Os membros do segmento do movimento social que fazem parte da comissão pró-conferência, sofreram e amargaram distintas batalhas regimentais e de procedimento para garantir o aumento da participação popular na mesma  - Foto:conferenciaw
Os membros do segmento do movimento social que fazem parte da comissão pró-conferência, sofreram e amargaram distintas batalhas regimentais e de procedimento para garantir o aumento da participação popular na mesma
Foto:conferenciaw

18 de novembro de 2009, de Porto Alegre, Bruno Lima Rocha

O Brasil está há menos de um mês de um fato inédito e, não por acaso, o tema é ignorado solenemente pela maior parte dos cidadãos deste país. Entre os dias 14 e 17 de dezembro, em Brasília, delegados estaduais representando movimentos populares, o Estado em seus distintos níveis de governo e parcelas dos agentes econômicos do setor, estarão discutindo a comunicação social brasileira em uma instância não vinculante. Ou seja, o que se debater na Conferência Nacional de Comunicação (Confecom, http://proconferencia.org.br) não vira lei, mas pode servir de base para mudanças estruturais no curto e médio prazo. Das várias abordagens possíveis para o tema, vejo como essencial o debate dos três sistemas de comunicação.

A Constituição assinada em 1988 prevê no Capítulo V da Comunicação Social, artigos 220 a 224, definições que não se verificam na sociedade. Explico. O texto da Carta Magna compreende que no Brasil devam existir três sistemas complementares e não rivais. Tratam-se dos sistemas privado, estatal e público (não-estatal). O primeiro diz respeito aos operadores empresariais que vêem a indústria da informação, comunicação e cultura como uma forma de dividendos econômicos, um negócio. O sistema estatal é alvo de disputa, entre fazer uma mídia dos poderes, ou pior, chapa branca; ou defender o modelo da BBC inglesa, quando o Conselho da Entidade é soberano e gestor de orçamento próprio. Já o terceiro sistema, o público não-estatal, tem sua base montada a partir da Lei 9612/98, quando se regulamenta o serviço de radiodifusão comunitária, e compreende as mídias associativas sem fins lucrativos e onde todos os cidadãos de um determinado território tenham acesso.

O calcanhar de Aquiles da mídia brasileira é a reprodução do modo de financiamento baseado na publicidade. Como em qualquer outro ramo da economia do país, o definidor da viabilidade do empreendimento não é a expertise no ramo de atuação, mas a relação com o Estado e os poderes de fato. Este conceito em economia política se chama “relações assimétricas”. O mesmo se materializa quando os grandes grupos de mídia operando no Brasil têm nos anunciantes estatais uma fonte fundamental para fechar a folha de pagamento e cobrir os custos das empresas. Estas, afiliadas na Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert) e no seu racha, a Associação Brasileira de Radiodifusores (Abra) evitam ao máximo pautar o tema do modelo publicitário oficial. A tensão se nota na hora de pôr em pauta o debate, considerando que a Abert se retira da Confecom e o governo Lula, através do ministro da pasta, Hélio Costa (ele próprio um radiodifusor), faz o possível para esvaziar a instância e não permitir que a mesma se torne referência para o setor.

Entendo que a Confecom deve traçar os moldes de um novo marco regulatório e este passa pela forma de financiamento, que se confunde com o modelo de negócio, ancorado na relação Empresa-Estado. A assimetria se nota quando os três níveis de governo investem a maior parte dos seus recursos de publicidade na mídia privada. Isto impede a instauração dos três sistemas, a sustentação das emissoras de tipo estatal e pública, justo por brigarem pela mesma fatia do bolo. Não por acaso, este assunto os radiodifusores não querem nem ouvir falar.

Artigo originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat

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