19 de janeiro de 2010, de São Sebastião do Rio de Janeiro, Bruno Lima Rocha
Infelizmente retomo a crônica política da tragédia brasileira, dessa vez na Região Serrana do Estado do Rio, onde vivem mais de 700 mil pessoas. Qualquer pessoa que costume ir para estas localidades sabe do perigo das chamadas cabeças ou trombas d’água, levando a cheia dos leitos e destruição de suas margens. Se estes municípios convivem com enchentes, inundações e deslizamentos desde sempre, porque não houve a antecipação necessária, tanto no sentido da prevenção como no plano de contingência para catástrofes?
Divido a crítica em dois aspectos, correlacionando o ato de governar e as expectativas em torno deste papel com o da tragédia. O primeiro diz respeito ao atual governador fluminense, o reeleito Sérgio Cabral Filho (PMDB). Sua ausência ocasional no momento do desastre poderia chegar a ocasionar um ambiente pré-impeachment. Mesmo estando a Assembléia Legislativa em recesso de verão, se a União estivesse operando e o chefe do Executivo estadual não, estaria aberto o vazio de poder típico das derrocadas. Sendo justo na crítica, também o governo central demorou em acionar forças federais no auxílio para resgate de vítimas e acesso às áreas isoladas. A “sensação de crise” só não piorou a própria crise da falta de coordenação dos órgãos competentes e de autoridades eleitas para os gerirem em função do engajamento da população e o bombardeio midiático. É certo que desgraça é notícia, mas é ainda mais certo que ao convocar a cidadania a engajar-se na ação de ajuda, as empresas de mídia se legitimam, ultrapassando o papel de ser fonte de informação para a de suporte da realidade.
Outro aspecto da crítica tem relação com a ausência de governo no sentido de um ente estatal metodicamente voltado para o bem comum. O mesmo descaso com os morros do Rio se verifica na ocupação desordenada do território urbano, semi-urbano e rural serrano. O problema está para além da favelização de Teresópolis e Petrópolis e do crescimento populacional de Nova Friburgo. Não apenas bairros humildes expandiram-se para as encostas de morros, retirando a Mata Atlântica e desprotegendo as encostas, mas também há um boom imobiliário de condomínios, resorts e hotéis ajudaram a ocupar as várzeas de rios retirando matas ciliares. Considerando que as intempéries do clima tendem a agravar-se, o ato de ordenar o solo e garantir zoneamentos e destinações racionais de uso torna-se algo urgente e necessário. Do contrário, nos próximos verões assistiremos ao mesmo filme de pavor e descaso.
Este artigo foi originalmente publicado no blog de Ricardo Noblat