4ª, 8 de setembro, escrito na cidade de Maceió/Alagoas
Estando em Alagoas por motivos profissionais, busquei nas notícias locais a fonte inspiradora para o artigo semanal. Não foi difícil. Após comprar cinco jornais diferentes, deparei-me com algo estarrecedor. Na capa do semanário Primeira Edição da capital alagoana, edição de
É preciso louvar um repórter quando o mesmo faz um trabalho investigativo e de coragem. O texto é assinado por Josenildo Torres, e vem apresentando números absurdos. A soma dos gastos dos poderes Legislativo e Judiciário alagoanos totaliza a R$ 32 milhões ao mês. Enquanto isso os investimentos em saúde e educação são de R$ 11 milhões. A origem destes recursos vem do Tesouro Estadual e são assegurados pela regra do duodécimo. Esta norma transfere diretamente para os poderes as verbas obtidas com a arrecadação. Se e caso o Tribunal de Contas, o Ministério Público, o Tribunal de Justiça e a Assembléia Legislativa não gastarem o valor destinado, podem devolvê-los para as finanças do estado. Não é o que ocorre.
Concluo o exemplo registrando os valores mensais. Tribunal de Justiça, R$ 14 milhões; Assembléia Legislativa, R$ 8 milhões; Ministério Público, R$ 6 milhões; Tribunal de Contas, R$ 4 milhões. Valores assim fazem com que um assessor parlamentar tenha um salário base de R$ 1.945,13 enquanto os médicos antes de sua greve recebiam R$ 1.000,00.
Seria preconceituoso afirmar que o absurdo é exclusividade de Alagoas. A má impressão é ajudada pela trajetória recente de alguns nomes da política alagoana. A imagem associada ao estado quando citamos Fernando Collor de Mello, PC Farias e os irmãos Renan e Olavo Calheiros realmente não é das melhores. Mas insisto, o problema é da estrutura do Estado, em especial dos governos estaduais com presença voraz da oligarquia local. Detalhe, oligarcas estes muito mais sofisticados e capazes do que uma visão simplista tenta passar.
Não é por falta de “ilustração” que os problemas ocorrem. Tampouco seria pensável supor um conjunto de regras cuja aplicação levaria a uma harmonia entre os poderes estaduais visando o bem comum. Porque não é o bem estar coletivo a atividade-fim e sim a manutenção do status quo dos titulares destes cargos e funções dos altos mandos do Estado sub-nacional.
Tal absurdo nos remete a uma reflexão de fundo. Lendo o receituário de alguns colegas no campo acadêmico, sempre nos deparamos com saídas do tipo ideal. Cria-se um modelo adaptado de democracias consolidadas e mercado de consumo pleno. Tentamos aplicar o “modelo” no Brasil, gastando laudas e simpósios em fórmulas e regras e nos esquecemos de que a política se dá na correlação de forças.
Esta é a condição de existência de uma outra forma de gestão pública. O mandato imperativo e o federalismo fiscal são molas mestras para mudar a orientação do Estado brasileiro. Isto em nível nacional, porque nos estados é necessário um orçamento aberto e co-gerido pelos conselhos municipais e estaduais por área e setor. É certo que este mecanismo aplicado na participação de conselheiros tem muita parafernália e pouco poder de decisão. Isto decorre da ausência de dotação orçamentária nas instâncias de consulta direta. Dificilmente uma pessoa não-militante sai de casa para algo que resolva pouco ou nada. Aponte uma saída para uma dificuldade sentida de forma coletiva e a participação aumenta imediatamente. Provavelmente os conselhos não têm recursos por seu potencial agregador.
Voltando ao exemplo dado, torna-se perfeitamente compreensível a greve dos médicos de Alagoas, diante de uma situação de tamanho descalabro. Todo o funcionalismo público alagoano tem uma tradição aguerrida, bem ao oposto das práticas eleitorais. Os sindicatos destas categorias se batem no plano da política com uma cultura paroquiana e na gestão do Estado com o patrimonialismo dos altos mandos. O problema está no isolamento.
Dificilmente uma guerra com dois flancos abertos pode ser vencida. Uma saída é trazer a pauta da gestão pública do Estado para a mesa de negociações. Isto não se consegue de forma imediata e simplista. É necessário dotar a população das informações necessárias e apontar a conquista viável, mesmo que no largo prazo. Caso contrário absurdos como os narrados no texto continuarão a existir.