Discute-se neste texto o carater estratégico do saber e do fazer historiografico, a partir de conceitos como Campo, Capital e Habitus de Bourdieu.
Por Anderson Romário Pereira Corrêa.
Alegrete, fevereiro de 2009.
Um dos fundadores da Escola dos Annales (Corrente historiográfica francesa) em 1929, Lucien Febvre, ficou conhecido também pela famosa expressão “Combates pela História”. A Escola dos Annales conseguiu transformar a forma de produção do conhecimento histórico, mudando a metodologia e enfocando o aspecto econômico e social. Uma das tarefas dos historiadores então foi colocar a história ao lado das ciências sociais, na busca de instrumentos conceituais e teóricos que possibilitassem interpretar, compreender e explicar os processos e transformações das sociedades no decorrer dos tempos. A história trabalha com a construção de identidades. As identidades individuais e coletivas compõem o mundo do imaginário, do simbólico e cultural. A “manipulação” das identidades, e dos “meios de produção” desta, possibilita controlar o tempo presente e projetos de futuro. Eduardo Galeano escreveu “(…) quem não sabe o que foi não sabe o que é e nem o que poderá ser.” Em sociologia, é importante a contribuição de Karl Marx para o estudo do Campo Econômico, assim como de Max Weber para o estudo do Campo Político (burocracia). Michel Foucault destaca-se no estudo do Poder. Norbert Elias trabalha com as representações sociais. Pierre Bourdieu constrói uma teoria das praticas sociais que procura superar os determinismos econômicos e culturais e que relaciona as contradições entre sociedade e indivíduo: Campo, Capital e Habitus.
Cecília Flachsland escreve que para Bourdieu Campo é um sistema estruturado objetivamente que se impõem aos objetos e agentes; é um espaço de conflito onde os agentes lutam para acumular ou monopolizar capital especifico de cada campo (os agentes lutam também para mantê-lo intacto ou muda-lo); em cada Campo há dominantes e dominados; um Campo é um espaço autônomo regidos por leis próprias e seu funcionamento não se reduz a uma única lógica; os Campos são históricos. Os Campos podem ser econômico, político, cultural, desportivo, etc. São conjuntos de esferas de jogo. (2003:48s)
Sobre Capital, Zaia Brandão (p.05) destaca que Bourdieu queria dizer que: “O Capital especifico (cientifico, artístico, religioso…) é a moeda própria a cada campo, cuja posse é a condição para que os agentes atuem num determinado Campo e possam, em virtudes de suas jogadas acumular Capital específico.”
Habitus é um conjunto de modos de ver, agir e atuar, que, por mais que pareçam naturais, são sociais. Estão moldados pelas estruturas sociais e se apreendem. É uma mediação entre as condições objetivas e os comportamentos individuais. (Flachsland, 2003.p.53s)
O lugar onde ocorre a disputa por memória e identidade é o Campo, que de forma genérica, pode-se entender como “Cultura Histórica”. O objeto em disputa, o Capital específico em questão, é a identidade coletiva e a memória. A forma de produzir a identidade e a memória (a metodologia e teorias explicitas ou implícitas) são o “Habitus” do historiador ou do memoralista. A História é quase uma “memória coletiva”, que disputa um bem simbólico (capital simbólico) que é a identidade coletiva (auto-representação) com capacidade de auto-reprodução e acumulo em beneficio de determinados imaginários e projetos políticos sociais. Uma ruptura nos métodos e procedimentos de produção do conhecimento histórico é uma “ruptura paradigmática”. A emergência de um novo paradigma historiográfico pode contribuir para uma nova compreensão do processo histórico, da construção da identidade, da memória coletiva. Em fim, uma nova compreensão do que fomos, condiciona a imagem que temos sobre o que somos e principalmente do que queremos e poderemos ser.
Referências:
BRANDÃO, Zaia e Helena Altmann. Algumas hipóteses sobre a transformação do habitus. http://WWW.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/cgi-bin/PRG_0599.EXE/5915.PDF?NrOcoSis=16344&CdLinPrg=pt
FLACHSLAND, Cecília. Pierre Bourdieu y el Capital Simbólico.Madri, Campo de Ideas SL, 2003.
GALEANO, Eduardo. A descoberta da América que ainda não houve. Ed. URFGS.