O comandante de Dunga, Ricardo Teixeira, é um dos poderosos chefões do futebol mundializado como escala de negócios  - Foto:narotadacopa
O comandante de Dunga, Ricardo Teixeira, é um dos poderosos chefões do futebol mundializado como escala de negócios
Foto:narotadacopa

19 de junho de 2010, após a vitória sobre a Coréia do Norte por 2 a 1 na 3ª 15 de junho e restando mais de 24 horas para a partida contra a Costa do Marfim; Bruno Lima Rocha,

Vivemos um paradoxo. Estamos no país do futebol, aceitamos o esporte como cultura e em sua prática reconhecemos a corporeidade do brasileiro sincrético embora afro-centrado. Ao mesmo tempo, a nossa paixão significada na forma de quatro linhas e uma bola de couro, não se reconhece. O dilema ainda deriva da tradição do bastardo, do filho sem glória, ou do mito da superação e competência como superior à comunhão e o encontro solidário entre os semelhantes. Explico.

O pensamento conservador aplicado para o esporte é a simbiose da mediocridade com a subordinação. Assim, o gaúcho de Ijuí até pode sagrar-se campeão do mundo, mas ao seu modo. Modo esse que é o menos brasileiro possível. Quem assistiu a murrinha de Brasil x Coréia do Norte lembrou-se imediatamente do ano de 1994. Ganhamos, sim, com direito a vôo da volta recheado de muamba e a taça seqüestrada na base da troca de reféns no aeroporto. O poderoso chefão, patrão e padrinho de Carlos Caetano Bledorn Verri e de Jorge de Amorim Campos Oliveira recusara-se a levar os então tetracampeões para o desfile em carro aberto caso a Receita Federal não liberasse a carga contida no AeroCBF. Pois bem, ganhamos sim, e daí? Daquele jeito, ganhamos como se não fôssemos NÓS, ou como dizia o saudoso e cada vez mais raro João Sem Medo Saldanha: “Nós quem cara pálida?”

Pois o cara-pálida agora é o boleiro do Brasil, que de tão assustado de se assumir como tal, confunde (ou auto engana-se), mesclando na poção mágica da estupidez, a disposição tática com o medo intrínseco dos que nunca se arriscam por não saberem o que fazer depois. Jogamos contra a Coréia do Norte com o mesmo “brilhantismo” das entrevistas coletivas recheadas de lugares comuns – ou seja, o senso comum condensando as idéias dominantes e vulgares – e com um painel assemelhado a letreiro de babel. E, como se sabe, o sargento que atende pela alcunha de um anão, é funcionário de uma transnacional vendedora de produtos alcoólicos ou derivados de química e açúcar (conhecidos como refrigerantes). No papel de parede onde se expressam os comandantes das quatro linhas comandados pelo Sr. da cartolagem e herdeiro ao estilo de Havelange, constam os seguintes logos: TAM Linhas Aéreas (a companhia cujo fundador morrera em desastre de helicóptero vindo de um churrasco na fronteira entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero no Paraguai); da Seara indústria de alimentos (marca subsidiária do Grupo Marfrig, também patrocinador da FIFA de 2010 a 2014); da Gillette aparelhos de barbear e higiene pessoal (marca da transnacional Procter & Gamble, que chegara ao país em 1988 ao adquirir a Perfumarias Phebo S.A); do Guaraná Antarctica (na verdade, da AmBev, pertencente a Imbev); da Nike indumentária esportiva, do Itaú sistema bancário e financeiro que recém incorporara o Unibanco da família Moreira Salles; e, da Vivo celular (joint venture comandada pela Telefônica de Espanha consorciada com a Portugal Telecom).

No futebol como um negócio espetacularizado pelas marcas no entorno e a inflação das commodities de chuteira, quando mais se exibem as marcas, menor é o espetáculo do futebol. Quanto mais estruturado é o jogo, menos se joga e mais se amarra. À medida que a chatice e o mesmo de sempre foram se espalhando, restaria ao produto original (por ser produzido por originais) ressuscitar a arte e não o malabarismo com a bola na cabeça (quando o boleiro vira dublê de foca amestrada). O paradoxo é que do jeito que as coisas andam na África do Sul, periga de ganharmos, mesmo sem merecer, mesmo sem jogar como brasileiros.

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