24 de junho de 2010; Vila Setembrina dos Farrapos abandonados em Ponche Verde; Continente de São Sepé dos Lanceiros Negros traídos em Porongos; Liga Federal de los Pueblos Libres de Artigas; Bruno Lima Rocha
Comentário de introdução
A motivação maior de produzir artigos de análise de viés institucionalista e com intuito de aprimorar a democracia representativa não é melhorar o mecanismo que considero injusto. Como defensor e teórico da democracia direta e participativa, eu como alguns colegas da mesma ala não-hegemônica da politologia brasileira somos acusados de defender a democracia do povo simplesmente por não sabermos montar esquemas de tipo engenharia política. O mesmo se dá com as campanhas eleitorais. Sim, sabemos fabricar salsichas e racionalizar a sua produção, mas não queremos fazê-lo. Este artigo e os anteriores demonstram a justeza das afirmações acima.
O texto
Sigo aproveitando o período de interlúdio político, quando a pré-campanha amorna e por vezes esfria, para seguir na crítica normativa para um melhor funcionamento do sistema eleitoral brasileiro. Nas semanas anteriores correlacionei a ausência de estrutura federativa com os níveis de governo sub-nacionais e a capacidade de realização política subordinada da distribuição fiscal. Logo após, fiz a defesa comedida da regra distrital mista para diminuir o poder de resolução de cúpulas estaduais e seus caciques de sempre, campões de voto e dobradinhas nas proporcionais. Dessa vez, o alvo está nas composições de chapas aleatórias, reforçando a convicção na urgência de impor a verticalização de alianças.
O argumento é simples. Um sistema político que construa a solidez partidária não pode ganhar existência real se um eleitor não identifica nos partidos um mínimo de coerência entre discurso, inspiração ideológica e prática política. Entendo que, da parte do eleitorado, a fidelização do voto seria alforriada da relação de clientela se, além de aumentar o caixa vinculado de estados e municípios, os políticos profissionais fossem condicionados a se comportarem para além da sobrevivência.
Hoje vivemos no Brasil um paradoxo caótico. As eleições presidenciais, ao que tudo indica, serão decididas na composição dos palanques dos estados. Ao mesmo tempo, é mais que evidente a existência de chapas aliadas estaduais e rivais na esfera federal. E, mesmo que isso não ocorresse, a abertura dessa possibilidade já reflete um sistema político esquizofrênico. Como as preferências também se dão por insistência e longevidade (e é por isso que os candidatos concorrem muitas vezes até ganhar), é desejável ver o mapa político bem definido ao invés de uma oportunista salada de siglas.
A verticalização das alianças, mesmo que existindo dentro das cláusulas de exigência para montagem de partidos, forçaria as siglas partidárias a se aproximarem buscando a identificação do eleitorado. Hoje, o que temos, são práticas de legendas estaduais que se federalizam quando há conveniência. Particularmente, não vejo como maléfica a política exercida a partir do prisma regionalizado. Por isso, entendo que a regra da aliança deveria tolerar a reprodução de composições em escala nacional e admitir que se concorra só ou com aliados dentro do mesmo campo. Para aumentar esta coerência interna, era preciso reconhecer a autonomia relativa das lideranças dos estados, permitindo a criação de partidos estaduais, tal como na Argentina ou na Espanha. Dessa forma, teríamos contemplados os grupos políticos com pretensão autônoma e, mais uma vez, o reforço da relação política e eleitoral com a identificação ideológica do voto.
O pano de fundo desse texto é aumentar a definição do espectro de partidos e ideologias concorrentes dentro do regime da democracia representativa. Tudo o que vier a diminuir o vale-tudo na política profissional brasileira favorecerá, no longo prazo, um câmbio nos marcos da democracia.
Este artigo foi originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat