19 de novembro de 2010, da Vila Setembrina do Continente de Sepé y Artigas, Bruno Lima Rocha
Passado o período eleitoral nos reencontramos com o país real. Parodiando Nelson Rodrigues, “é a política como ela é”, e não como os políticos profissionais – ou aspirantes – a fazem parecer. Seria leviano, para não dizer outro termo, afirmar que a aparição de propostas e situações insustentáveis logo que passado o pleito é uma característica exclusiva da era Lula e de sua sucessora. Aos mais incautos, sugiro a triste memória do Plano Cruzado II, famigerada medida implantada pelo então presidente José Sarney, no governo da Aliança Democrática (PMDB-PFL). Corria o ano de 1986, ainda nem havia sido criado o PSDB, estando por tanto o tucanato inteiro dentro nas hostes peemedebistas. Vinte e dois anos depois, o que era alvo de críticas da esquerda, torna-se prática incorporada pela coligação de centro-esquerda ao assumir o Executivo federal.
De tantas “surpresas pré-natalinas”, temos o anúncio – em tom de pragmatismo político – da necessidade do retorno da CPMF. Se aprovada, através da maioria absoluta do novo governo em ambas as casas, isto representaria a materialização do acerto entre a legenda de Dilma Rousseff e de seu vice, Michel Temer. PT e PMDB defrontaram-se no “mui nobre e valoroso” Legislativo federal em 2007, ficando o primeiro na vexatória situação de defender mais uma das políticas implantadas no governo de Fernando Henrique Cardoso. Já os correligionários de José Sarney, Romero Jucá, Renan Calheiros e cia, em sua maioria alinharam-se com o Planalto, salvo algumas exceções, que somadas com os recalcitrantes da base lulista após a crise de 2005, deram os votos necessários para assegurar a vitória dos criadores (PSDB e DEM) contra uma de suas criaturas (a taxa sobre a movimentação financeira).
Neste mesmo blog escrevi em 20 de dezembro de 2007 o artigo “A DRU e a economia real”, onde analiso os porquês da derrubada da Contribuição semi-Permanente (o nome de batismo original é Provisória) sobre a Movimentação Financeira e, concomitantemente, a aprovação por acórdão da Desvinculação das Receitas da União. A famigerada DRU é o artifício jurídico para deslocar fundos e recursos das áreas sociais e colocá-los em “contingenciamento”, esperando que a caneta da equipe econômica de turno defina a destinação das riquezas coletivas produzidas pela nação.
Discursos alarmistas à parte, nem governistas e menos ainda a oposição (de estilo neo-udenista) querem entrar nesta seara. O problema na Saúde é o mesmo que ocorre na Educação e Previdência. O dinheiro é pura e simplesmente desviado para outras finalidades. Na Assembléia Constituinte as bancadas chamadas então de progressistas, trataram de assegurar o maior número e volume de direitos possíveis para as maiorias. É por isso que na carta magna constam temas que, em tese, seriam conjunturais ou matéria para leis complementares. Na mão contrária, aquilo que o Centrão não pôde barrar, os governos posteriores foram “emendando”. Como não se negocia direito adquirido e quase sempre se tratam de medidas impopulares, cada emenda foi duramente negociada. Literalmente, custaram caro.
Meu argumento contrário a volta da CPMF não é nada original e repete o já proferido por entidades sindicais. Em se aprovando a taxação, só o que asseguraria o destino das verbas para a Saúde seria uma “emenda do bem”, como a 29, vergonhosamente ainda não votada. E, se não for aprovado o retorno do imposto, a Saúde teria seu financiamento garantido com a mesma legislação complementar que ainda não foi à votação. Do contrário, trata-se de mais do mesmo, como sempre.
Este artigo foi originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat