o alagoano ASA de Arapiraca (Série B) e o pernambucano Santa Cruz de Recife (Série D).
Segundo o presidente santista, o clube negocia com várias empresas interessadas em ter sua marca estampada no uniforme do clube. O calção será um espaço bem explorado pelo clube (vem mais um macacão de F1 por aí). O Santos pretende atingir os valores arrecadados por Corinthians e Flamengo, clubes de maior torcida do Brasil. Além disso, procura um novo fornecedor de material esportivo, já que a Umbro dificilmente permanecerá no clube no ano do seu centenário.
Aula de jornalismo
Algo não raro é ver dirigentes de futebol culpando a imprensa pelos seus fracassos. Mas às vezes, por incrível que pareça, os cartolas têm razão. O mandatário santista queixou-se que todas as semanas algum jornalista, ou veiculo de comunicação, colocava Neymar ou no Barcelona ou no Real Madrid, alguns acusando-o de mentiroso quando negava a venda do atacante.
Disse o presidente ter o maior respeito pela imprensa, mas sugeriu uma melhor escolha das fontes, ou revisá-las. Por mais que a busca pelo “furo” seja importantíssima, a confirmação da informação é ainda mais.
A surpreendente decisão de manter um atleta deste nível e a negação das certezas de todos até então deve servir para aqueles que gostam de cavar rumores e plantar boatos como certezas absolutas. O jornalismo, incluído o esportivo, precisa voltar a pensar na informação além do entretenimento e da audiência pela audiência. A cada fim de temporada há uma imensa quantidade de noticias (barrigadas) que acabam não se confirmando.
Mudança de rumos
Há quem diga que Neymar esteja mudando a “ordem natural” das coisas, em que grandes atletas dos países em desenvolvimento, ou subdesenvolvidos (América Latina, Ásia ou África) vão para a Europa. Isso estaria ocorrendo, ao menos, no caso brasileiro.
Não sabemos se ainda podemos “cravar” tal coisa. Continuamos crendo que este caso é uma exceção à regra. Num clube que fez todos os esforços e que, com muito profissionalismo gerencial, conseguiu contrapor também financeiramente, além de contar com os fatores familiar e passional, às propostas do exterior.
O caso do jovem Lucas Piazon, que aos 17 anos forçou sua saída do São Paulo para o inglês Chelsea no meio do ano, prova que ainda não dá para considerar a exceção como uma possibilidade de generalização.
Resta saber a partir das próximas janelas de transferência quantos jogadores de alto nível, ou em grande fase, continuarão por aqui. Quanto à volta, que isso não ocorra por falta de espaço no exterior. De qualquer jeito, o Santos entra mais uma vez na história. Ninguém peita três dos maiores clubes do mundo, Chelsea e, principalmente, Real Madrid e Barcelona em tão pouco tempo.
Nota de rodapé: O deputado federal Romário (PSB-RJ) tem razão ao afirmar que “o Pelé calado é um poeta”. Vem chumbo grosso por aí e esta coluna segue de antena ligada; aqui e no Periscópio da Mídia.