24 de julho de 2009, do Rio Grande outrora altaneiro, Bruno Lima Rocha
O estado do Rio Grande do Sul voltou a agitar-se na semana passada. Mais dois fatos políticos elevaram a temperatura no inverno da província. A governadora Yeda Crusius (PSDB) e sua base formada por ampla coligação de partidos (PMDB, PTB, PP e PPS), outra vez mais estão no epicentro de uma crise múltipla. Vejamos os acontecimentos.
Na noite de 3ª, 14 de julho, o chefe de gabinete do Piratini, Ricardo Lied, visitou fora da hora de trabalho ao presidente do Detran-RS Sérgio Buchmann. Lied foi em companhia do delegado Luiz Fernando Martins de Oliveira, do Departamento Estadual de Combate ao Narcotráfico (Denarc). O motivo alegado seria o de avisar Buchmann de que seu filho, Fábio, estaria prestes a ser preso em flagrante por tráfico de drogas. Se o objetivo era preservar a vida do rapaz, evitando que um desfecho violento na operação policial, o próprio delegado poderia ter feito a visita. Mas, a presença de um hierarca do governo pode ter sido uma armadilha, segundo palavras do próprio Buchmann. O motivo seriam os negócios de Estado através do Detran-RS, incluindo a famosa dívida de R$ 16 milhões com a prestadora de serviços Atento S.A. que Buchmann, assim como sua antecessora demissionária, se nega a pagar.
Já na 5ª feira dia 16 de julho o Fórum Estadual de Servidores Públicos, uma coligação de dez sindicatos, convocava uma manifestação na Praça da Matriz, centro de Porto Alegre. Como liturgia política, as categorias se dirigem ao palácio de governo e entoam cantos e discursos. Quando muito se tranca a rua na frente da entrada do local, isso quando a Brigada Militar (PM do Rio Grande do Sul) não se antecipa e isola a área. Dessa vez, ao contrário da modorra de sempre, o dia começara com um fato político contundente. Cerca de 150 pessoas, todas com representação sindical ou política, inauguraram os trabalhos dando “bom dia” para a governadora à frente de sua controversa casa de dois pisos, localizada na Rua Araruama, número 806, Vila Jardim. Encontraram a chefe do Executivo ainda em sua residência, que acompanhada da filha e de crianças, foi ao portão gritar com os professores e manifestantes. O resultado foram algumas prisões por distúrbio e a capa de jornais em todo o país.
No primeiro caso, houve espionagem política dentro do próprio governo, e com grandes doses de amadorismo. Já no segundo, a falta de habilidade e a vontade de criar uma celeuma falaram mais alto. Não se admite a hipótese de que o serviço de inteligência da secretaria de segurança não soubesse do ato simbólico. Assim, só posso supor que Yeda resolveu esperar os manifestantes em casa, e confrontar-se com a maioria de professores ali presentes. Em ambas as situações a ocupante do Executivo estadual e seu entorno foram muito mal. Quem acompanha o cotidiano desta parcela do poder sabe que o ambiente político está todo desarrumado.
Epílogo (posterior a versão original que saiu no Noblat desta semana): como era de se esperar o processo de fritura ardeu em quem tinha alguma razão. O diretor-presidente do DETRAN-RS, Sérgio Buchmann, o mesmo que se recusara a pagar uma dívida impagável e que recebera a visita de uma diligência informal do Denarc e o Chefe de Gabinete de Yeda, saiu da função. Parece que ninguém resiste em funções que envolvam negócios de Estado, terceirização e tentativa de “transparência”. Por que será? Se fizermos as correlações de fatos, variáveis primárias (estilo de governo, relação público-privado, uso da máquina estatal fora de função) e indícios levantados pela PF em duas operações, ainda em andamento através de suas derivações (como na Operação Solidária, que de um inquérito, desdobraram em 13), e vamos ter respostas corretas. Agora, assume Sérgio Filomena a presidência do DETRAN-RS; veremos quanto tempo esse presidente durará.